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    "Um monstro não surge sozinho", explica diretor de O Segredo de Davi, suspense brasileiro sobre um assassino em série (Exclusivo)

    Conversamos com o diretor Diego Freitas e o ator principal, Nicolas Prattes.

    Divulgação

    Nos últimos anos, o cinema brasileiro tem investido em diversas produções de terror e suspense (O Rastro, O Caseiro, Isolados, O Amuleto, O Diabo Mora Aqui), na intenção de conquistar o público que tem lotado superproduções americanas de gênero como Invocação do Mal, Corra! ou Fragmentado

    Um novo suspense nacional em desenvolvimento se chama O Segredo de Davi, primeira experiência de Diego Freitas na direção de longas-metragens. A história acompanha um adolescente tímido, interpretado por Nicolas Prattes, que passa a cometer assassinatos em série devido a um trauma de infância.

    O AdoroCinema visitou o set de filmagem no dia em que a jovem equipe trabalhava na cena final da história - que não vamos revelar aqui, é claro. Entre o quarto do adolescente, uma cozinha sombria e os corredores onde se deslocavam os técnicos, Diego Freitas preparava o ator para construir o tom exato da cena de conclusão. 

    Nós conversamos com Diego Freitas e Nicolas Prattes sobre o projeto que estreia nos cinemas em 2018:

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    Origem do projeto

    Diego Freitas: "O projeto começou quando eu tinha 18 anos de idade, mais ou menos. Tenho 27 anos hoje. Sempre gostei de cinema de gênero, até porque foram esses filmes que despertaram a minha paixão por cinema. Nesses anos que eu vi Clube da Luta, O Sexto Sentido… Quando eu tinha 21 anos, tive um insight vendo O Profeta. Assim me veio a primeira ideia do filme, que eu achei que ia ser um curta-metragem e deixei guardado. Comecei a fazer videoclipe e publicidade, mas aquela ideia ficou guardada.

    Quando viajei para Los Angeles, encontrei uma distribuidora e uma produtora, e pensei que era a hora certa de falar do filme. O Márcio Yatsuda, da Movioca, gostou e me pediu para mandar um argumento. Eu nunca tinha escrito nada, a minha vida era filmar - eu venho da fotografia e da pós-produção. Então escrevi 10 páginas, carregando tudo o que eu tinha guardado todos os anos. Mandei para ele, mesmo sem acreditar muito, e ele gostou. Ele então mandou para uma distribuidora. Eles fecharam um acordo baseado no argumento, e pediram o roteiro.

    Nesse mesmo ano, três meses depois, aplicamos o projeto num fundo setorial e conseguimos metade do orçamento. Fiz um teaser com todo o dinheiro que a gente tinha. Foi um grande risco. Com esse teaser foi possível captar o resto do filme, que ainda sim é barato: R$1,5 milhão".

    Escolhendo o ator principal

    Diego Freitas: "Me falaram do Nicolas [Prattes], que tinha acabado de sair da Malhação e estava começando Rock Story. Vi a primeira semana de Rock Story, em que ele fazia um personagem meio macabro, e gostei muito. Já fui pensando em pintar o cabelo dele de loiro, tirar o bigode… Ele tinha outra bem diferente. Eu, psicopata total, entrei em contato com a mãe dele, que também é atriz, e pedi para ela ler o roteiro, e mandar para ele se gostasse. Ela leu, gostou e mandou o teaser para ele. Depois foi só amor. Peguei um avião e fui no Rio de Janeiro encontrar o Nicolas, e deu certo. Mas testei diversos atores para esse papel durante dois anos.

    Criando um serial killer

    Nicolas Prattes: O Diego me passou várias referências, especialmente Cisne Negro. Ele tem tudo muito claro na cabeça, cada cena tem uma luz específica. Mas ele me passa tudo o que acha importante, senão o ator fica maluco. Eu assisti tudo, mesmo sem ter a intenção de imitar o ator de alguma outra cena. O interessante é pegar a referência e colocar do nosso jeito. É essa a originalidade, pegar uma coisa boa e fazer do seu jeito. Para mim, está sendo um processo bem difícil, porque é um personagem muito distante de mim. Só fiz mocinhos até agora, então nas preparações é preciso ter uma energia certa, para entrar rápido no personagem na hora do “Ação” e sair rápido na hora do “Corta”."

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    Da TV ao cinema

    Nicolas Prattes: "Eu sempre quis fazer cinema. Quando estava gravando Malhação, com 17 anos, perguntavam os meus planos de carreira e eu falava que queria fazer cinema. Agora, realmente, fui picado pelo bichinho do cinema. É outra relação de equipe-ator, diretor-ator… Tem muita boa vontade. Tudo é feito e calculado milimetricamente para uma cena e se você errou você faz de novo. Antes eu era criado nos moldes da televisão, com aquela coisa de gravar 35, 38 cenas por dia. Eu já gravei 43 cenas num dia, das onze da manhã até as nove da noite. Então eu chego aqui e, de repente, são seis cenas para gravar".

    Humanizar um assassino

    Nicolas Prattes: "Todo o filme é construído pela visão do Davi. Eu não sei se quero que o público torça por ele, o principal é entender o porquê de ele estar fazendo isso. Entender o passado dele, o que aconteceu quando ele tinha sete anos de idade, que é quando a pessoa está formando o caráter, a personalidade. Tem a questão do meio em que ele foi inserido, a relação dele com as pessoas que estavam perto dele, o carinho que ele recebia das pessoas ou não. Isso está muito bem escrito e explicado no roteiro".

    Diego Freitas: "Essa é a moral da história. Eu quis abordar nesse filme, principalmente, como o entorno influencia o indivíduo e como os monstros surgem. Um monstro não surge sozinho. A gente se inspirou muito e aprendeu com Breaking Bad, que é uma das melhores séries de todos os tempos. É impressionante como você fica do lado do cara, por mais barbaridades que ele faça. Existe a empatia com o personagem, o que é diferente de concordar com o que ele faz. É você se ver no lugar dele. Todo mundo tem esse lado negro também".

    Um trabalho conjunto

    Diego Freitas: "O supervisor de efeitos, o Fabrício Rabachim, opina para caramba, porque esse filme tem muitos efeitos especiais. Eu adoro filmes grandes, e mesmo sem dinheiro para fazer um filme grande, a gente tenta fazer no quarto de casa. Mas esse filme é uma obra coletiva. Quando você escreve uma história, pensa no projeto dos seus sonhos, e de repente ele vira o sonho de um monte de gente. O Davi ganhou traços do ator, do fotógrafo, do diretor de arte… Ficou muito melhor. Não vou assinar como "um filme de Diego Freitas"."

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    Terror americano x terror brasileiro

    Diego Freitas: "O cinema americano é bom em tudo, porque eles fazem isso há muito tempo, de forma bastante profissional. Existem filmes para todos os gostos. A gente está no momento de diversificar a nossa produção: fazer um filme de suspense ou de terror não é mais novidade, mas precisamos de bons filmes de suspense agora. Também estamos renovando quem faz cinema no Brasil, oferecendo mais oportunidades a pessoas novas. Com a Netflix, a Internet, tudo se popularizou, então não existe desculpas para a falta de referências. Temos condição de criar, sem falar que filme de terror teoricamente é barato. Quanto mais o nosso mercado conseguir produzir, melhor vai ficar."

    Nicolas Prattes: "A gente fica pensando que o filme vai ser criticado por não ser brasileiro. Mas o que é ser brasileiro? É preciso mudar esse conceito. Talvez a história tenha afinidades com as produções americanas porque eles fazem isso há mais tempo. Se ainda não tem uma produção deste tipo aqui, então que façam, é melhor fazerem também".

    Diego Freitas: "O filme está sendo feito em São Paulo, no inverno, no centro. Não estou preso a uma estética que o cinema brasileiro tradicionalmente faz. Não sei se vão chamar o filme de americano demais. O Rastro recebeu críticas do tipo. Acho bizarro quando a galera fala que a fotografia é bem cuidada demais. Por que eu tenho que fazer uma fotografia que não é clássica, por que eu tenho que fazer câmera na mão o tempo todo? Só porque temos esta tradição?

    O cinema de horror brasileiro já foi e é muito famoso no mundo inteiro. Com o Mojica, por exemplo. A galera consome Stranger Things, e filmes não americanos como Boa Noite, Mamãe e Sob as Sombras. Não é questão de ser americano ou não, é ser feito com cuidado. Então vamos fazer com cuidado".

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