Críticas AdoroCinema
3,0
Legal
Dois Rémi, Dois

Samba de uma nota só

por Bruno Carmelo

Um ano atrás, chegou aos cinemas O Duplo, uma adaptação da obra homônima de Fiodor Dostoievski sob direção de Richard Ayoade. Esta versão trazia cenários fantasistas, luzes obscuras e aparência constante de pesadelo. Agora, o cinema ganha uma leitura muito mais solar e naturalista da mesma história, dirigida em toda despretensão por Pierre Léon.

Em Dois Rémi, Dois, Rémi (Pascal Cervo) é um homem pouco interessante que descobre um sósia de si próprio. O problema é que o duplo possui todo o traquejo social que falta ao original, tornando-se mais atraente aos olhos dos amigos e familiares. Como de costume nas histórias sobre duplos (que incluem O Homem Duplicado, Cisne Negro, Adaptação etc.), o protagonista tem medo de ser substituído pela cópia. Paira igualmente a possibilidade que as duas metades sejam lados metafóricos da mesma pessoa.

A comédia francesa não traz elementos novos no que diz respeito ao tema da duplicidade. As passagens básicas estão presentes: a suspeita, a confirmação, o confronto, a tentativa de eliminação do outro... Os conflitos se sucedem de modo quase imperceptível, através de cenas lentas, duração total reduzida (66 minutos), movimentos mínimos de câmera e uma atuação contida de Pascal Cervo. Mesmo a trilha sonora evoca apenas três notas musicais: do, ré e mi, o que funciona como um trocadilho no título original, mas perde o sentido no nome brasileiro.

Pierre Léon assume o absurdo da trama de maneira lúdica. São poucos personagens, cores pastéis, cenários repetitivos. O antinaturalismo dos gestos e da trama entra em contraste com a banalidade das ações e da própria existência de Rémi. Isso poderia levar a um embate estético interessante, mas a direção evita qualquer elemento cênico ou narrativo que chame atenção para si mesmo. Assim, nenhuma cena se destaca, nenhum personagem se aprofunda para além do estereótipo e o clímax praticamente inexiste.

Terminada a sessão, Dois Rémi, Dois lembra uma pequena crônica, uma história que começa e termina sem peso, fluindo ao longo de sua trajetória. Proporciona uma sessão agradável, despertando sorrisos com suas figuras excêntricas e diálogos improváveis. Mas a falta de ambição cinematográfica se faz sentir no resultado final. Afinal, agradável não é sinônimo de memorável.