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    Exclusivo: "Boa parte das reivindicações de saúde e educação eram propostas do governo de Jango", diz o diretor Paulo Henrique Fontenelle

    Diretor de Dossiê Jango, que estreia nos cinemas em 5 de julho, conversou com o AdoroCinema.

    por Francisco Russo

    Quase 40 anos depois, o falecimento do ex-presidente João Goulart ainda é cercado de mistério. Este é um dos temas abordados por Dossiê Jango, novo documentário dirigido por Paulo Henrique Fontenelle, que chega aos cinemas nacionais em 5 de julho. O AdoroCinema teve uma conversa exclusiva com o diretor, na qual ele falou sobre as dificuldades enfrentadas para tirar o projeto do papel e ainda sobre como o filme se relaciona com as manifestações populares que têm acontecido no Brasil nas últimas semanas. O resultado você confere logo abaixo. Boa leitura!

    AdoroCinema: Você rodou um documentário sobre um músico, Loki, Arnaldo Baptista, e agora fez um voltado para o lado político. Como nasceu o interesse em fazer um documentário sobre política e, mais especificamente, sobre João Goulart?

    Paulo Henrique Fontenelle: Na verdade nasceu a partir de um argumento do Paulo Mendonça e do Roberto Farias, que são donos do Canal Brasil, onde trabalho. Eles queriam fazer um filme de ficção sobre o período em que João Goulart esteve no exílio, então acompanhei algumas entrevistas que fizeram com pessoas próximas a ele. Durante estas pesquisas é que percebi que era possível fazer um filme sobre o possível assassinato do João Goulart. Fui pesquisar esta história e fiquei três anos levantando arquivos e pessoas relacionadas.

    AC: Algo que chama bastante a atenção é este trabalho de pesquisa, especialmente em relação ao material histórico. Como foi esta busca sobre o que poderia entrar no filme?

    Paulo: Tive muito apoio do Instituto João Goulart e do Movimento de Justiça e Direitos Humanos de Porto Alegre, que nos cederam muitos documentos e pesquisaram os áudios junto ao governo americano. Tive também acesso a arquivos do FMI, da CIA, da polícia uruguaia... Muitas pessoas nos ajudaram para que pudéssemos montar este painel o mais completo possível, que até então estava bem escondido. Uma dificuldade que enfrentamos foi a inexistência de uma biografia. Tinha um livro do Carlos Heitor Cony, mas tirando isso não havia quase nada escrito sobre isso. Nosso filme na verdade foi uma investigação, cada vez que a gente fazia era uma nova descoberta que levava a outra entrevista.

    AC: O quanto esta investigação acabou norteando o filme? A intenção inicial era apenas focar o lado histórico do João Goulart ou seguir este caminho mesmo?

    Paulo: O foco inicial era falar da morte do João Goulart, mas aí inconscientemente ele foi mudando um pouco. Uma das primeiras entrevistas que fizemos foi com o Barreiro Neiva, que está preso no Uruguai e é um ex-agente secreto que diz que participou do possível assassinato do João Goulart. Depois é que vimos que ele era apenas mais uma pequena ponta do iceberg que foi esta conspiração. Então o tema ia mudando à medida que íamos fazendo.

    AC: Você comentou que o Instituto João Goulart ajudou bastante e ele é um dos coprodutores do filme. Além disto, o João Vicente Goulart, filho do João Goulart, participa bastante do documentário, especialmente na parte mais investigativa. Como foi contar com a ajuda do João ao fazer o filme?

    Paulo: O João lida com esta história há mais de 15 anos, então o primeiro contato que tive foi com ele. Foi o João quem me apresentou o Barreiro e começou a ceder documentos que fez com que mudasse o foco do filme. É o cara que mais sabe sobre o assunto, já há cinco anos vinha tentando conseguir a exumação do corpo e só agora conseguiu.

    AC: Um filme que é referência sobre o assunto é Jango, dirigido por Silvio Tendler. Você chegou a se inspirar nele ou preferiu se afastar para fazer o seu filme?

    Paulo: Já tinha visto o filme algum tempo atrás, mas quando fui fazer Dossiê Jango procurei me afastar dele. São óticas diferentes sobre o mesmo personagem. Jango fala mais sobre a carreira política do João Goulart e a deposição dele no golpe militar, enquanto que o nosso até fala disto no começo do filme, mas depois parte para o exílio, algo que pouca gente falou. E principalmente sobre a morte dele e todos os mistérios que a ronda. Sempre procurei também buscar mais o lado humano do que o político do Jango.

    AC: Dossiê Jango acompanha a vida de um político muito popular em sua época e hoje vivemos um período em que as pessoas vão às ruas para protestar contra os políticos. Existe um contraste nítido, de época e de perfil dos políticos. De que forma você acha que o seu filme possa dialogar com esta geração que está protestando contra a situação atual?

    Paulo: O que acho interessante destes protestos de atualmente é que boa parte das reivindicações, como em relação à saúde e educação, eram propostas de governo do Jango, há 50 anos atrás. Vejo o pessoal na rua com muita alegria, exercendo a democracia, mas vejo também o quanto o país esteve parado por causa do golpe. Então é possível ver o quanto as propostas ainda são atuais.

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