Enquanto eu assistia "A Assistente", filme dirigido e escrito por Kitty Green, me recordei de uma conversa que tive com uma amiga, recentemente, sobre o campo local de trabalho, na nossa área. No nosso diálogo, eu falei que, muitas vezes, em busca da primeira experiência, algumas pessoas aceitam se sujeitar a situações como baixos salários, jornadas de trabalho extenuantes e atribuições que são além das responsabilidades dos cargos para os quais se candidatou. Tudo na esperança das portas que irão se abrir, futuramente, por meio dessa experiência inicial.
Jane (Julia Garner, da série "Ozark", numa performance excelente), a protagonista de "O Assistente", está passando por uma situação desse tipo. Ela sonha em ser produtora de cinema. Por isso, aceitou a proposta de trabalho como assistente júnior de alguém que é uma figura importante do ramo. Ao longo do dia de trabalho dela, perceberemos que Julia se submete a uma série de situações complicadas: ela não recebe pelo seu trabalho; é a primeira a chegar e a última a sair; tem incumbências que vão além da sua função; tem como chefe alguém que pratica sistematicamente não só o assédio moral, como também o sexual; e tem como colegas pessoas que, apesar de passarem pelos mesmos abusos, não são empáticos o suficiente para enfrentarem tudo isso juntos.
Como se pode perceber, "A Assistente" é um filme que faz uma crítica a um regime de trabalho que submete os seus trabalhadores ao esgotamento - seja mental ou físico. O longa usa a figura do assistente pessoal de uma figura célebre para chamar a atenção a esse tipo de situação. Apesar de falar sobre um assunto importantíssimo, é evidente em "A Assistente" o tom apático da obra. A fotografia low key, com seus tons próximos ao preto, são um reflexo da sobriedade e da discrição - e por quê não também, da apatia - de Jane.
Está claro que a protagonista não sente alegria no seu local de trabalho e que ela não está feliz com o que faz. Por isso mesmo, "A Assistente" me incitou a uma reflexão: vale a pena se sujeitar a tudo por um sonho? Por uma oportunidade? Vale a pena sacrificar sua saúde mental e física em prol de algo que não te faz feliz? Vale a pena se esforçar tanto por algo que consome por completo a sua vida, ao ponto de você não conseguir ter tempo para si mesma, para o que gosta, para as pessoas que estão ao seu redor?