Antes de começar a assistir a Isolados não tinha grandes pretensões. Ao adentrar no universo do filme acabei por ser presenteado com algo que realmente tem a mão de um diretor que conhece de cinema e busca construir o filme de maneira inteligente. O cinema brasileiro realmente está crescendo e saindo da superficialidade para um cinema que sabe escrever histórias com imagens. Tirando algo em demasia que quase me fez pensar que realmente estaria embarcando em uma canoa furada, o filme consegue envolver o espectador e o diretor Tomas Portella com sua câmera e estrutura narrativa bem engenhosa nos coloca dentro daquele mundo de terror em que os personagens estão vivendo.
Lauro e Renata (Bruno Gagliasso e Regiane Alves) são um casal que vai até uma casa no meio do mato para passar um tempo juntos. Aos poucos entendemos que ele é um psiquiatra e ela uma paciente dele. Paralelo a isso há uma onda de crimes no lugarejo onde a casa se situa. Mulheres estão sendo mortas e violentadas no meio do mato. Lauro acaba escondendo essa informação de Renata e resolve ir mesmo assim para a casa.
No fundo, o filme tem uma ponta do excelente Anti Cristo de Von Trier. Digo uma ponta porque há ali um médico e uma paciente em uma casa/cabana no meio do nada. Além disso o personagem de Willen Dafoe é algo que simboliza, apesar de querer ajudar a paciente, a opressão em relação a mulher. Ele é uma metáfora de controle ou dominação do homem em relação à mulher. Lauro se assemelha a esse personagem por justamente controlar a vida de Renata. Ele que toma as decisões e que o tempo todo quer determinar o que Renata pode ou não fazer. Assim na essência o filme conserva um mínimo de uma história já contada.
A maneira como a narrativa é construída é que revela o quanto o filme tem seu potencial. Logo no início o filme lembra um filme americano barato. Esse começo quase me tira do filme. A cena é construída de uma maneira que já assistimos inúmeras vezes. Pensei que iríamos imitar a maneira americana de fazer um filme. Além disso a cena da borracha cortada com água se esvaindo já era algo metafórico para a construção da cena e eis que então o diretor que também co-escreveu o roteiro quer colocar um algo a mais desnecessário em cena. Felizmente eu estava enganado pois após esse início o filme constrói toda sua atmosfera com recursos cinematográficos.
O filme é pouco iluminado e então um ambiente de terror e medo é construído em meio a escuridão. As vezes não sabemos se é dia ou noite. O uso da câmera subjetiva consegue corroborar para o sentimento de algo que se esconde na mata ou na escuridão. Os quadros elaborados em primeiríssimos planos traz à tona a câmera de David Lynch filmando o pesadelo de Império dos Sonhos com a distorção do rosto dos personagens. Acrescenta-se a isso planos fechados sem grandes profundidade de campo. Dessa maneira somos envolvidos sem saber o que pode ter logo ali no escuro. E por fim o design de produção que se utiliza de uma casa que funciona bem como um pesadelo, não só por estar no meio do mato, mas sim pela construção de seu interior.
O roteiro pode parecer falho, mas ao chegarmos no final conseguimos enxergar várias pistas no decorrer do filme através de seus diálogos que contribuem para que se chegar ao desfecho do filme. A única falha é colocar as vezes personagens que não vão muito adiantes e em certo momento encaixar cenas que facilmente poderiam ser cortadas na montagem final. Falando de personagens não vejo Gagliasso convencendo na hora de falar seus diálogos, por outro lado Regiane Alves parece conseguir estar bem segura no personagem. A homenagem a José Wilker é válida, mas seu personagem parece ter perdido cenas na montagem final. Parece colocado apenas para ter essa homenagem, já que sua participação não é importante para a trama.
Construindo o filme com sabedoria ao utilizar recursos importante para contar a história, o filme mesmo não sendo algo original sabe desenvolver o potencial de sua história. Explorando cada canto da escuridão, seja interna ou externa, o filme consegue nos envolver em uma obra bem construída.