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    Fora do Armário: Nova série da HBO aborda transexualidade e dificuldade de aceitação das famílias (Primeiras impressões)

    Uma questão de sociedade e de lugar de fala.

    Embora a expressão "sair do armário" seja frequentemente associada à questão da orientação sexual (homossexualidade, bissexualidade), a série Fora do Armário, da HBO, tem como tema principal a identidade de gênero (transexualidade e cisgeneridade).

    O AdoroCinema assistiu ao primeiro episódio do projeto documental, dirigido por Tatiana Issa e Guto Barra. Desde o início, é possível perceber a preocupação dos diretores em abordar tanto homens trans quanto mulheres trans, além das famílias destes. Os protagonistas são jovens, em boa fase de aceitação de sua própria identidade. O recorte foge do eixo Rio-São Paulo, algo notável por dar visibilidade a casos do Brasil inteiro, em cidades grandes ou pequenas, com grande destaque na mídia ou não.

    O discurso é progressista: nenhuma pessoa é julgada, podendo se expressar livremente. Existe grande respeito na conversa com cada adolescente, que faz questão de expor sua história como forma de ajudar outras pessoas em situação semelhante. A representatividade é um mérito importante de Fora do Armário: essas questões precisam ser abordadas cada vez. Retirar os indivíduos trans da invisibilidade e dos estereótipos (de pessoas perturbadas psicologicamente ou "falsas") é um papel que a série efetua de maneira assertiva.

    No entanto, a abordagem merece alguns questionamentos. Primeiro, por equilibrar o tempo de tela entre os jovens trans e seus pais e irmãos. Diante de protagonistas bem confortáveis com seu gênero, as "vítimas" são os familiares, que choram e falam de sua dificuldade de aceitar a identidade dos filhos ou irmãos. Ora, seria interessante dar claro protagonismo às pessoas trans, priorizar a fala destas pessoas em relação à dos outros.

    Chega a surpreender que até amigos da família ou a nova namorada do pai de um deles seja questionada sobre a maneira de lidar com um adolescente trans, como se isso fosse uma questão de opinião, na qual todas as vozes tivessem o mesmo peso. Na verdade, o único ponto de vista que realmente importa é o dos jovens sobre si mesmos. Eles não precisam da validação de pessoas cisgênero para viverem sua transexualidade.

    Além disso, a série se tornaria mais potente se acompanhasse o dia a dia desses personagens, ao invés de apenas ouvi-los falar sobre o que viveram. Um pai diz que aceita o filho trans como é, mas pouco depois a irmã deste jovem revela que as brigas em casa foram violentas. É muito diferente acompanhar uma realidade e colher relatos sobre elas. Embora tecnicamente competente, o formato é tradicional, e ganharia em profundidade caso incluísse momentos espontâneos e corriqueiros, ao invés de discursos formulados para a câmera. Quem sabe os próximos episódios não equilibram a abordagem?

    Apesar dos pesares - uma música sentimental demais aqui, um recurso exagerado ao "antes e depois" das fotos e nomes acolá - Fora do Armário consegue abordar a transexualidade sem o fetiche da marginalidade, de modo empático e bastante natural. Como deveria ser, aliás.

    A série estreia dia 5 de abril na HBO.

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