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    Exclusivo: Diretor de De Onde Eu Te Vejo revela já ter pagado para assistirem a filme seu

    Um papo sincero com o cineasta Luiz Villaça e a atriz Denise Fraga que, casados há mais de duas décadas, estão em cataz com novo longa.

    Andrea Testoni

    Qualquer semelhança com a realidade... é mera coincidência mesmo. De Onde Eu Te Vejo, projeto gestado há cinco anos pelo diretor Luiz Villaça e a atriz Denise Fraga, traz um casal de meia-idade que decide se separar, no mesmo momento em que a filha está de mudança para o interior, ingressando na faculdade. Não foi da própria experiência, portanto, que a dupla Fraga-Villaça, responsável por um dos casamentos mais longevos do meio artístico nacional –  com mais de 20 anos de união –, tirou a inspiração para fazer o filme que acaba de chegar aos cinemas brasileiros.

     

    Andrea Testoni

    “Essa história é zero autobiográfica, mas ela tem tudo a ver com a minha geração. Não existe mais o tabu da separação”, observa o cineasta, de 50 anos, autor também do roteiro – coescrito com Leonardo Moreira e Rafael Gomes. “Como detectar a hora de se separar? E como transformar isso numa relação [de amizade]?”, a atriz complementa, quase que num jogral –  embora a redação do AdoroCinema tenha conversado separadamente por telefone com os dois.

    Não é que Denise não tenha nada da sua Ana Lucia, que interpreta no longa: “ela é uma mulher que tem mania de querer novidades. E eu sou uma pessoa bastante inquieta”, confessa, complementando que, para ela, o mote do filme é (ou também pode ser): “a busca pela felicidade que vira quase um estresse, da pessoa louca para ser feliz”.

    Assim é Ana. Depois de duas décadas de casamento, a arquiteta decide que falta alguma coisa. Ou sobra. Ela, então, decide “descartar” o marido, Fábio (papel de Domingos Montagner) que, por uma questão prática, se muda para o apartamento em frente ao dela. O jornalista simplesmente acata a decisão, sem, no entanto, se “desgarrar”. E os dois tentam manter um relacionamento minimamente cordial.  

    Buchecha sem Claudinho.

    O conflito central, que tinha tudo para ser um dramalhão daqueles, nas mãos do casal resulta em um relato leve e, ao mesmo tempo, tocante, de um público – ou situação – que não costuma se ver representado na cinematografia brasileira. Como avião sem asa, fogueira sem brasa, futebol sem bola ou Piu-Piu sem Frajola (Luiz sem Denise?) é o drama sem comédia na história profissional desses dois.

    Alexandre Ermel

    “O Luiz tem uma coisa, que ele não sossega enquanto não aprofunda. Eu sabia que, nas mãos dele, essa comédia romântica não seria uma comédia romântica. O filme tem humor, mas também nos leva para outras profundezas”, se derrete ela, para quem o riso é um poderoso agente de reflexão. “Todos os nossos trabalham passam por essa crônica do cotidiano. Desde o ‘Retrato Falado’, 3 Teresas, Vizinhos, é tudo muito ali, copa e cozinha. De um detalhe você tira um filme”.

    Apesar do “nicho”, ela garante que a trama é acessível a todo tipo de público – principalmente depois de ter visto um garoto de 18 anos aos prantos no final de uma das primeiras exibições.

    De uma forma mais abrangente, ela explica o método: “é como se a gente tivesse um grande espelho na mão – no meu caso um espelho meio velhinho, enferrujado – e o virasse para a plateia: ‘olha como nós somos ridículos’”. “A arte faz você compreender a imperfeição humana, se ampliar para ser mais complacente”. E brinca: “A lucidez não nos livra do drama. Mas quem lê Dostoievsky e Fernando Pessoa sofre mais bonito”.

    Sorria, você está sendo filmado.

    A observação do cotidiano é quase uma obsessão dos dois. Se você mora em Higienópolis, bairro da região central de São Paulo, cuidado, você pode estar sendo filmado: “eu adoro ficar olhando pela janela da minha casa. Às oito da noite, é um prato cheio”, se diverte Denise, carioca radicada na capital paulista lá se vão 25 anos – e que não hesita em pôr os óculos escuro, boné, e sair rodopiando por aí (repare na Paulista, no Elevado Costa e Silva e na Avenida São João).

    Eduardo Martino

    A capital financeira do país, aliás, entra na história quase como num ménage com Ana e Fábio. “São Paulo é um personagem do filme: a questão da dinâmica da cidade, sobe prédio, cai casa, a cantina vira estacionamento. Existe uma vibração do dia a dia agindo sobre a cidade e há um paralelo do tempo agindo sobre a vida do casal”, adianta o diretor: “a ideia do filme vem da vontade de contar uma história de amor através da separação, fazendo o paralelo com a dinâmica de uma cidade”.

    Ela completa (olha o jogral aí): “a gente não consegue segurar a cidade de são Paulo, com suas demolições, sua rapidez. Ao mesmo tempo, num casamento, a gente não consegue manter as coisas como são”.

    Curiosamente, De Onde Eu Te Vejo foi praticamente todo filmado em estúdio – pelo menos a (boa) parte que se passa nos apartamentos. “A gente teria que ficar um mês e meio com dois prédios invadidos, mais uma rua no meio; teria que segurar [a rua] por conta de trânsito, som, buzina e tudo mais, e concluímos que seria inviável”, ele conta. Por isso, a equipe manteve um espaço de 16 metros entre uma construção e outra, para completar tudo depois na pós-produção. “Essa é a magia do cinema mesmo, tinha horas que nem eu acreditava”, confessa. Confira:

    De Onde Eu Te Vejo Vs Batman Vs Superman (Vs Mulher Maravilha).

    Experiente, a dupla tem consciência de que, a depender do desempenho do filme no primeiro fim de semana, pode ser que São Paulo (Sorocaba, Salvador, Santarém ou qualquer outra cidade do Brasil, comece ela ou não com a letra “s”) não terá uma segunda chance para assistir à obra.

    Alexandre Ermel

    “Em toda entrevista eu falo: ‘vamos assistir nos primeiros quatro dias, para a gente poder virar uma semana, lutando contra o Super-Homem, o Batman e a Mulher-Maravilha”, apela Luiz, que acredita que não é por falta de diversidade que o cinema brasileiro apanha de Hollywood (como exemplos recentes de produções tupiniquim de qualidade que fogem do padrão comédia-televisiva-campeã-de-bilheteria, ele cita Tudo que Aprendemos Juntos, Califórnia e Mundo Cão).

    “A vontade que dá é sair por aí com uma Kombi, gritando: ‘por favor, entrem no cinema e assistam ao filme! Eu fiz para vocês!”, brinca. Brinca mesmo? Villaça confessa que, quando lançou seu primeiro longa, Por Trás do Pano (1999), fazia plantão na porta dos cinemas e chegava a pagar, com a melhor das intenções, para que as pessoas assistissem. Ele reproduz o diálogo: “’Você quer assistir?’, ‘Ah, mas eu não tenho dinheiro’, ‘Eu te pago’. Tamanha a vontade de você fazer a coisa acontecer”.

    De Onde Eu Te Vejo está em cartaz (ainda no primeiro fim de semana) nas melhores casas do ramo.

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