"Pureza" 1:41:00 mim.
Direção : Renato Barbieri
O filme aborda a questão do trabalho em condições análogas à de escravidão no Brasil, atemporal, esse seria o melhor termo para definir as realidades social, econômica e política expressas na película. Homens, mulheres e situações de extrema vulnerabilidade aparecem e desaparecem ao longo da trama dramática que envolve o leitor a cada cena levando-os aos desdobramentos trágicos e reais do cotidiano das personagens. Muito embora o cinema cumpra uma função primária de entretenimento, o que temos no filme, são realidades expostas de maneira muito sensível e cruel da vida real.
O filme é atemporal, ainda que o caso específico, seja o da personagem Dona Pureza Lopes, mulher brasileira, oleira, cansada de ser explorada e que ao ir em busca do filho, Abel Lopes, se depara com a situação trabalhista análoga à da escravidão numa grande fazendo de gado no Norte do Brasil. A personagem Dona Pureza é interpretada pela atriz Dira Paes.
A sua atemporalidade ainda se revela no episódio do Senador corrupto, Chico Lopes, que serve a mando do grande pecuarista, Sergião, lembrando em continuidade aos tempos do coronelismo, onde muito provavelmente, o voto, o sangue e a vida dos milhares de homens escravizados serviam para eleger esse tipo de político corrupto.
Me fez lembrar o personagem da nossa literatura; Fabiano de "Vidas Secas" do Graciliano Ramos "Você é um bicho, Fabiano", inclusive o personagem "pivete" fazendo citação textual "nós não somos homens aqui somos bicho".
Ao explorar a questão do trabalhador escravizado, o filme revela que tal condição é estrutural, deixa transparecer a ausência do Estado-nação, denuncia o analfabetismo enquanto instrumento de dominação promovida pelo que o sociólogo Jessé Sousa chamou de "elite do atraso", aqui os grandes fazendeiros escravocratas, com o apoio a anuência do Estado que por meio dos aparelhos burocráticos, o Ministério da Justiça, que envia representante para entravar a criação de grupo contra a exploração do trabalho.
A atemporalidade é muito bem retrata na velha prática da "caderneta", situação social muito vivida no Brasil desde os tempos da Colônia, passando pelo Império até hoje, é muito comum o dono das fazendas serem donos também dos "armazéns", mercados onde os trabalhadores fazem as suas compras e ali ficam endividados e dessa maneira se tornam diretamente "escravo" da dívida não podendo ir embora e sofrendo todos os tipos de violências até a própria morte, como nos casos dos personagens "Piauí" e "Pivete", mortos a sangue frio e com graus de sadismo e maldade, pois os assassinos tinham a certeza da impunidade.
O Ministro Público Federal, a Pastoral da Terra da Igreja Católica e um grupo da sociedade civil, Criam o Grupo Móvel e com o apoio da Polícia Federal começa a desmontar a rede criminosa de exploração de homens e mulheres que são submetidos às mais vis condições de trabalho nas fazendas do Brasil.
Por fim. Em sua fala na Tribuna do Fórum Nacional de Combate à Violência no Campo, dona Pureza diz "aqui não é uma nação livre" (1:44:00).
Dona Pureza, quiçá somos uma nação! Digo eu.
Nas legendas finais diz que o Grupo Móvel libertou mais de 52 mil trabalhadores em condições análogas à escravidão.
Porém, que no atual projeto de governo e de nação, os trabalhos escravos estão aumentando.
É filme obrigatório a qualquer pessoa interessada na solidariedade aos trabalhadores do campo.