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    The Walking Dead: Crítica da 9ª temporada

    Um ano de recomeços para o apocalipse zumbi.

    Nota: 3,0 / 5,0

    A 9ª temporada de The Walking Dead é tão camaleônica que existem duas séries completamente diferentes dentro dela.

    A primeira é uma sequência desanimada dos eventos da temporada anterior. Consumida pela iminente partida de Rick, uma subentendida morte que não aconteceu — para esfregar na cara do espectador que a sobrevida deste universo zumbi provavelmente nunca vai acabar — tomou o centro das atenções dos oito primeiros episódios, dedicados aos “passos finais” do líder que conduziu a série até então.

    Nesta primeira parte, uma positiva mudança fica em evidência: a troca de showrunner fez bem à série. Com a saída de Scott M. Gimple para assumir o cargo de “supervisor geral” do universo de Walking Dead, Angela Kang ficou com o cargo máximo na série-mãe, de cara uma boa notícia. Kang fez a realidade pós-apocalíptica soar mais plausível, mais urgente. Surgem dramas relativamente simples, porém eficazes, que fazem com que seja mais fácil o público se conectar com a história, ainda que não se identifique com determinados personagens.

    A visão de Kang também traz uma bem-vinda leveza, algo que fica muito claro nesta primeira parte justamente por existir em um momento da história após a derrocada de Negan (Jeffrey Dean Morgan) e antes da chegada dos Sussurradores. Vai ficando mais presente a ideia da construção de um novo mundo que existe não apenas em busca de sobrevivência, mas visando estabilidade e a reconstrução de uma sociedade pautada em leis. É um equilíbrio que, embora sempre trabalhado em segundo ou terceiro plano, costumava ficar bastante ofuscado em temporadas anteriores, e isso fez com que ficasse difícil ver aquelas comunidades como algo que fosse além de um simples jogo esvaziado de humanidade. Por isso, é necessário reconhecer que existe um esforço para que este não seja mais o caso.

    Ainda que a saída de Andrew Lincoln da série — que, como sabemos agora, não significou a morte de Rick e menos ainda o afastamento total do ator do universo zumbi que conduziu por anos — não tenha sido algo tão definitivo como todos imaginávamos, a decisão ainda é brusca e forçou o drama a se buscar um novo equilíbrio sobre novas pernas. E, sem tirar o mérito do ator, ver a história por novos ângulos fez bem a The Walking Dead.

    A segunda parte da série é praticamente um recomeço completo. Avançamos seis anos na história após a partida de Rick Grimes. Descobrimos que Maggie também foi embora, para ajudar a estabelecer uma nova comunidade. A saída de Lauren Cohan, inclusive, foi o centro de alguns debates visto que havia uma disputa salarial em torno da atriz, que decidiu se dedicar a uma nova série da ABC, Whiskey Cavalier. No entanto, sua partida não é definitiva, e ela mesma já afirmou que a história de Maggie ainda verá novos capítulos.

    Mas neste meio tempo algumas coisas mudaram. Michonne (Danai Gurira) é a nova líder de Alexandria, mas ela não toma as decisões sozinha. Conta com um conselho formado pelos membros mais antigos do grupo, e ela toma conta de duas crianças: Judith, uma pequena garota-prodígio do apocalipse, e R.J., fruto de seu relacionamento com Rick.

    Não existem “mãos de ferro” na liderança de Alexandria, mas há rigidez a respeito de quem entra e quem sai, uma herança dos medos de Michonne de perder mais pessoas para riscos que poderiam ter sido evitados. É claro, Negan ainda está na jogada, e segue preso, mas construindo uma amizade interessante com Judith, vendo nela os mesmos traços de determinação que enxergava em Rick e em Carl (Chandler Riggs).

    A segunda parte da 9ª temporada é tão diferente da primeira que todo o resto parece imensamente distante. A ausência de Rick é sentida, mas não da forma direta como teria sido caso não houvesse o salto no tempo. Seu legado existe e é mencionado, mas as vidas continuaram existindo e as pessoas souberam o que fazer sem ele.

    Ainda que The Walking Dead não viva há tempos seus melhores dias, é revigorante ver uma série ser capaz de se reinventar sob a perspectiva de estar perdendo personagens principais. Foi necessário à série que visse e aprendesse a aproveitar melhor os personagens ao redor, ainda que isso nem sempre funcione.

    O grande problema de The Walking Dead é a sua dificuldade em construir relação de empatia entre espectadores e personagens, sobretudo quando tais personagens ficam em segundo plano durante a trama. Pouco desenvolvidos e sem personalidades complexas, aqueles que não são protagonistas acabam relegados ao papel de simples peões, utilizados para aprofundar a narrativa dos demais.

    Foi por isso, por exemplo, que a série se dedicou, em boa parte dos episódios desta segunda parte da temporada, a aprofundar a história de Henry (Matt Lintz), dando ao garoto parte do arco narrativo que seria originalmente de Carl segundo a linearidade dos quadrinhos. Ficou claro, mais tarde, que tratava-se de uma tentativa de aproximar o personagem do público, para que sua morte fosse sentida e causasse um impulso nas histórias tanto de Carol (Melissa McBride), Ezekiel, (Khary Payton), Lydia (Cassady McClincy) e Daryl (Norman Reedus).

    Há algo de bem interessante na forma como os novos personagens foram apresentados, sejam estes os Salteadores ou os Sussurradores. Ainda não vimos o grande impacto do primeiro, mas Alfa (Samantha Morton) tem se provado a mais cruel e fria das vilãs. Há complexidade na sua linha de raciocínio e no seu instinto por sobrevivência, e os modos quase primitivos do grupo causam uma ruptura com a busca pelo estabelecimento de uma comunidade civilizada pelos líderes do Reino, de Alexandria e de Hilltop.

    Mas tudo isso não é o suficiente para fazer com que The Walking Dead justifique sua longa jornada a passos lentos. A 9ª temporada foi um grande impulso para a série, mas fica evidente o quanto a série ainda lida com dificuldades com uma história com personagens demais, vazios demais, que pouco ou nenhum interesse causam. A saída de Danai Gurira está prestes a criar outro buraco, que pode ser facilmente preenchido caso a série siga neste caminho, aprendendo a tornar seus coadjuvantes menos desinteressantes.

     

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