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    Festival Guarnicê 2017: Competição termina com meme local e sucessos de João Silva, parceiro de Luiz Gonzaga

    Danado de Bom joga para público em noite de aplausos "em cena aberta" durante a exibição do curta Demônia.

    “Espero que vocês saiam com as músicas na cabeça e apaixonados por João Silva”, desejou a produtora Roberta Jansen, representante do longa Danado de Bom. Dito e feito. O derradeiro concorrente da mostra competitiva do Guarnicê, vencedor do Cine PE 2016, fez o (infelizmente pequeno) público cantarolar hits como "Pagode Russo" e "Nem Se Despediu de Mim" ao fim de uma noite que começou pesada com o curta Stanley. O clima leve que predominaria, no entanto, já apareceu na segunda produção, o fofo O Voo, que abriu caminho e sorrisos para o ponto alto da sessão, o divertido Demônia – Melodrama em 3 Atos, inspirado numa moradora de São Luís.

    Stanley, de Paulo Roberto – Estreia do diretor em ficção, o filme aborda o homossexualismo masculino no sertão da Paraíba fazendo uso do impacto desde o primeiro minuto. A recorrência de galinhas mortas, porém, pode ser interpretada como um símbolo de extremo mau gosto do tema do curta, que por outro lado caracteriza muito bem o condutor da trama e tem uma sequência sensual que evoca um grande momento de E Sua Mãe Também.  Paulo é feliz na captura da sedução e sua evolução para o sexo explícito, no entanto a trama é conduzida pelo som e a dificuldade de entendimento do principal diálogo da trama (em parte pela projeção, em parte pela captação) impossibilitou o público do Guarnicê de compreender a obra em sua totalidade.

    O Voo, de Manoela Ziggiatti – Filmando com o celular seu filho de três anos, Vitor, a montadora de Sinfonia da Necrópole encontrou um bonitinho retrato da formação da racionalidade de uma criança. Com capa e tudo, ele diz que pode voar e precisa reencontrar os amigos do prédio azul, mas os questionamentos da mãe o levam a repensar sua certeza, chegando ao medo da queda e da consequente morte. Gera enorme apreensão em quem não pode ver crianças brincando com o perigo.

    Demônia – Melodrama em 3 Atos, de Cainan Baladez e Fernanda Chicolet – Impecável tecnicamente – e particularmente espetacular no sensacional Ato III –, Demônia é inspirado no vídeo Socorro Feirante, registro de reportagem policial feita em São Luís sobre uma feirante do bairro da Divinéia que foi parar na delegacia após brigar com a amante do marido. As frases ditas pela vendedora de plantas eram tão incríveis que foram transformadas em música por Yanescudo e assim Socorro ficou ainda mais famosa na internet. Tão logo identificou na tela as palavras da crente traída, o público maranhense desatou a gargalhar, reação que tomou inteiramente a sala na parte do clipe musical – e foi também nesse ato que a galera não aguentou esperar até o final e aplaudiu a hilária referência ao presidente Michel Temer. Cainan e Fernanda se basearam de materiais originalmente muito bons, é verdade, mas souberam ir além, efetuando mudanças inteligentes na história e criando prólogo e epílogo que se encaixam perfeitamente. Aguardada pelos realizadores, Socorro não apareceu na sessão.

    Danado de Bom, de Deby Brennand – João Silva, o “famoso que ninguém conhece”, como descreveu a produtora antes da exibição, criou obras maravilhosas do cancioneiro brasileiro, cheias de personalidade nordestina. Parceiro e produtor de Luiz Gonzaga e ele mesmo cantor, não tem seu nome ou rosto reconhecidos pelo grande público, que certamente sabe cantar pelo menos uma de suas canções. O filme de Deby busca fazer essa ponte e, ancorado principalmente no carisma do orgulhosamente pernambucano João e nos momentos musicais, consegue cumprir seu papel, apesar dos problemas. Produzido em quatro etapas (2007, 2011, 2013 e 2015), o longa parece uma colagem e tem na falta de uniformidade sua principal falha. No começo Deby usa uma narração cheia de lirismo por Siba, joga as músicas como lyric vídeos para contagiar os espectadores e usa bastante a imagem de Gonzagão. Tudo isso, no entanto, é abandonado conforme a história avança, contada cronologicamente – o que também não se mantém até o final – pelo próprio protagonista. Ele é ótimo descrevendo o primeiro encontro com o ídolo que se tornaria amigo, explicando a composição de "Nem se Despediu de Mim" e fazendo autocrítica pela falta de profissionalismo causada pela bebida, mas sua vida amorosa, abordada por vários minutos, não é na verdade tão relevante para a proposta quanto seus discos, por exemplo, mostrados brevemente. Após praticamente uma hora de documentário musical dentro do formato padrão e entrevistas filmadas sem  esmero, o público é surpreendido por belos registros em 16 mm de João revisitando a terra de onde saiu, Arcoverde. A solar poesia, tão presente nas obras do compositor, faz falta no longa.

    Os vencedores da edição de aniversário de 40 anos do Festival Guarnicê serão anunciados na noite deste sábado. Lamparina da Aurora é o franco favorito entre os longas, mas entre os curtas o prognóstico é mais complicado por conta dos vários destaques – principalmente entre as animações.

    AdoroCinema viajou a convite do Festival Guarnicê.

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