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    Crisis in Six Scenes: Confira nossa crítica da nova série de Woody Allen!

    Já disponível na Amazon Prime.

    Por mais que tenha egresso da TV, há décadas Woody Allen tem se dedicado ao cinema, com uma invejável média de ao menos um filme por ano. Diante de tal histórico, foi uma tremenda surpresa quando o criador de clássicos do porte de Noivo Neurótico, Noiva NervosaManhattan anunciou que escreveria, dirigiria e estrelaria uma série em seis episódios para a Amazon, plataforma em streaming que, nos Estados Unidos, rivaliza a atenção do público com a Netflix.

    Quase dois anos depois, Crisis in Six Scenes enfim foi lançado - e, infelizmente, não está ainda disponível no Brasil. O AdoroCinema pôde conferi-lo durante uma viagem a Los Angeles, quando foi cobrir a junket de Jack Reacher: Sem Retorno, e logo compreendeu as reclamações do diretor no Festival de Cannes 2015, sobre o quanto se arrependia de ter aceito o contrato proposto pela Amazon.

    Não que a série seja ruim, muito pelo contrário. Entretanto, por não estar habituado ao formato e estilo das séries de TV, diferente daquele implementado em um longa-metragem, Allen cometeu irregularidades típicas de um novato. Por exemplo, a obrigatoriedade em entregar episódios de 23 minutos fez com que, em vários momentos, certas sequências fossem bastante alongadas, desnecessariamente. Da mesma forma, a esposa do personagem de Allen ganhou pacientes que, por mais que até tragam uma certa graça, são desnecessários à trama como um todo. Fosse um filme, a trama sofreria cortes rigorosos na edição, ainda mais com um diretor de histórias enxutas como é Allen, que jamais fez um longa com mais de duas horas de duração.

    Ainda assim, Crisis in Six Scenes traz momentos bem divertidos - e surpreendentes, para quem acompanha a carreira do diretor. A começar pela escolha do rock "Volunteers", canção da banda Jefferson Airplane, cuja letra de imediato antecipa o tema da série.

    "Look what happening out in the streets

    Got a revolution, got to revolution

    Hey I'm dancing down the streets

    Got a revolution, got to revolution"

    Quem conhece o diretor sabe que ele não gosta nem um pouco de rock'n'roll, preferindo usar música clássica e jazz em suas produções. Entretanto, a história de Crisis in Six Scenes é situada nos anos 1960, época da ascensão do rock e quando o estilo musical se estabeleceu como hino da juventude e da rebeldia, temas que são abordados pela série. Ou seja, Allen passou por cima de seus gostos pessoais em nome do que funcionasse melhor no contexto da obra em andamento, o que também demonstra uma saudável reverência ao que o material necessita em detrimento do seu paladar - algo que poucos diretores na atualidade fariam.

    Escolhas musicais à parte, o que Allen realmente quer com Crisis in Six Scenes é expor os tumultuados anos 60 e seus conflitos ideológicos. Comunistas x capitalistas, brancos x negros, homens x mulheres e pobres x ricos são alguns dos contrastes levantados no decorrer da série, especialmente através do casal tipicamente burguês formado por Allen e a ótima Elaine May e a revolucionária interpretada por Miley Cyrus. A cantora/atriz, por sinal, foi escolhida para o papel muito graças à sua persona pública "contestadora", que imediatamente é transferida para o perfil da personagem - e ela até está correta em cena.

    Só que, como esta é uma produção de Woody Allen, é claro que estes conflitos serão apresentados através de muita verborragia, com o típico verniz literário/filosófico/histórico que o diretor tão bem sabe construir. Há várias pérolas espalhadas no decorrer da série, envolvendo desde particularidades da época, como James Dean, até piadas envolvendo religião e questões comportamentais, daquelas de rir com gosto. Allen brinda o público com diálogos afiados e uma atuação bastante convincente, mesclando a neurose habitual com o comodismo do "liberal de limusine", como define as pessoas contrárias ao status quo que se recusam a rir às ruas para protestar.

    Por mais que tenha um rico material em mãos, Allen por vezes destoa justamente devido à sua dificuldade em lidar com o formato de série. Se os dois primeiros episódios brilham, fluindo muito bem graças ao timing dos diálogos e das atuações, o terceiro já traz uma longa conversa no restaurante que poderia, pelo menos, ser cortada pela metade. O mesmo acontece no último episódio, quando a primeira metade demonstra um frescor inexistente na reta final, arrastada. Ainda assim, Allen se esforça para que cada episódio traga um certo gancho para o seguinte, de forma a prender o público - o que também soa como uma certa ingenuidade, já que o espectador típico do diretor não necessita de tal artifício para conferir sua produção.

    Apesar de tais irregularidades, Crisis in Six Scenes é uma série divertida e com alguns ótimos momentos, que talvez funcionasse melhor no formato de filme. Apesar de até haver uma abertura para uma segunda temporada, dificilmente ela existirá devido às reclamações públicas do próprio diretor em relação ao formato. Ainda assim, trata-se de seu melhor trabalho desde Blue Jasmine - o que significa dizer que é superior a Magia ao LuarHomem Irracional e Café Society.

    Nota: 3,5

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