Num trabalho de elenco nunca menos que formidável (todos, todos os atores estão bem em seus papeis), um roteiro MUITO bem desenvolvido, Entre Nós se confirma como aquilo que eu nem suspeitava: um intenso estudo de personagens. Personagens, sim, porque cada um deles tem a sua individualidade, a sua incógnita, e principalmente, a sua culpa. O desenho de som do filme, aliás, é notável. Parece que reconstrói a história toda aquela trilha-sonora e aqueles ruídos entre uma faixa e outra. A propósito, o que é feito aqui com uma certa canção é o melhor uso de uma música que vejo em um filme desde que assisti a "O Abismo Prateado".
Fabuloso e muito edificante, Entre Nós acerta por nunca entregar a trama de bandeja, ou simplesmente estereotipar personagens. Paulo Morelli tem o total domínio de seu roteiro, e consegue tirar absolutamente tudo o que quer de seus atores, e o melhor: traz uma interação entre eles que é muito agradável aos olhos. Principalmente nos primeiros momentos do filme. O que transporta ao segundo segmento um sabor especial. São tantas mágoas, tantas histórias colocadas pra debaixo dos panos, que fazem um contraponto interessante com toda aquela felicidade inicial. E mesmo assim, vejam bem, todos eles ainda têm aquela chama da amizade, de tanto tempo atrás, acesa.
Além do mais, Entre Nós acerta também ao nunca sair do ambiente em que escolheu. E não precisa de muletas e outros cenários pra contar os rumos que seus escolhidos resolveram seguir ao londo de 10 anos. É uma história pesada, mas que é tratada com leveza e alívios cômicos por todos os lados. E são poucos os que sabem fazer isso. Morelli, depois de cometer alguns deslizes em seus longas anteriores, dessa vez equilibrou os dois polos perfeitamente.
Não há um protagonista nessa trama, mas fica claro que o ato cometido pelo personagem de Caio Blat é o que motiva a narrativa. De tal forma que seus momentos finais são bastantes satisfatórios, ao colocar a moral dúbia do personagem em cheque.
A cena do clímax, no penhasco do início do filme, é tão tensa que acreditei que ali o personagem fosse se mostrar um vilão. Mas fique extremamente feliz que isso não aconteceu. No entanto, podemos notar que aquela olhada no horizonte é, justamente, onde o personagem abdica de toda a culpa que poderia sentir com aquilo tudo, quando colocou pra fora, para a pessoa a qual a verdade mais importava.
No entanto, imitando fortemente a vida, nem tudo em Entre Nós é resolvido. Boa parte das montanhas de sentimentos que preenchem o filme ficam sem um final propriamente dito, mas é isso que é tão legal aqui: a forma com que todos os envolvidos lutam pra criar uma realidade constante, montar uma linha do tempo muito crível. E não resolver conceder a nós, meros espectadores, aquilo que a gente quer de mão beijada é um recurso curioso, e muito atraente.