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    O Protetor: Capítulo Final
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    O Protetor: Capítulo Final

    Denzel Washington encerra trilogia com propósito

    por Diego Souza Carlos

    É curioso observar que, em mais de quarenta anos de carreira e créditos em cerca de 62 projetos audiovisuaisDenzel Washington tenha feito parte de apenas uma única trilogia. Emprestando seu rosto, corpo e determinação para diversos filmes de ação ao longo dos anos, o ator encontrou em O Protetor uma justificativa para contar uma longa e melancólica história - narrativa esta que chega ao fim em Capítulo Final, terceiro e último longa da franquia.

    Entre tantas sequências, reboots, remakes e revivals, chega a ser apaziguante o fato de que a nova trama conduzida pelo diretor Antoine Fuqua, cineasta responsável por apresentar as aventuras de Robert McCall nas telonas, não seja apenas mais um daqueles caça-níqueis.

    Desde que desistiu de sua vida como assassino trabalhando para o governo, Robert McCall (Denzel Washington) tem dificuldades para se reconciliar com as coisas horríveis que fez em seu passado, e encontra um estranho conforto em trazer à justiça aos oprimidos.

    Após encontrar um lar inesperado no sul da Itália, ele descobre que seus novos amigos vivem sob o controle dos chefes do crime organizado do local. Assim que os eventos se desdobram para acontecimentos mortais, McCall sabe o que precisa fazer: se tornar um protetor para seus amigos e enfrentar a máfia.

    Quem é o protetor no Capítulo Final?

    Os primeiros minutos de O Protetor 3 estão rodeados por uma névoa confusa de acontecimentos e muita violência, algo que pode prejudicar o telespectador em fincar seus pés na trama. Apesar da montagem de todo o filme soar um bocado preguiçosa, com a ausência de uma liga entre as passagens de tempo e uso excessivo de transições simples entre acontecimentos, os olhos do público dificilmente se desviarão do protagonista calado e misterioso.

    Chega a ser extraordinário como Washington consegue magnetizar a audiência sem grandes falas. O deslumbre da audiência também deve se ater ao cenário: distante da urbanização desenfreada de Boston e Massachusetts, aqui McCall se estabelece no sul da Itália.

    A chegada do protagonista ao local onde se passa a maior parte do filme é carregada por dúvidas. Por que? Quando? Onde? Porém, algo que Fuqua e Washington querem que você perceba é o quão exausto e fragilizado ele está. Em meio a tantos filmes com longevas estrelas de cinema que se dizem duronas até o fim, existe coragem em retratar o envelhecimento do herói dessa forma.

    Este sintoma latente de toda a história é, sim, um lembrete de que isso se trata de uma despedida. Mesmo que existam sequências um tanto embaraçosas - vide o ato inicial em que Denzel toma um susto após trucidar uma horda de assassinos (uma cena supostamente séria) - a exibição a céu aberto de suas fraquezas o torna mais humano e mortal.

    Nesta toada de mostrar as dores de Robert (ou Roberto para os moradores da região), há tempo também para acompanhar a sua nova rotina. Um ponto muito bem-vindo quando somado à atmosfera de Capítulo Final, já que aos poucos as pessoas devem se identificar com cada indivíduo que compõe esta cidadezinha. São nestes momentos em que outra temática do longa brilha: cria-se um senso de comunidade importante não só para o personagem-título (afinal, ele precisa proteger algo ou alguém), mas faz sentido costurar essa simpatia para que os efeitos futuros do filme sejam sentidos, um a um.

    A presença de Dakota Fanning fará muitos fãs de longa data se sentirem em casa com o reencontro dos atores em cena após quase vinte anos, com a lembrança de Chamas da Vingança. Apesar de funcionar como uma ligação entre os micro e macro acontecimentos da narrativa (é sempre necessário colocar algo na escala global?), ela também está ali para expandir os significados do protagonista. Dentre as demais atuações, pode-se dizer que Remo Girone, Eugenio Mastrandrea, Gaia ScodellaroDaniele PerroneAndrea Scarduzio enriquecem O Protetor 3 com bem-vindas contribuições à narrativa.

    Prenúncio de tempestade sob boas escolhas técnicas

    Assim como nas passagens enigmáticas da segunda temporada de The White Lotus, que se passa na Sicília, Itália, o diretor de fotografia Robert Richardson, de Kill Bill - Volume 1 e Bastardos Inglórios, aproveita cada canto da região para criar uma ambientação crível. Existe um cuidado na direção destas cenas contemplativas que dá importantes respiros para a condução da trama.

    Outra constância nas duas horas de filme é uma ótima mixagem de som. Os elementos sonoros ajudam a compor cada passo desta melancólica história. Enquanto Robert tenta criar uma nova vida no interior da Itália, o prenúncio de tempos tenebrosos é cadenciado pelo ritmo e pela atenção ao som. O mar, os barulhos que rodeiam as docas, as aves, o motor furioso das motos ao fundo e o vento são sentidos durante boa parte da película. Não se trata apenas de ambientação, trata-se também de construir um espaço, de guiar o crescimento da tensão que culminará em desfechos amargos.

    A trilha sonora funciona muito bem, mas ela carece de apreço. Canções e faixas são tocadas em diferentes momentos. Do uso diegético de músicas que perfumam os restaurantes e bares até as batidas frenéticas que determinam de forma bem clara quem são os grandes vilões da vez.

    Caso parte da audiência tenha assistido a Homem-Aranha: Através do Aranhaverso, outra produção da Sony Pictures, e As Tartarugas Ninja: Caos Mutante, é muito provável que observem um tipo de trilha específica para antagonistas, com beats eletrônicos guiados por guitarras secas - um tipo de escolha que chega a dar um pitada de terror para qualquer sequência. Inclusive, o gênero pode ser sentido em determinados pontos do filme. A “batalha final”, por exemplo, privilegia muito a escuridão e a aura quase sobrenatural do protagonista. É um flerte interessante e gore com o lado sombrio da trama.

    Chegou o momento de aposentar O Protetor?

    Para os fãs que esperam ver um filme guiado apenas pela ação, sinto lhes informar de que O Protetor 3 não é feito apenas de pancadaria. No entanto, erra quem acredita que isso é um demérito. Capítulo Final faz o bom uso da vibração de Robert McCall, já que toda essa construção dos novos cenários justifica cada ato do protagonista. Sabe aquele papo de que menos é mais? Então, isso funciona muito bem aqui.

    Existem alguns trechos específicos em que Denzel Washington mostra na tela, com certa classe e coreografias bem aproveitadas, porque o seu protagonista ganha o título de O Protetor. São movimentos singelos em alguns casos, como atacar um capanga apenas segurando determinada artéria deixando o inimigo imóvel diante da dor. Já em outras ocasiões, Robert fura olhos, atira apenas por diversão e mostra como foi corrompido por todos esses anos de matança. Essa degradação do homem é contrastada o tempo todo com a religiosidade - elemento persistente da trama.

    Assim como outros icônicos personagens que passaram anos cumprindo missões que minaram suas humanidades, o olhar vazio do ex-agente de operações especiais não nega sua exaustão em encarar um mundo corrupto e, por muitas vezes, frio e vazio. A existência de pessoas que lhe mostrem que a vida pode ser mais do que isso, assim como a existência de indivíduos engajados em continuar o seu trabalho de certa forma, exibem a esperança de o calor da vida ainda o habita.

    O Capítulo Final justifica a própria existência em dar ao seu herói uma nova chance de redenção. Isso acontece através de chacinas e um bocado de justiça com as próprias mãos? Sim. Entretanto, de nada valeria a sua empreitada se não estivesse pronto para, enfim, tentar recomeçar ao lado de pessoas que lhe dão um novo propósito. E como é bom ter um verdadeiro propósito no meio do caos, não é mesmo?

     

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