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    Blade Runner 2049: Entenda como a cena que trouxe Rachael de volta foi feita (Entrevista Exclusiva)

    O AdoroCinema conversou com Richard Clegg, artista de efeitos especiais do filme, durante o evento VFX Rio.

    RECRIANDO SEAN YOUNG

    "Denis nos deu uma linha para seguirmos em relação ao que ele queria fazer. Ele descreveu a cena do reencontro de Deckard e Rachael como o reencontro de dois antigos namorados em um aeroporto. Ele queria esse tipo de emoção, a do reencontro de duas pessoas que se amam muito e que ficaram separadas por muito tempo. E ela é trazida à presença de Deckard para o manipular [...] Ela entra muito confiante, mas percebe que será rejeitada. Então, há todo esse arco emocional que acontece e nós temos que tentar trazer isso à vida. É aí que minha equipe entra, onde nós colocamos nosso toque pessoal, tentando interpretar a cena", contou Clegg, ressaltando a dificuldade em reproduzir a minúcia das emoções.

    Depois que o crânio já estava modelado, os artistas de efeitos especiais começaram a inserir camadas de pele sobre a ossada. Avançando estágio a estágio, Clegg e sua equipe remontaram a tonalidade correta da cútis da atriz original e incorporaram níveis de imperfeições à pele. Eles também se debruçaram bastante sobre os olhos, as "janelas da alma". Mergulhando nos mínimos pormenores da face de Young, os artistas construíram os cílios, as sobrancelhas e as pálpebras, focando no olhar como a parte mais importante da caracterização do clone. Afinal de contas, globos oculares são símbolos máximos da saga Blade Runner.

    Assim que a cabeça digital ficou pronta, Clegg iniciou o processo de animação das emoções. Quando a equipe alcançou um patamar satisfatório, os artistas começaram a comparar os sentimentos e expressões demonstrados pelo rosto digital com as reações de Rachael no filme original. O grau de refinamento atingido foi tamanho que o supervisor de efeitos especiais decidiu realizar um experimento interessante: retirar e substituir a Rachael do longa de Ridley Scott pela cópia fiel produzida nos computadores da MPC, empresa de Clegg. A equipe remontou o filme e o apresentou - sem anunciar o teste - para Villeneuve e Scott. Os dois experientes cineastas só perceberam o truque quando Clegg revelou as alterações feitas. Foi aí que o desafio final teve início: inserir a Sean Young digital em Blade Runner 2049.

    O RESULTADO FINAL

    Clegg precisou de 10 meses para completar todo o processo de clonagem digital do rosto de Rachael - e tudo isso para uma cena de apenas três minutos. Partindo do registro filmado por Roger Deakins, a equipe VFX (sigla utilizada para visual effects em inglês) modelou o cenário real no computador para rodar testes com o clone mais facilmente. Eles tiveram que replicar, inclusive, o apurado esquema de luzes giratórias do fotógrafo de Blade Runner 2049 para entender a geometria da sequência. Só então Clegg e sua equipe puderam inicializar a substituição dos rostos.

    Nessa altura, a maior dificuldade foi com a fala. Imitar as reações de Peta e inseri-las no rosto digital criado não foi difícil por causa de todos os testes anteriores, mas a nuance e a suavidade da performance complicaram a animação dos músculos inferiores da face. Para superar o problema, eles novamente se voltaram às referências que tinham, tanto das cenas de Rachael em Blade Runner, quanto da gravação da dublagem de Sean Young para Blade Runner 2049.

    Superados todos os desafios supracitados, Clegg e sua equipe finalizaram o trabalho - confira o resultado na foto abaixo - e entregaram uma das sequências pelas quais a obra de Villeneuve provavelmente ficará conhecida. Além da cena de sexo entre K (Ryan Gosling), a holográfica Joi (Ana de Armas) e a prostituta Mariette (Mackenzie Davis) e o encontro de blade runners no avermelhado e apocalíptico deserto da cidade de Las Vegas, o retorno de Rachael é um lance de genialidade dos responsáveis por Blade Runner 2049.

    O FUTURO

    A perfeição de reprodução atingida foi tamanha que uma pergunta crucial não pôde deixar de ser feita: Sean Young está viva - e muito, como Clegg faz questão de ressaltar -, mas e no caso do falecimento de um ator? Eticamente falando, é correto ressuscitar um intérprete digitalmente? O caso do retorno computadorizado à vida de Peter Cushing, falecido em 1994, tornou possível inserir o General Tarkin em Rogue One, mas também gerou grande controvérsia. Robin Williams, por exemplo, proibiu a recriação digital de sua imagem até 2039, quando sua morte fará "aniversário" de 25 anos. Sobre a problemática, Clegg ponderou:

    "É uma questão moral que precisa de muita reflexão e é uma coisa que continuará acontecendo. As pessoas vão ter que pensar sobre isso quando assinarem contrato para franquias e isso é algo que os produtores precisam discutir com os atores, e de preferência antes de estes falecerem. Depende de como a imagem é utilizada. É algo que precisa ser estipulado no testamento, esses direitos de imagem devem ser passados para pessoas de confiança. Desde que as famílias estejam envolvidas, acho que tudo bem. Há algo um pouco perturbador na utilização da imagem de alguém como um clone ou uma cópia, mas se a imagem for utilizada com bom gosto, talvez seja motivo para se orgulhar. De certa forma, é uma honra para um ator ser trazido de volta à vida por ser tão querido ou tão importante para uma franquia. Mas, ao mesmo tempo, é importante conseguir o consentimento da família".

    Blade Runner 2049, que recebeu 4 estrelas na crítica do AdoroCinema, é um dos grandes favoritos às categorias técnicas da temporada de premiações.

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