Nesses 17 anos que separam o segundo filme da franquia Bad Boys e este novo, muita coisa mudou no cinemão de ação hollywoodiano – e não falo apenas de características técnicas ou de efeitos especiais – em filmes com heróis da ação como Jason Bourne, James Bond ou Ethan Hunt, roteirista começaram a dar mais valor em construções de personagens e emoções, elementos que tornavam mais intensas e verossímeis suas tramas – mesmo que envoltas de cenas de perseguições automobilísticas e tiroteios irreais – uma característica que, claro, outras franquias, como Velozes & Furiosos ou Transformers, pouco se importavam – e, falando deste último caso, com um diretor como Michael Bay sob o comando de um filme com personagens como os interpretados aqui por Will Smith e Martin Lawrence, provavelmente Bad Boys para Sempre seria um longa que apenas recapitularia tudo que já havíamos visto no filme original de 1995 e na sua continuação de 2003.
Felizmente, os novos diretores do projeto agora, os belgas Adil El Arbi & Bilall Fallah, optaram por estabelecer ligações emocionais e boas construções de seus personagens – embora o roteiro de Chris Bremmer, Peter Craig e Joe Carnahan ainda tente empregar certas reviravoltas um tanto improváveis (no melhor... quer dizer, pior estilo da “saga” Velozes & Furiosos), o que garante que Bad Boys para Sempre seja um filme um pouco acima da média deste gênero é justamente o carisma de sua dupla central – além disso, fica bem visível como há realmente uma intenção de mostrar com mais atenção as personalidades tanto de Mike, quanto de Marcus, deixando em evidências suas crises, discussões e incertezas sobre o ramo em que atuam – mas isso é algo que não tenhamos visto nos dois filmes passados já? Seria algo novo? Não – mas o resultado se diferencia das produções assinadas por Michael Bay antes por justamente tentar lidar com os sentimentos dos protagonistas – ao invés de focar somente no humor – afinal, Bay deixou Bad Boys II com inacreditáveis duas horas e meia de duração, só por inserir tomadas longas de humor – sem a menor ligação com a trama – enfim, deixando um filme que realmente tinha ótimas cenas de ação se tornar algo cansativo e repetitivo – naquela época, Bay ainda entendia um pouco do que era fazer cinema, isso não podemos negar.
Enfim, este terceiro longa mostra que Mike (Smith) e Marcus (Lawrence) envelheceram realmente – mas cada um do seu jeito – enquanto o primeiro se sente ainda um jovem de cinquenta anos (e sem vontade alguma de constituir família ou se apegar amorosamente), o segundo já vislumbra sua aposentadoria, a fim de ter mais tempo com sua esposa (Randle) e seu recém-nascido neto – a aparente tranquilidade da dupla muda quando um perigoso mexicano, chamado Armando (Scipio) e sua mãe Isabel (Castillo) começam a tramar uma onda de assassinatos contra vários profissionais da lei de Miami – fazendo Mike e Marcus precisarem se unir com uma nova equipe da policia local, comandada pela agente Rita (Nuñez).
Justamente aquele toque mais emocional que faz o filme funcionar melhor – a dupla de diretores não tem medo de levar um dos personagens, logo no primeiro ato, a passar por uma situação mais perigosa (e letal) – o que, de certa forma, faz com que haja urgência e realmente temor pelos personagens centrais – há, infelizmente, problemas por parte de algumas decisões dos diretores em querer fazer rápidas surpresas/brincadeiras com momentos que parecem mais sérios – logo na primeira perseguição, durante os créditos iniciais, e em um momento que culmina com uma festa de casamento – coisas que não funcionam, porque no final soam previsíveis mesmo – e só de terem deixado Michael Bay fazer uma ponta como o mestre de cerimonias do casamento, o filme já mereceria uma bronca...
Mas brincadeiras a parte – é bom lembrar que as piadas estão bem presentes. A química dos dois atores ainda é o ponto alto da obra – o que surpreende um pouco é a atuação de Martin Lawrence – sumido dos cinemas desde 2011, com Vovó...Zona 3 (aliás, há algumas piadas com esse filme também), ele demonstra seu belo timing para o humor ao encarnar as inseguranças e tentativas de mudanças de comportamento de Marcus – seu medo de levar broncas e decepcionar sua esposa, sua tentativa de seguir uma vida mais “religiosa” (uma das coisas mais divertidas do longa) e suas discussões sobre sua vida sexual – apesar de serem momentos até chulos, é o suficiente para causar alguma empatia ainda – enquanto que Will Smith mantém sua determinação como Mike, mas como agora é um homem mais maduro, fica claro que sua composição deixa o policial mais meticuloso, porém, ainda agressivo e implacável – esse toque clássico, aos moldes de outra franquia policial – Máquina Mortífera – torna mais uma vez a relação dos dois impagável em tela – além de ser cômico durante as cenas de ação, a ligação de amizade, que faz os dois agirem feito irmãos – um preocupado com o outro – é o acerto desta sequência, ao demonstrar tal relação de afeto.
E os diretores tentam estender essa abordagem um pouco mais emocional para os demais personagens também, fazendo do chefe deles, o capitão Howard de Joe Pantoliano, um coadjuvante importante para lidar com o comportamento rebelde de Mike – e a Rita de Paola Nuñez cumpre bem sua função de liderar a equipe que ajuda a dupla – ela não deixa se abalar pela postura às vezes arrogante de Mike, por exemplo – funcionando como mais do que um flerte com o personagem de Smith – embora os demais integrantes novos da equipe sejam criações um tanto preguiçosas – a ex-High School Music Vanessa Hudgens faz uma das agentes, sem ter muito o que demonstrar, além dos agentes Rafe do Charles Melton, que só serve, inicialmente, para confrontar o ego de Mike e o hacker Dorn, do Alexander Ludwig, que diz ter um trauma em matar pessoas, por isso só atua fora do campo – isso realmente é algo que não faz diferença alguma com o resto do filme – talvez para inserir algumas piadinhas mais para o fim – ainda temos participações de artistas pop latino-americanos, como o caso do cantor Nicky Jam interpretando um criminoso – ele participa da maior cena de perseguição do projeto – além do DJ Khaled, fazendo um “açougueiro informante”, que deixa Mike irritadíssimo por sujar um de seus ternos caros – detalhes que não agregam muita coisa ao filme, infelizmente, somente funcionando para o humor – no caso de Jam, há uma piada um tanto bizarra envolvendo uma contusão que sofre.
E com relação a vilania, o longa se mostra irregular – se inicialmente parece forte e urgente a determinação dos personagens de Kate del Castillo e Jacob Scipio, o roteiro prepara algumas revelações mais ousadas, digamos assim, lá pelo terceiro ato –
é difícil acreditar que o Armando de Jacob seja realmente filho de Mike – e este nunca tenha contado para ninguém sobre isso – nem para seu melhor amigo, Marcus – fora o fato de que mostrar a Isabel de Kate como se fosse realmente uma bruxa pode até soar como uma visão estereotipada de crenças mexicanas – felizmente, os diretores não se aprofundam muito nisso – o que os impedem de cometer a mesma falha grave que o pavoroso Rambo: Até o Fim cometeu, em retratar os mexicanos com xenofobia; e não deixa de soar estranho ver Will Smith se vendo em combate com um personagem que parece ser ele mesmo mais jovem – coisa que vimos meses atrás em Projeto Gemini.
O que faz tais coisas serem perdoadas são as cenas de ação – talvez em menor quantidade do que no segundo filme, mas superiores ao primeiro – as escolhas de enquadramentos dos diretores são eficientes, capazes de mostrar as cenas de perseguição com clareza – e a montagem de Dan Lebental e Peter McNulty sabe fazer os cortes nos momentos certos – sem transformar lutas, tiros e explosões em colchas de retalhos incompreensíveis – viu, Sr. Bay? A longa perseguição de motos pelas ruas de Miami, com Mike e Marcus em uma moto com um banco lateral é muito bem realizada – assim como o final em uma mansão semidestruída envolvendo um helicóptero – mostrando o trabalho bem feito de edição de som.
Sem ser tão (desnecessariamente) longo quanto a segunda parte e nem tão simplório quanto a primeira, Bad Boys para Sempre acaba por ser o melhor da franquia – apesar disso não representar muita coisa, ainda é uma diversão correta, graças ao brilho de seus dois atores principais e algumas decisões mais atuais para o gênero de ação por parte de seus diretores – mesmo que presos no conceito de “surpresa oculta surgindo do nada”, como a “saga” Velozes & Furiosos gosta de fazer.
Obs.: tem uma cena “pós-créditos”, que na verdade é bem no inicio dos créditos finais, sinalizando mais um filme pela frente...