Adentrar no universo de Lynch é mergulhar em um mundo de possibilidades inusitadas e oníricas. Em geral, quando vemos um filme de Lynch sentimos que estamos sonhando, ou melhor dizendo, que somos o protagonista de um pesadelo. É possível estabelecer alguns paralelos entre sua obra e a do célebre espanhol Luis Buñuel, de "A bela da tarde" e "Esse obscuro objeto do desejo", no que diz respeito ao surrealismo. Por meio do bizarro, do grotesco, do surreal, Lynch nos fazer mergulhar no mais real da vida cotidiana: brutal, inflexível, violenta , sem concessões. O cinema comercial tenta nos fazer acreditar que as mulheres acordam belas e que de um minuto para o outro , encontra-se a felicidade embalada em um pepel cor-de rosa. No cinema comercial as pessoas não transpiram; não cheiram mal; são sempre sensuais, mesmo com uma perna baleada e no meio de uma perseguição policial. Na verdade os filmes comerciais deveriam ser considerados surreais, pois são eles que realmente maquiam a realidade e fazem as pessoas e as coisas parecerem mais bonitas, glamourosas e simples do que são. "Veludo azul" mostra o submundo, que infelizmente faz parte da realidade. Muitas pessoas , infelizmente , vivem no submundo, se drogando, agredindo fisicamente e emocionalmente , sendo agredidas, cometendo crimes para sobreviver ou simplesmente por sadismo.Porém, o que encanta em "Veludo azul" não são as cenas de violência. Pelo contrário. É extremamente comovente perceber que mesmo nos ambientes mais hostis e brutais , o amor floresce ; a solidariedade existe e o desejo e a piedade brotam com sinceridade. Merece destaque a cena em que a personagem de Isabella Rossellini canta "Blue Velvet" em uma boate e é observada pelo personagem de Kyle MacLachlan , que a olha simplesmente fascinado. Talvez , o desejo seja simples assim; sem discursos ; sem beijos aplaudidos por plateias de desconhecidos em aeroportos ou qualquer outro ambiente público. Talvez o mais verdadeiro desejo só possa ser sentido e expressado na intimidade e no silêncio.