Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
De Volta

Os fantasmas do presente

por Bruno Carmelo

Uma casa abandonada num vilarejo libanês. Nesta cidade onde todos investigam a vida de todos, o imóvel desocupado funciona como um ponto de interrogação. Quando Nada (Golshifteh Farahani) retorna ao país e ocupa a casa deteriorada, sua presença se torna o centro das atenções. Ela pretenderia vender a casa? Se mudar para lá e morar sozinha, mesmo sem marido? O que o pai dela pensa? O que o avô, antigo morador do imóvel, diria disso tudo? A nova proprietária precisa se afirmar como mulher, como adulta, como libanesa e como indivíduo independente.

O ponto de partida é sedutor, e se torna ainda mais interessante pela escolha da versátil Farahani. Além disso, a diretora Jihane Chouaib retrata uma realidade que conheceu quando criança: o repatriamento, o conflito de culturas e complexa noção de coletividade de um povo disperso após sucessivas guerras. De Volta acena a temas como o feminismo, as feridas abertas do Líbano, o abandono, os traumas de infância, o peso da religião, o conflito entre tradição e modernidade, entre o Ocidente e o Oriente. Estas questões são discretamente abordadas ao longo da projeção, mas se limitam a panos de fundo. Nenhuma delas é realmente aprofundada.

Esta escolha é compreensível: para retratar a vida de uma mulher deslocada, com poucos laços afetivos e ignorante em relação ao passado de seu próprio país – ela não viveu a guerra, mal fala o árabe, desconhece as circunstâncias do desaparecimento do avô – a cineasta opta por uma narrativa igualmente lacônica. Desconhecemos a vida da protagonista Nada fora deste lugar, não sabemos do que gosta, de quem gosta. Fala-se de um avô misterioso, de um pai jamais presente. A guerra é apenas citada, as conversas com o irmão fazem alusões a passagens que desconhecemos, o perigo representado pelos homens da cidade nunca se concretiza. A jovem se desloca como um fantasma, sem origem nem destino. O filme inteiro remete a um possível pesadelo ou delírio.

Em termos de atmosfera, o resultado é eficiente, tanto no drama quanto no suspense. É uma pena que a montagem sabote as cenas mais complexas, cortando-as imediatamente após um diálogo, sem permitir aos personagens, nem ao espectador, contemplar o silêncio e as consequências destas conversas. As metáforas, como um caderno da infância e os riscos na parede, tornam-se inócuas pela falta de consequências diretas na vida de Nada e do irmão Max (Maximilien Seweryn). Estes e outros símbolos aparecem sem que o espectador conheça a função deles no passado, ou o peso que possuem no presente. De certo modo, o espectador é expulso da dinâmica narrativa, que ocorre apesar dele, e não para ele. O público se posiciona como intruso, tentando montar as peças de um quebra-cabeça que não necessariamente forma uma imagem única.

O resultado transmite frieza, afinal, é difícil torcer por alguém cuja personalidade ou motivação se desconhece. Como estudo de personagem, De Volta decepciona. No entanto, o realismo criado pela direção é competente, e as evocações sociais, ainda que não plenamente desenvolvidas, servem para plantar no espectador uma sensação de incômodo e de vazio que condizem com a situação de Nada. Pelas texturas e pela ambientação, mais do que pela narrativa, o filme encontra um caminho para se comunicar com o espectador.