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    Exclusivo: Vinícius Coimbra fala sobre Shakespeare, suspense e Ana Paula Arósio em A Floresta que se Move

    O diretor adaptou a peça Macbeth com Ana Paula Arósio e Gabriel Braga Nunes nos papéis principais.

    Graça Paes / Photo Rio News

    Chega aos cinemas dia 5 de novembro um projeto ousado do diretor Vinícius Coimbra: A Floresta que se Move, adaptação da peça Macbeth, de Shakespeare. Gabriel Braga Nunes interpreta o papel principal do vice-presidente de um banco, que arquiteta com a sua esposa (Ana Paula Arósio) um crime para assumir o cargo mais alto da empresa. 

    O filme combina diálogos antigos com cenários modernos, cenas clássicas do teatro com momentos de fantasia criados pelo diretor. Segundo Coimbra, esta é uma análise da "fragilidade do caráter humano", ou seja, qualquer um estaria sujeito à sede pelo poder... Confira a nossa conversa exclusiva durante o Festival do Rio 2015:

    De onde surgiu a ideia de levar Shakespeare ao mundo empresarial?

    Antes de tudo, nasceu a ideia de levar Shakespeare a algum lugar. Eu tenho um fascínio pela obra dele, e acredito que seja uma obra que caberia em outras épocas. As críticas que ele levanta e as observações dele são atemporais. Aí eu tive essa ideia, uns seis anos atrás. Mas o desejo era adaptar para os tempos de hoje.

    Como foi o processo de adaptação do texto clássico?

    Eu fazia questão que não fosse um filme muito realista. Quis manter algumas frases teatrais, e escolher locações que a gente não identifique muito bem onde se passam. Nosso objetivo era criar um tom surrealista. Com o elenco reunido, começamos a estudar bastante, tanto os princípios da história quanto as motivações dos personagens. Não queria colocar toda a responsabilidade na ambição deles, ou no fato de terem perdido o filho, o importante era centrar a questão na fragilidade do caráter humano, que é a questão principal para Shakespeare: como podemos ser influenciados, levados às últimas consequências.

    Então a sede pelo poder poderia acontecer com qualquer um?

    Ela já acontece com qualquer um, basta ver as atrocidades por aí. Quem nos diz que o avião do Eduardo Campos não foi sabotado? Ou o carro do Juscelino? As coisas acontecem mesmo. O cara que julgou as contas da Dilma, por exemplo, foi acusado de morte...

    Como escolheu o seu elenco?

    Busquei pessoas que pudessem proferir essas palavras teatrais com propriedade. Alguns atores não têm experiência teatral, então essas palavras ficam quadradas na boca deles. Por isso, peguei atores que tinham experiência em teatro, e que poderiam levar a história a esse lugar acima da realidade. A Ana Paula Arósio tem muita intuição, o Gabriel Braga Nunes tem um olhar muito instigado. O Nelson Xavier e o Ângelo Antônio são monstros, eles pegam esses personagens muito complexos e entregam o que é preciso entregar.

    Com um texto tão preciso, vocês devem ter organizado longos ensaios.

    Sim, eu trabalho com vários ensaios. Sou muito específico no que quero, no que espero de cada cena. Mas o ensaio não pode engessar a realização: ele tem que ser uma grande preparação para, na hora de filmar, pular do trampolim. Mesmo assim, sempre gosto de ouvir muito os atores têm a dizer. Não sou um cara rígido.

    O público do festival do Rio estava discutindo muito as cenas fantásticas, como as formigas ou o sangue no teto. Como chegou ao tom de fantasia?

    Tem uma cena que é determinante no filme para isso: é quando o personagem do Gabriel Braga Nunes vê o personagem do Ângelo Antônio morto. Neste momento, o filme sai de um lugar e abre portas para um realismo fantástico, com alucinações. Tirando a cena da chuva de sangue, as outras estão na peça original. Foi necessário ter um pouco de criatividade, pensar como representar a floresta que caminha. Quis levar o filme para os detalhes: a personagem suja o dedo com uma gota de sangue, temos pequenas formigas... Na peça original, ela suja as duas mãos, mas eu achei que uma gota seria suficiente. Para fazer a floresta andar, pensei no detalhe das formigas. É algo pequeno que simboliza outra coisa muito grande.

    Na apresentação do filme, você disse que estava contente por trazer um filme nacional que não fosse comédia. Como enxerga a situação das comédias nacionais hoje em dia?

    Esse é um problema crônico do cinema brasileiro. Desde a Atlântida, o brasileiro gosta de comédia. É curioso, porque o brasileiro confia na qualidade das produções dramáticas para a televisão, mas não confia na qualidade dos dramas para o cinema. Existe um trabalho de longo prazo para convencer o público de que vale a pena comprar ingresso para um drama ou um suspense. Por enquanto, não existe confiança. É importante também pensar no drama que se faz: ele precisa entreter o público, além de entreter a si mesmo. Afinal, o cinema brasileiro é feito com o dinheiro do povo, por isso tenho a utopia de que o povo deve retornar.

    O suspense, em especial, parece ter crescido, com boas produções como O Lobo Atrás da Porta, ou mesmo O Som ao Redor.

    É um olhar atento ao que faz sucesso. No Brasil, temos as comédias, os blockbusters de ação, mas os filmes de terror e suspense também estão conquistando o público. Se você consegue combinar um conteúdo artístico com a embalagem de suspense, para que a pessoa fique intrigada, isso vale como chamariz.

    Você é um diretor prolífico, com vários projetos nos últimos anos. Como vê a dificuldade de produzir e distribuir os filmes nacionais atualmente?

    É difícil. O produtor e o distribuidor não ditam o que vai ser produzido. É o público que escolhe, eles apenas estão antenados no que o público quer ver. Você pega um projeto como A Floresta que Se Move, que exige certo nível de produção, e nem sempre o produtor acredita nesse formato. Ele vai querer apostar na comédia, porque é mais fácil ter retorno. É difícil ter ideais para além do ideal comercial hoje em dia. Eu nem tenho conseguido produzir tanto assim, não me acho tão prolífico assim! Mas vou tentar fazer uma comédia agora, para não ficar tanto tempo sem filmar. Vou ver se, depois de duas comédias, consigo fazer um drama. A primeira comédia é a adaptação de uma peça do Aderbal Freire Filho e do Nilton Moreno, que se chama Jacinta, que tinha a Andréa Beltrão estrelando no teatro. A outra comédia está sendo escrita pela minha esposa, Priscila Steinman. É uma pegada mais contemporânea.

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