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    O Pacto
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    O Pacto

    Faça a coisa certa

    por Bruno Carmelo

    O início parece nos preparar para o pior: em menos de quinze minutos, somos apresentados ao casal perfeito Will (Nicolas Cage) e Laura (January Jones). Eles são belos, felizes, intelectuais (ele é professor de literatura, ela é música), de classe média-alta, sexualmente ativos, com amigos interessantes. Logicamente, como casais felizes não recheiam um filme de ação, Laura é estuprada na cena seguinte, em plena rua. Com a mesma rapidez, aparece Simon (Guy Pearce), um justiceiro que propõe encontrar e matar o estuprador – e o faz com uma eficiência surpreendente.

    O espectador pode ter a impressão de ter visto um filme inteiro condensado, mas O Pacto está apenas começando. O interesse não se encontra na história de Laura, mas na de Will, homem de grandes valores morais (ele paga o passeio dos alunos pobres com o próprio dinheiro) que é obrigado a recompensar o favor de Simon com outro de mesma espécie: matar um homem. Esta obrigação poderia ser apenas o motor para mais um suspense, mas o ingrediente principal deste roteiro é o peso moral da escolha de Simon, e os limites do uso da violência.

    Por isso, ele aceita aos poucos pequenas chantagens dos justiceiros, que exigem dele ações cada vez maiores, mais fortes, mais imorais. Este desenvolvimento, aliás, não se concentra no fator espetacular da ação. Os fãs de Nicolas Cage que forem ao cinema para ver grandes perseguições de carros e corridas desenfreadas pela cidade encontrarão cenas bem abaixo da média, a anos-luz dos efeitos de montagem, luz e direção encontrados, por exemplo, em Missão Impossível - Protocolo Fantasma ou Millennium - Os Homens Que Não Amavam as Mulheres.

    Mas enquanto a cota de ação cumpre o mínimo esperado de um filme de gênero, a trama caminha por rumos cada vez mais interessantes. Ao invés do tema da justiça individual com as próprias mãos, estamos diante de uma complexa organização de cidadãos comuns que acreditam que a polícia não é eficaz, então é preciso que as pessoas cuidem de suas próprias seguranças. O individualismo e a paranoia tipicamente americanos são bem retratados por esta descrença coletiva em qualquer instituição: polícia, escola, igreja. Nenhum desses merece confiança; é cada um por si.

    Desta maneira, o grupo de habitantes que acredita no "olho por olho, dente por dente" não lembra exatamente uma associação criminal, e sim uma seita com preceitos filosóficos muito precisos. Simon, interpretado muito discretamente por Guy Pearce, é uma espécie de mentor não movido pela sede desenfreada de sangue, e sim pela necessidade de "criar um mundo melhor para minha esposa e minhas filhas". A violência é justificada com a melhor das intenções.

    O Pacto pode lembrar um drama muito controverso, dirigido por Spike Lee, e com o belíssimo título Faça a Coisa Certa. Neste filme, toda a questão era ligada à moral da violência: até qual ponto é justificável tirar a vida de outra pessoa? Entre tiros e corridas, entre bandidos e mocinhos, Nicolas Cage encarna esta mesma questão. Após múltiplas reviravoltas, Will tem seu inimigo maior nas mãos, com a possibilidade de lhe quebrar o crânio. Mesmo assim, os olhares em volta não toleram a cena, identificando o agressor, Will, como o culpado. O título original do filme, "Procurando justiça", tem um gosto ainda mais amargo quando o limite entre os bons e os malvados se apaga, e as boas intenções nem sempre dão origem a boas ações.

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