Minha conta
    Contato Visceral
    Críticas AdoroCinema
    1,0
    Muito ruim
    Contato Visceral

    O celular do mal

    por Bruno Carmelo

    Convenhamos: a ideia de fazer um filme de terror sobre a nossa dependência de telefones celulares constitui uma premissa de grande potencial, por mais que o cinema mainstream ainda não tenha encontrado a melhor maneira para representar este fenômeno. Medo Viral, Uma Chamada PerdidaAmizade Desfeita e End Call são alguns dos projetos que fracassaram na tentativa de extrair tensão das chamadas telefônicas, por não perceberem que é inútil apostar fantasmas e demônios que se comunicam pelo aparelho. Nossa angústia está associada a elementos muito mais mundanos como a autoimagem e o senso de pertencimento social.

    Wounds oferece mais uma tentativa comicamente ruim de explorar os ataques malignos de uma força sobrenatural via smartphone. Quando o barman Will (Armie Hammer) encontra por acaso o celular deixado por um grupo de jovens em seu bar, ele começa a ser atormentado por mensagens no aparelho. Fotos de cabeças cortadas sugerem as más intenções do dono, mas o protagonista demora demais a tomar qualquer atitude concreta em relação ao celular – até porque o filme depende desta conexão para se desenvolver. Talvez se encontrasse aí, na dificuldade de abrir mão do telefone que sequer lhe pertence, o verdadeiro conflito do filme. Mas o diretor iraniano Babak Anvari prefere imaginar que o objeto contém vídeos de cabeças decepadas se movendo sozinhas e recados destinados especificamente ao barman considerado como “o escolhido” por uma seita anônima.

    Um dos problemas mais graves deste roteiro se encontra na indecisão sobre a fonte do mal: seria um fantasma, um grupo de jovens psicopatas, uma hipnose coletiva, uma possessão, um demônio, uma contaminação? Na ausência de um caminho preciso, o diretor opta por todas as alternativas anteriores. O filme passa a acumular flashes de cabeças, personagens vidrados em imagens de túneis na tela de computadores, infecções dermatológicas nas axilas, infestações de baratas. Uma aparição aleatória sugere algo sobre seitas, sobre o poder da transmissão, e o fato de que Will será o próximo atormentado. Anvari sequer se dá ao trabalho de desenvolver a premissa, limitando-se a multiplicar os jump scares com sons estridentes perturbando os ouvidos e uma maquiagem caseira nos atores.

    No que diz respeito ao elenco, é lamentável ver atores interessantes envolvidos num projeto tão rasteiro. A pobre Dakota Johnson se limita a uma zumbi possuída pelo computador ou afogada numa banheira. Armie Hammer se esforça para navegar entre a aparência cool do barman e a surpresa diante dos fenômenos sobrenaturais, mas como conferir o mínimo de verossimilhança a cenas insanas como a conclusão? Zazie BeetzKarl Glusman desfilam pelo bar de Will, onde ocorre boa parte pela história, sem deixar qualquer traço marcante naquele lugar. Os atores nunca sabem ao certo se encarnam o naturalismo ou a ambiguidade, se criam tipos transparentes ou misteriosos. Isso ocorre porque o diretor não percebe a necessidade de trazer alguma vazão às situações absurdas, movendo-se com uma seriedade involuntariamente grotesca.

    Os letreiros iniciais sugerem que apenas as pessoas vazias podem ser assombradas, porque indivíduos “completos” não teriam espaço para a invasão. A tese seria interessante enquanto leitura metafórica, porém o filme opta por uma interpretação literal do vácuo e do preenchimento. O que dizer da briga entre os namorados, e da conclusão que Will encontra para si mesmo? A imagem das baratas tomando conta da tela constitui uma solução ironicamente eficaz ao filme: talvez tenha sido melhor, de fato, esconder a imagem por trás, fingir que ela nunca aconteceu. Wounds deve ser um destes projetos de que Johnson, Hammer e os demais envolvidos não vão querer se lembrar tão cedo.

    PS: Apesar do boicote do Festival de Cannes à Netflix, devido ao fato que esta se recusa a lançar os filmes nos cinemas e a fomentar o circuito exibidor, a Quinzena dos Realizadores decidiu comprar a briga com a Mostra Competitiva e agradar o gigante norte-americano. Para alguns espectadores, esse seria o resultado de uma obra boa demais para ignorar, a prova de que a qualidade fala por si própria, independentemente do meio de distribuição. Ora, Wounds constitui de longe o filme mais fraco da edição de 72º até o momento, ficando a anos-luz dos concorrentes da Quinzena como The Lighthouse e Deerskin. A inclusão deste título se justificaria enquanto escolha puramente simbólica, um gesto comercial a favor da empresa de streaming que, tragicomicamente, enviou a um dos festivais de cinema mais prestigiosos do mundo uma de suas piores produções originais.

    Filme visto no 72º Festival Internacional de Cinema de Cannes, em maio de 2019.

    Quer ver mais críticas?

    Comentários

    • Luis Felipe Santos Clarke
      Pior filme do universo observável!!!!! Perdi meu tempo total, Netflix quero meu tempo de volta aaaaaaa
    • Urban Fox
      Baratas voadoras, cabeças decepadas, garrafada na cara e o que mais me incomodou foi Will deitar de sapato na cama e ir dormi com uma camiseta suada. Então dá para perceber como eu estava envolvida com o filme, né? Além do que, quando ele começa a coçar de baixo do braço eu só pensei: Toma banho que passa. Ou seja, engajamento zero.
    • Rafael Sabino
      Filme mais sem noção da face da terra. Olha que já vi muitos títulos ruins, sem enredo, sem história, sem atitude, sem elenco, mas um filme que mistura tudo isso em um só, foi a primeira vez. De vdd é triste ver bons atores se darem ao ridículo de produzirem um filme tão ruim. De 0 a 10 esse filme não merece 2, daria 1 por alguns efeitos.
    • Gil Araujo
      Percebo que você não entendeu nada do filme. Não se culpe, a película tem suas dificuldades. Aconselho que busque as referências presentes na obra, principalmente o poema de T. S. Eliot Os homens ocos.
    • dave120
      Já nasceu um clássico cult. Eu particularmente gostei, mas entendo se uma pessoa odiar o filme, ainda mais depois do final kkkkk.
    • Lilly O
      Foi o filme mais “what The Fuck” que eu já assisti. Horrível em todos os aspectos.
    Back to Top