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    Coisa Mais Linda: Crítica da 1ª temporada

    Série da Netflix faz um belo convite para o espectador refletir sobre a importância do empoderamento e da igualdade de gênero.

    NOTA: 4,0 / 5,0

    Após o sucesso de 3%, série distópica de ficção-científica, a Netflix segue completando sua cartela de produções brasileiras com uma história de outra época, mas que possui diversos elementos que ainda se mantém atuais. Protagonizada por Maria CasadevallCoisa Mais Linda traça uma narrativa de drama e romance com grande enfoque na presença da mulher na sociedade – começando pelo lado mais íntimo e entrelaçando com o profissional.

    Em suma, esta série é um comovente lembrete do que foi (e ainda é) dito e feito com relação às mulheres, negras ou brancas. O desenvolvimento das histórias pessoais de Malu (Casadevall), Lígia (Fernanda Vasconcellos), Thereza (Mell Lisboa) e Adélia (Pathy Dejesus) se intercalam com situações que necessitam de força e coragem, tais como a falta de fé e apoio que as pessoas colocam em seus trabalhos, o preconceito racial, o abuso mental e sexual e a mentalidade de que mulher só deve trabalhar fora ou ser mãe – nunca as duas coisas.

    Após entregar todas estas problematizações nos primeiros episódios e abrir o leque para a reflexão de que isso não parou de acontecer em 2019, Coisa Mais Linda aproveita o cenário de 1959 para inserir elementos da época que ajudam a contextualizar tudo, mas não só isso: a série também nos aproxima facilmente deste pequeno recorte brasileiro que se espelha mundialmente quando analisamos o papel da mulher, especialmente na questão dos diferentes tipos de abuso.

    A música, as origens da Bossa Nova e a crença em algo maior (aqui figurada por Iemanjá) se unem com a vivência pessoal de Malu. Ao se ver perdida no Rio de Janeiro, fora de sua zona de conforto e sem o marido por perto, acompanhamos sua trajetória crescente a fim de conquistar sua independência e respeito (principalmente de sua família de São Paulo, que ajuda a cuidar de seu filho enquanto a protagonista tenta criar uma carreira). O Rio, retratado como uma cidade mais colorida, viva e aberta à mudanças, é o palco para Malu brilhar e concretizar o projeto de montar um clube de música – que vai ganhando mais detalhes e parceiros aos poucos. Mas até ela chegar neste ponto de segurança é onde está o verdadeiro ouro da série.

    Até Malu sair de sua vida de privilégios e se encontrar profissionalmente, acompanhamos a batalha diária de Adélia, mulher negra e mãe, que cruza a vida da protagonista não só como amiga mas também como alguém que lhe abre os olhos e a tira de sua bolha. Em Coisa Mais Linda, por mais estonteante e delicado que tudo pareça ser, existe um bom espaço para os roteiristas e diretores extraírem o máximo de discussão referente às minorias e ao preconceito – e a melhor parte é que Malu (que poderia ser retratada apenas como a heroína que acolhe Adélia como sócia do clube) é uma personagem multifacetada. A produção explora as personalidades complexas do quarteto de mulheres e isso é o que torna a história ainda mais real.

    Seja com Thereza atuando no ramo jornalístico ao lado de homens e tentando colocar o olhar feminino em um veículo que, ironicamente, é focado nas mulheres; seja com Ligia tendo de lidar com seu marido, pré-candidato a prefeito, e sua relação extremamente abusiva ligada às aparências; ou com Adélia e as dificuldades que acabam ficando menores quando consegue seu espaço de trabalho e reconhecimento... Todas essas subtramas fluem bem com o ritmo da trama principal, o que transforma a narrativa em uma correnteza suave, permeada por música e reflexões pertinentes para os dias de hoje. Aliando-se a nomes como Hugo Prata e Caito Ortiz. a presença de mulheres na criação (Heather Roth), roteirização (Luna Grimberg e Patricia Corso) e direção (Julia Rezende) da série certamente acentua a força do ponto de vista feminino e garante impacto na abordagem de assuntos como aborto e violência.

    Por ter sete episódios em sua primeira temporada, dá a impressão de que Coisa Mais Linda toma mais tempo para introduzir seus cenários e suas personagens do que para ligar o início e o fim deste 1º ano. Alguns acontecimentos, sobretudo nos últimos episódios, soam corridos demais – muitas vezes sabemos que algo importante aconteceu em apenas um diálogo. O mesmo pode-se dizer dos relacionamentos amorosos do quarteto, que em um primeiro momento podem surpreender, mas acabam sendo um pouco inconsistentes e não ganham tanto embasamento.

    Mas, por mais veloz que a narrativa fique próxima ao desfecho, a série consegue montar uma base muito interessante para suas personagens e o futuro que todos almejam individualmente e em grupo. A empatia e o ato de simples olhar para o lado, assim como a Bossa Nova, faz parte do cerne de Coisa Mais Linda. Aliada a excelentes atuações (com destaque para Pathy Dejesus), a produção possui fôlego e emoção de sobra por saber dosar os momentos mais leves com os que se aproximam a um "soco no estômago", tornando-se um entretenimento de grande relevância por falar sobre o passado e o relacionando com o presente. Mesmo sem ter apenas a intenção de chocar, esta é uma série que permanecerá um bom tempo em sua mente por trazer tanto conteúdo à tona.

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