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    A Odisseia dos Tontos
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    A Odisseia dos Tontos

    Vingança bem-humorada

    por Barbara Demerov

    Para além dos desafios políticos no mercado global, uma crise econômica como o Corralito, que se instaurou na Argentina em 2001, afetou diretamente a vida cotidiana de sua população. Foram sonhos obstruídos e planos incertos. A Odisseia dos Tontos tem como principal foco mostrar como grandes acontecimentos têm a capacidade de impactar cada indivíduo, utilizando tal crise como o estopim para que seja a alavanca que inicia a movimentação da narrativa.

    Sebastián Borensztein (Um Conto Chinês) dirige com bom humor esta história focada num grupo de pessoas que perde seus fundos para o banco, que fora coletado antes da crise para comprar uma grande propriedade em conjunto. Apesar do pano de fundo ser melancólico e possuir desdobramentos comoventes com relação ao personagem principal (Fermín, interpretado por Ricardo Darín), o filme possui uma boa mescla de emoções - e a dinâmica do elenco, formado majoritariamente por homens, é o principal elemento que faz toda a execução dar certo.

    Mesmo com uma maior presença de homens em tela, há duas figuras femininas que ditam o tom da missão idealizada pelo grupo: a esposa de Fermín, Lidia (Verónica Llinás), e Carmen (Rita Cortese). É graças à atitude de cada uma que o enredo se desenvolve - seja com relação à quantidade de capital inserida no negócio ou nas atitudes que surpreendem o restante do grupo pela confiança e firmeza frente às dificuldades. Mesmo com todos no fundo do poço, o cenário não é tão negativo durante todo o tempo: o espectador pode se divertir com algumas piadas ou, simplesmente, com a missão de recuperação do dinheiro em si.

    Um cofre no meio do pasto, isolado da cidade e sem nada além de um alarme que o guarda. Nada além disso protege um bem material que o banqueiro que roubou o grupo de argentinos esconde a todo o custo. Quando os personagens descobrem que, logo após a crise, este esconderijo foi construido, todos já tiram a mesma conclusão: trata-se do dinheiro deles e de todos os outros indivíduos que foram prejudicados pelos bancos. A partir desta dedução, a missão passa a ser de uma recuperação geral para a pequena cidade onde vivem, e não somente para benefício próprio.

    Mas nem mesmo a vingança ganha camadas mais sérias em A Odisseia dos Tontos. O clima de história fantasiosa se faz bastante presente em todos os desdobramentos da missão: a descoberta do cofre, a solução para burlar o alarme e a confusão que dão ao banqueiro, que toda hora vai ao local para conferir se seus bens não lhe foram roubados. A montagem, por vezes acelerada, dá de encontro com um excessivo uso de trilha-sonora para destacar em demasia os momentos mais sentimentais e tensos que os personagens estão vivendo - e a intensidade na atuação de Darín (e o drama que ele vive) sempre parecer ser foco do diretor.

    A Odisseia dos Tontos ganha camadas realísticas por encaixar problemas que a sociedade encara, e a escolha de abordar tal assunto em menor escala, com a visão de uma pequena cidade perante ao restante do país, ajuda a humanizar todo o cenário. Mesmo que a trama se estenda por demais no plano principal (com todas suas idas e vindas) e se apresse em um desfecho convencional (mas na medida dentro do cinema comercial), os personagens apresentados são reais o suficiente para que a empatia seja um dos sentimentos atribuídos ao roteiro, que dedica boas passagens para contar um pouco da história daqueles que cercam Fermín. Em uma sociedade atingida pela incerteza, o que resta é a união.

    Filme visto durante a 43ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, em outubro de 2019.

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