Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
O Prefeito

Política carioca

por Francisco Russo

O diretor Bruno Safadi (Meu Nome é Dindi, Éden) teve uma ideia, no mínimo, inusitada: aproveitar a demolição do Elevado da Perimetral, importante via de acesso no Rio de Janeiro, para rodar um longa-metragem sobre a política carioca. Ali mesmo, em meio aos destroços e com o som das britadeiras ao fundo. Diante deste cenário destruído, o resultado é uma sátira política que, talvez, faça mais sentido a quem mora ou está familiarizado com o que acontece no próprio Rio de Janeiro. Afinal de contas, são várias as entrelinhas espalhadas pelo roteiro que apenas quem conhece bem as personalidades locais conseguirá percebê-las.

É claro que Safadi, esperto, não deu nomes aos bois. Ainda assim, é possível identificar discursos e posições dentro da sociedade carioca, e até brasileira. Parte da graça de O Prefeito está justamente nesta semelhança entre o real e o ficcional, como se dialogassem entre si para revelar uma vertente possível do que acontece na cidade maravilhosa. Assim é o prefeito de Nizo Netto, uma caricatura de boa parte dos políticos nacionais, que almeja pôr seu nome na história implementando uma completa reinvenção da cidade. Você com certeza já viu isto antes.

Diante desta tarefa faraônica, o prefeito em questão revela, aos poucos, o modus operandi da política nacional, com direito a muitos conchavos e contatos que facilitam tudo que se queira que seja feito. Até mesmo provocar a independência do Rio de Janeiro em relação ao Brasil, de forma que o tal prefeito torne-se presidente. Nada que muita lábia e alguns acordos por debaixo do pano não possam proporcionar.

Em meio ao cinismo reinante no ambiente político retratado, Safadi explora com habilidade alguns exercícios de narrativa. Como o uso de cenas em preto e branco e a fotonovela que acompanha o desenrolar dos acontecimentos em torno do prefeito, explorando bem as caras e bocas de Netto. Ele, por sinal, assume de forma escancarada um visual a la Jânio Quadros e tem praticamente todo o filme ao seu dispor. Há breves cenas com Djin Sganzerla e Gustavo Novaes, mas ambos interpretam personagens menores. Cabe a Netto transmitir a “veracidade” do tal prefeito e ainda suas alegrias e angústias de forma convincente, à medida que a narrativa se desenvolve.

É justamente neste ponto que O Prefeito peca. Por mais que seja criativo e até mesmo ousado, o longa-metragem não consegue se aprofundar muito na história proposta – isto em um filme de apenas 70 minutos. No fim das contas, acaba sendo um trabalho mais de boas ideias espalhadas do que propriamente de uma história fluida e envolvente - algo que acontece com alguma frequência na carreira do diretor, por sinal. Ainda assim, trata-se de um filme bastante interessante pelo inusitado da proposta e por, de alguma forma, mexer com este tão conturbado cenário político existente no Brasil, mesclando estereótipos e vida real.

Filme visto na 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em novembro de 2015.