Minha conta
    O Grande Kilapy
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    O Grande Kilapy

    Em cima do mar

    por Renato Hermsdorff

    Kilapy, em kimbundu, uma das línguas mais faladas em Angola, quer dizer golpe. Uma coprodução entre Brasil, Portugal e Angola, O Grande Kilapy é um filme de época levemente inspirando na figura de João Fraga (Lázaro Ramos), um angolano bon vivant que vai estudar em Portugal, donde acaba por ser deportado. Passada nos anos 1960/70, a história tem como pano de fundo ainda os anos de ditatura Salazarista em Portugal e, sobretudo, a luta pela independência do país africano (processo que culminou bem sucedido só em 1975).

    João é um jovem imigrante que estuda engenharia em Portugal. Mas ele não quer nada com a hora do Brasil (no caso, de Portugal). Só quer saber de farra e vive correndo atrás de um rabo de saia. É o Joaozinho das Garotas. Seu comportamento, no entanto, desperta a atenção dos agentes da polícia política (a famosa PIDE, Polícia Internacional e de Defesa do Estado) do regime ditatorial. O cara é imigrante e negro fazendo farra na terra de Salazar. "Tem caroço nesse angu", pensam os agentes preconceituosos.

    Quando Joãozinho ajuda um amigo, Raul (João Lagarto, o melhor ator no filme), a fugir da recruta militar, ele mesmo é incriminado e tem que voltar para Angola. Na terra natal, o pai (Antonio Pitanga, outro brasileiro do elenco, que ainda traz Maria Ceiça, Hermila Guedes e Adriana Rabelo, em papéis pequenos) o ajuda a encontrar trabalho, e ele vai parar no departamento de Finanças. Se em Portugal, o Don Juan era bancado pela filha de um ministro, em Luanda ele estabelece um esquema de caixa dois para manter seu alto padrão de vida, despertando, mais uma vez, a atenção (inveja?) das autoridades locais. Vira uma herói às avessas.

    Praticamente sem trilha sonora e sem fluidez no ritmo, o filme transcorre sem nenhuma grande surpresa. O Grande Kilapy não ofende, mas também não surpreende. Um dos problemas da produção é que ela, sem força dramática, não se posiciona nem como um filme político (O Que É Isso, Companheiro? ou O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias), dado seu contexto; e nem como a grande aventura (Onze Homens e um Segredo? Prenda-me Se For Capaz?) que o título pode sugerir.

    Não há mistérios quanto ao golpe que Joãozinho pratica. A ação é simplesmente um (e não o) dos elementos narrativos. Mesmo a “reviravolta” do herói é difícil de ser comprada metaforicamente como o golpe porque a discrepância entre o que é narrado (“e ele foi aclamado como...”) não bate com o que é mostrado (meia dúzia de gatos pingados da família “o aclamando”).

    Como parceria entre países lusófonos, O Grande Kilapy é uma iniciativa louvável – Argentina e México, por exemplo, têm muito mais experiência em filmar coproduções com a Espanha do que nós tupiniquins. Mas, tecnicamente, o filme soa um tanto amador. A despeito do inchaço no número de personagens, é possível notar, por exemplo, atores brasileiros dublados, cenários meio capengas e elenco de apoio mecânico. O próprio Lázaro, que se esforça, com méritos, no sotaque local, tem seus momentos canastrão como o conquistador.

    Dirigido pelo angolano Zezé Gamboa (que estreou na direção de longas-metragens com O Herói, Grande Prêmio do Júri em Sundance 2005 na categoria World Cinema), O Grande Kilapy deixa a impressão de ser um filme em cima do muro. Ou em cima do Atlântico. No raso, a produção é um exercício cinematográfico sem potencial para levar o espectador muito longe. Vale para conhecer melhor a história de um país irmão colonizado pela mesma potência do século XVI. Vale para ter uma ideia do que se tem feito no cinema angolano, raro por aqui. Vale como o começo de uma parceria entre os países de língua portuguesa. Vale, até, pela curiosidade em ter um elenco brasileiro em uma produção africana. Mas não vale quanto pesa.

    Quer ver mais críticas?

    Comentários

    Back to Top