Vermelho Sol: Críticas

(Insta: cinemacrica) - Quem diria que a discussão sobre quem é maior merecedor de sentar-se à mesa de um restaurante renderia desdobramentos tão profundos. De um lado, Claudio tem a seu favor o fato de ter chegado primeiro. Dou outro, um estranho exaltado argumenta que a ociosidade corrente deveria ser substituída por alguém disposto a jantar naquele momento. Mesmo abrindo mão do lugar, Claudio chancela seu contragosto com um discurso humilhante para o faminto e impaciente homem. A rusga aparentemente trivial é o bastante para o ego tirar o corpo da inércia. Comete-se um crime.
Apesar da pouca idade e portfólio enxuto, o diretor Benjamín Naishtat demonstra notável maturidade numa obra extremamente consistente em moldar a ambiguidade humana. A cena inicial já deixa isso claro: cedo o lugar, mas, na verdade, não cedo. Por meio de sutilezas esse nosso aspecto é explorado em tantas outras ocasiões. Os recursos não são gratuitos, as mensagens são elegantemente costuradas. Exemplo disso é a função cinematográfica da família. A subtrama vivenciada pela filha pouco se relaciona com a narrativa principal em termos físicos, mas exercita um constante jogo de tangibilização metafórica. Na aula de ballet, a garota é incitada a se aproximar da professora até uma distância desconfortável: “isso é intenção”, diz a professora. É justamente esse ato humano que remói o psicológico paterno.
Naishtat é ainda mais provocativo por relativizar não só nossas intenções, mas a ambiguidade que envolve a transgressão legal quando contextualizada por normas sociais locais. Claudio vive numa cidade onde não faltam exemplos de condutas questionáveis: porte de arma, apropriação de imóveis, sequestro. Tomadas isoladamente são frágeis alvos de críticas, mas haveria algum contexto que as tornariam aceitáveis? O mesmo se aplica ao ato central de transgressão do protagonista. Um indício de que esse exercício é controlado, é a inserção de um agente de outro país para conduzir as investigações do caso principal.
Apesar de levar algum tempo entre a conexão do fato inicial e consolidação do suspense final, é uma obra bem conduzida e que vale ser vista.