Críticas AdoroCinema
1,0
Muito ruim
Minha Mãe É Cor-de-Rosa

Freak show

por Bruno Carmelo

Malou não é uma mãe como as outras. Ela sempre preferiu uma vida nômade, tendo passado por mais de 30 cidades, sem se apegar a nenhum parceiro ou parceira em particular. Algum de seus romances deu origem a Michael, que também não é um filho como os outros. O garoto se veste como uma criatura fantástica, muito além da figura extravagante das drag queens. Michael possui perucas e figurinos surreais, e certo dia afirma: “Preciso ser azul”. Então, ele pinta a pele toda de azul.

A diretora Cecilie Debell propõe a ambos que refaçam a jornada do passado da família, para reencontrar os elementos que os uniram, ou talvez apenas para ter mais elementos exóticos para filmar. A postura da cineasta é bastante questionável: ela apenas espia ambos, privilegiando as situações mais extravagantes, coladas a músicas patéticas de fanfarras e letreiros multicoloridos. Além de não se levar a sério, o filme também não leva a sério as duas figuras em tela, tratadas como animais exóticos de um zoológico.

Enquanto isso, temos a impressão de que o contrato com a realidade implicitamente estabelecido pelos documentários se rompe: Debell filma como performance o que se pretendia naturalista e real. Talvez Malou e Michael nem mesmo soubessem do uso fetichista que seria feito de suas imagens. Ao invés de descobrir o que se esconde por baixo das maquiagens e da evidente tristeza de ambos, o filme se atém à superfície. A diretora está deslumbrada com as cores, as pedrinhas brilhantes coladas na pele, as nádegas do garoto. 

Talvez a ideia do documentário fosse ressaltar o caráter libertário de ambos, mas passamos longe de uma observação distanciada. Os diálogos sobre o passado dramático da mãe, cujo filho foi sequestrado pelos avós, ameaça conferir humanismo ao projeto, porém a montagem logo interrompe as lágrimas para filmar o curioso garoto azul ou a excêntrica mãe obesa em vestidos vermelhos apertados. A viagem através de várias cidades não atribui nada à narrativa: eles passeiam por lugares que não são explorados na fotografia, na memória afetiva, na ideia de união familiar. As cidades são vistas de modo anônimo e indistinto.

Em outras palavras, mãe e filho se movem por inércia ao longo de uma jornada que dura apenas 75 minutos, embora aparente ter muito mais. O filho não ganha uma mínima complexidade psicológica, a mãe não tem seu pensamento racista contextualizado. Não sabemos como ganham a vida, se estudaram, sem têm objetivos para o futuro, como se inserem cotidianamente na sociedade. Minha Mãe é Cor-de-Rosa retrata duas figuras de exceção num contexto de exceção, para extrair o máximo de brilho e cores de um freak show. A triste apresentação da dupla para uma plateia vazia dentro de um bar termina por simbolizar o filme como um todo.

Filme visto no 25º Festival Mix Brasil, em novembro de 2017.