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    Infiltrado na Klan
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    Infiltrado na Klan

    Comédia sobre o ódio

    por Bruno Carmelo

    Se não fosse uma história real, a trajetória de Ron Stallworth seria considerada absurda demais para os padrões da ficção de cinema. Mas este policial negro, um dos raríssimos na corporação norte-americana dos anos 1970, conseguiu com sucesso se infiltrar na Ku Kluk Klan e sabotá-la por dentro. Primeiro, ele efetuou longas trocas telefônicas com os líderes do grupo racista, para ganhar confiança. Depois, treinou um policial branco para interpretá-lo nas reuniões presenciais. Ron (John David Washington) e seu dublê Flip (Adam Driver) correram sérios riscos ao manipularem uma organização paranoica e fortemente armada.

    O diretor Spike Lee tem a bela iniciativa de construir uma farsa, ao invés do típico drama biográfico. Os nomes, locais e fatos principais são mantidos, mas o filme sabe rir de si mesmo, contemplar seus próprios absurdos. Além disso, estabelece paralelos com os dias atuais, demonstrando de que maneira o discurso da extrema-direita adotou uma aparência “democrática” para se infiltrar na política e eleger políticos em cargos importantes, o que teria culminado com a presidência de Donald Trump. Estamos no terreno do racismo velado, institucionalizado, do tipo que diz “Não tenho nada contra negros, contanto que fiquem entre eles”. É a violência travestida de liberdade de expressão.

    O roteiro poderia constituir uma simples denúncia do discurso adverso. Felizmente, BlacKkKlansman revela uma quantidade considerável de nuances. A comédia encontra espaço para criticar o racismo na polícia, mas também para destacar nomes progressistas entre os policiais. Ela demonstra a potência e as limitações do discurso dos Panteras Negras, e consegue explorar diferentes vertentes dentro da Ku Klux Klan. Para completar, tem como personagem principal um homem de postura moderada, alheio às causas militantes. Para Ron, também, o caso se torna um aprendizado. Uma cena se destaca neste sentido: quando Flip Zimmerman, de origem judia, passa tempo demais na investigação, ele diz “Antes, eu não pensava sobre ser judeu. Agora, penso nisso o tempo todo”. A semente do espírito crítico está plantada.

    Em termos de construção imagética, Spike Lee cria seu trabalho mais inspirado em longos anos. Com a imagem em formato scope, coloca os rostos negros no centro do enquadramento, efetua lentas aproximações durante os discursos políticos, em sinal de admiração e respeito, opta por eventuais planos angulados, para reforçar o estranhamento e o humor. Lee confere grande atenção às cenas de dança, à noção de grupo e comunidade, ou seja, à cultura de uma época. Para o cineasta, ser negro é mais do que uma questão racial, é também uma maneira de estar no mundo.

    Paralelamente, o diretor evita vangloriar o herói e ridicularizar o adversário. Este é um filme que ataca ideias racistas, mais do que as pessoas racistas em si, e neste ponto encontra sua maior força política. Para completar o discurso, BlacKkKlansman ataca o cinema segregacionista, cujo principal ícone é O Nascimento de uma Nação (1915), e aponta os estereótipos reforçados pelo cinema de blaxploitation americano. É impressionante como, dentro de uma comédia hilária e agradável, os produtores Spike Lee e Jordan Peele conseguem debater questões tão complexas, enquanto adotam um posicionamento político inequívoco.

    No elenco, John David Washington está muito inspirado, transmitindo diferentes níveis de deboche ou raiva diante dos inimigos, e Adam Driver continua funcionando como coringa do baralho atual de Hollywood, adaptando-se a papéis quase paródicos com uma naturalidade ímpar. Topher Grace, de corpo frágil e olhar doce, é uma escolha curiosa para o líder fascista David Duke, mas funciona na tentativa de desconstruir o caráter maligno do discurso adverso. De certo modo, todos os personagens interpretam outras pessoas: o negro se passa por branco, o branco interpreta um negro, o fascista encarna o tipo tolerante. É nesta ficção dentro da ficção que o filme encontra sua força e torna-se uma importante comédia política, do tipo que o circuito comercial precisa cada vez mais.

    Infelizmente, os últimos minutos da projeção tornam explícito aquilo que já estava suficientemente claro. Quando uma ficção biográfica recorre a imagens de arquivo na conclusão, ela insiste na veracidade de seu discurso, como se não acreditasse na potência de sua própria narrativa, e supõe que o espectador não tenha compreendido a mensagem, precisando de um último esforço didático. Trata-se do momento mais fraco do projeto, mas não retira os méritos deste entretenimento de alta qualidade.

    Filme visto no 71º Festival Internacional de Cannes, em maio de 2018.

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    Comentários

    • Jackson A L
      Filme baseado em fatos reais que demonstra muito bem o conflito racial dos Estado Unidos. Algumas cenas duvidei da veracidade, de tão absurdas de que ocorria no KKK e ao mesmo tempo, como foram tapeados. Ótima atuação do filho de Denzel Washington. Gostei bastante do filme, porém, ainda prefiro o Green Book!!!
    • Roberto Gilnei Jr.
      Tem como não ser explicito, se essa praga do racismo ainda vive entre nós? O Spike Lee acertou em cheio em botar o dedo na ferida. Filme com roteiro excelente, merecia (e muito) o Oscar de melhor filme.
    • Chico de Assis
      hymie, aprenda a escrever ao menos. sem argumentos e analfabeto funcional.
    • Amanda Silva
      Achei o filme interessante! Quando terminei fui as lágrimas, fiquei bastante emotiva. A história se baseia em relatos reais e isso me deixou mais triste. Não achei o filme uma comedia. Acho que eu não ri em nenhum momento. Eu indico o filme! A final precisamos entender o passado para não cometer os mesmo erros no futuro. Numa sociedade racista não basta não ser racista. É necessário ser antirracista. Filósofa e militante Angela Davis.
    • Albérico Marinho
      Gostei de como o Ator demonstra a força que o protagonista faz para ser comedido e não ser levado para nem um dos lados extremos.
    • Marcelo Silva
      Exatamente, basta ver aqui mesmo, os caras que se doeram com as críticas as KKK.
    • Marcelo Silva
      Ah jura, vai chamar a moça de ''histérica(sim, o correto é com H, não com H, espertão rs)?Não cansa de ser um estereótipo não? Muito feliz que o filme tenha atingido em cheio gente como vc, sim, pq foi pra denunciar seu tipo que o Spike Lee montou essa obra.. Se dói ai mesmo que o chapéu serve direitinho pra vc.
    • Marcelo Silva
      Não é culpa da obra se a KKK mesmo se define como extrema direita...E assim, se a KKK ta de um lado, certamente estarei do outro.No mais, pela sua resposta abaixo, da pra ver bem seu nível...
    • Matheus Ramos Gomes
      Ola. Como faço para ver o filme ?
    • Hymie Adonson Cunha
      Ha! Cale-se!
    • Hymie Adonson Cunha
      Como todo Esquerdo-pata: fanática e estérica, Fala - Fala, e não diz coisa com Coisa. perda de tempo debater com uma porta. Voces são uns Boçais. Idiotas ao Extremo.
    • Alex Lordelo
      eu não! e voce, ja chupou as do Maduro?
    • paulo ricardo
      ja chupou as bolas do trump hoje?
    • klaus
      Excelente filme. Não achei comédia. A fala do Trump fechou com chave de ouro.
    • Leandro de Souza
      Realmente no filme é mostrado o lado violento do movimento negro,que reforça o argumento de q ódio só traz mais ódio, e é por isso q citei o Dr. King pela forma com q ele lutou,pelo fato de incluir todos em suas palestras pois esse debate é de interesse universal,por n destilar ódio em nenhum de seus discursos.Eu gostei do filme sim, porém ele mostra os dois lados de uma mesma face da moeda,e esses dois lados são realmente muitos ruins.
    • Hannah Lerê
      Os fatos provam diariamente, e de maneira cruel, exatamente a minha visão de mundo.Não sou ególatra e nem quero enriquecer qd há pessoas q passam fome, não têm casas.Não defendo morte de trabalhadores e trabalhadoras, nem aprovo uso de armas, caça de animais, nem retirada de lgbt* do direito a direitos humanos. Não sorrio e me saboreio com a tristeza alheia.
    • Hannah Lerê
      Capital, exclusão, violência, preconceito, complexo de superioridade, não aceitação a própria classe a q pertence, são alguns dos diversos sintomas.Observe a sua misoginia e machismo ao se dirigir a mim.Os fatos são expostos todos os dias, nas ruas, nas sentenças a Lula, nos cárceres lotados de negros, na corrupção desenfreada dos bolzis, no falso moralismo dos homens e mulheres de bem.A minha visão de mundo inclui tb o que está fora da minha bolha.
    • Alex Lordelo
      Só me resta mesmo é rir da sua imbecilidade, e de sua visão deturpada do mundo a sua Volta.
    • Alex Lordelo
      Essa é a sua visão. mas não necessariamente condiz com os fatos.
    • Filipe Husak
      ja ouviu falar em Angela Davis amigo? Rosa Parks? só pra começar. o movimento só houve a partir da necessidade de se defender do opressor. porra de papo de racismo reverso. e se em dados momentos se fez violento, se não o fosse não teriamos conquistado o pouco que conquistamos. a luta ainda segue e temos mtos outros negros que nos representa além do Dr.quanto ao filme, deveria assistir dinovo, pois ele faz alusão a face violenta do movimento negro. o resto é historia. recomend conhecer.
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