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    A Maldição da Mansão Bly: Crítica da série da Netflix (Sem spoilers)

    Diferente de A Maldição da Residência Hill, Mansão Bly aposta no romance gótico para trazer reflexões densas acerca da finitude do tempo, colocando o terror em segundo plano.

    NOTA: 4,0 / 5,0

    A crítica abaixo não contém spoilers da série.

    Além de ser uma obra-prima do terror, A Maldição da Residência Hill é uma das melhores séries da última década por sua excelência narrativa. O foco de Mike Flanagan não foi assustar a audiência. Na verdade, ele quis comprovar que o medo é o resultado de outros sentimentos, que podem ter raízes mais profundas do que um simples espírito atrás da porta.

    Regida por traumas e dramas familiares, a história da primeira temporada escapou de quase todos os clichês do gênero, elevando as expectativas acerca do que esperamos de uma produção da Netflix. Mas para onde ir após atingir tamanha perfeição? Se o indicativo for Mansão Bly, então podemos respirar aliviados.

    Durante nove episódios, acompanhamos a trajetória de Dani Clayton (Victoria Pedretti), uma americana que se muda para Londres em busca de uma nova vida. Por estar precisando de um emprego, aceita a oportunidade de trabalhar como babá em uma mansão localizada no interior do país. Lá, ela irá cuidar de duas crianças: Flora (Amelie Smith) e Miles (Benjamin Ainsworth).

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    Assim como em todo conto de horror, o início da trama é inofensiva. Os pequenos são carinhosos, a casa é exuberante e os funcionários que trabalham ao lado de Dani são extremamente cordiais. Mas aos poucos, essa ilusão começa a desmoronar, e o passado sombrio da residência vem à tona.

    Essa quebra de expectativas — apesar de óbvia — acaba se tornando um dos pontos recorrentes do seriado. Aqui, os personagens passam por tragédias que os colocam em um estado de extrema vulnerabilidade. E assim como na vida, não podemos evitar perder algo ou alguém que amamos. E é nesta impotência perante a realidade que Mansão Bly encontra a sua força e mensagem central.

    O fim é inevitável. As pessoas vêm e vão. O passado, com o avanço do tempo, torna-se apenas uma lembrança nebulosa. Já o futuro é um emaranhado de incertezas, impossível de ser decifrado. Tudo o que temos é o presente.

    Tais reflexões estão mais atuais do que nunca, e apesar de incômodas, são necessárias. Contudo, é importante ressaltar: Para alcançar tamanha densidade reflexiva, a obra precisou se afastar do gênero que a popularizou: o terror.

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    Ainda há sequências arrepiantes nestes novos episódios, que vão deixar o espectador com os nervos à flor da pele. Elas estão concentradas na primeira metade da temporada, e são milimetricamente calculadas. Por um lado, isso é bom, porque a tensão não é sacrificada em nome de inúmeros jump scares. Contudo, se você espera uma experiência extrema — como a oferecida em Residência Hill — o resultado pode ser decepcionante.

    Os fantasmas e reviravoltas tenebrosas ainda estão lá. Contudo, quem protagoniza o seriado são os diálogos. São eles que marcam os melhores momentos de Mansão Bly e trazem grande profundidade aos personagens. Até mesmo as entidades mais maléficas são humanizadas e transformadas em seres complexos, que não podem ser julgadas apenas como “boas” ou “ruins”.

    E claro, quanto mais compreendemos as motivações de um vilão, menos temos medo dele. Por oferecer esse entendimento cedo demais, o seriado perde a sua força como obra de horror. Porém, esse pequeno defeito é compensado por uma abordagem pouco utilizada nas produções mainstream: o romance gótico.

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    Quando o seriado abraça de vez o subgênero de filmes como A Colina Escarlate e Drácula de Francis Ford Coppola, a temporada se desprende de Residência Hill e cria a sua própria identidade, abordando questões como relacionamentos abusivos, idealizados e interrompidos. E quem consegue transmitir todos esses temas de maneira visceral é o excelente elenco, que conta com alguns nomes já conhecidos pelos fãs da série. 

    Entre eles, está Victoria Pedretti, que entrega a melhor performance da obra. Como Dani, a atriz consegue transitar entre a fragilidade e a coragem de forma coerente. Não é difícil se apaixonar pela babá que protege as crianças enquanto luta contra os seus próprios demônios. O carisma de sua personagem é magnético e ilumina os corredores sombrios da mansão.

    T’Nia Miller também se destaca como Hannah, a governanta que parece ser o ponto de equilíbrio na assustadora casa. Sempre calma, a estrela intensifica a aura elegante da produção. Entre as crianças, Benjamin Ainsworth rouba a cena vivendo Miles, um garoto sinistro que até lembra Damien Thorn de A Profecia.

    Visualmente, Mansão Bly é um avanço em comparação à temporada anterior. Repleta de cores ricas, enquadramentos deslumbrantes e figurinos requintados, a produção que se passa no interior de Londres acaba conquistando um charme ímpar, que intensifica a nossa imersão na trama. Até mesmo as sequências de terror são melhor estilizadas, e evocam aquele sentimento de estar ouvindo um conto macabro no meio da madrugada.

    Caso a série conseguisse destacar seus elementos dramáticos sem abrir mão da tensão, a continuação seria “perfeitamente esplêndida”, como diz Flora nos episódios. Infelizmente, quando não estamos presenciando grandes revelações ou análises profundas acerca das emoções humanas, o ritmo da obra fica arrastado. Não há muitas tramas secundárias cativantes o suficiente para manter a intensidade ao longo dos nove episódios. Portanto, é necessário ter um pouco de paciência.

    Mesmo assim, a criação de Flanagan é atemporal e valiosa, pois comprova que a finitude do tempo ainda é mais assustadora do que qualquer espírito debaixo da cama. Os fantasmas são apenas ecos do passado, e representam a culpa por trás de nossas escolhas, ou o luto por alguém que já partiu. Sem grandes surpresas, o seriado encontra a beleza por trás de tudo isso. 

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