Críticas AdoroCinema
2,5
Regular
Café com Canela

Experimentar por experimentar

por Lucas Salgado

Primeiro longa metragem dos diretores Ary Rosa e Glenda Nicácio, Café com Canela é praticamente uma produção universitária. No melhor e pior dos sentidos. Possui um frescor e um olhar especial digno da juventude e de quem quer pensar cinema e ao mesmo tempo atingir um público. Por outro lado, oferece um experimentalismo tão vazio, que é quase como se alguém estivesse tentando técnicas e linguagens diferentes. Com isso, o filme é tão anacrônico que se torna banal.

Realizado no Recôncavo da Bahia, o longa banaliza o risco, perdendo qualquer personalidade que poderia desenvolver. Arrisca por arriscar e acaba se tornando vazio. Para terem uma ideia, o filme apresenta inúmeras razões de aspecto ao longo da trama. 4x3, 16x9, widescreen e por aí vai. Investe em flashbacks flashforwards, quebra a quarta parede, insere uma câmera subjetiva no cachorro, traz cenas em grande angular, apresenta transições com paisagens aleatória, possui cenas de sonho e pesadelo.

É tanta "ousadia" que desvaloriza aquilo que tem de mais forte, que são seus personagens e atores, em especial Valdinéia Soriano, Aline Brunne e Babu Santana. Embora simples (e em alguns momentos simplória), a premissa principal do filme consegue seguir em frente muitas vezes por causa do esforço de seus protagonistas, todos carismáticos e de boa presença em cena. Se a produção falha nos momentos em que busca criar tensão e nas cenas em que cai num melodrama muito barato, há de se reconhecer que consegue criar um humor de situação bem especial, sendo realmente divertido por vezes.

Não fosse a vontade desesperada de se mostrar ousado, o longa poderia funcionar melhor com a trama escrita por Ary Rosa, que segue Margarida (Soriano), uma mulher que perde o filho e acaba entrando numa situação de inércia. Ela deixa tudo de lado, marido, amigos e carreira. Determinado dia, encontra uma ex-aluna, Violeta (Brunne), que toma como missão resgatá-la daquela situação.

Ao mesmo tempo, o filme segue a história de Violeta e seus vizinhos. Casada com duas filhas, ela cuida da avó, que está muito debilitada. Além de interações divertidas entre o grupo de personagens, a obra oferece uma boa reflexão sobre dor e perda, que atinge praticamente todos em cena, cada um lidando à sua maneira.

Glenda e Ary arriscam bastante, caminham por temas interessantes e possuem, é claro, o mérito de fazer cinema em uma região ainda pouco valorizada na cena da produção cinematográfica, algo que está mudando com a presença do curso de Cinema na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).

Café com Canela é definitivamente um filme com personalidade. Só não parece ter muito a dizer.

Filme visto durante a cobertura do 50º Festival de Brasília, em setembro de 2017.