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    Fim de Festa
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    Fim de Festa

    Todo carnaval tem seu fim

    por Pablo Miyazawa

    O Brasil está de ressaca, mas a festa pode e deve continuar. É esta a mensagem nas entrelinhas de Fim de Festa, que bem poderia ser descrito como um filme de carnaval, ainda que sua trama se inicie na tarde da quarta-feira de cinzas -- conforme o título entrega, no exato momento em que a "festa termina". 

    Nesse sentido, o longa do pernambucano Hilton Lacerda (do premiado Tatuagem) alcança os cinemas brasileiros na hora perfeita: justo na semana pós-Carnaval, teoricamente quando o país começa a funcionar para valer, aos trancos e barrancos, entre dores de cabeça, paladares amargos e arrependimentos. Contada em um período de cinco dias seguidos, a história gira em torno da investigação de um crime bárbaro – uma turista francesa foi assassinada, asfixiada em meio ao êxtase de uma festa de rua em Recife. Não há testemunhas e todos parecem suspeitos.

    Fim de Festa pode ser lido como um filme policial, mas é mais do que isso. Também é uma alegoria precisa das contradições do Brasil de hoje, com suas intolerâncias irracionais, diferenças repugnantes e abismos intransponíveis. É também uma estimulante colcha de retalhos humana costurada com personagens coloridos e interessantes. Na linha de frente está o ótimo Irandhir Santos, muito à vontade no papel de Breno, o investigador experiente designado para solucionar o caso. Escapando com elegância dos clichês comuns ao típico policial durão de bom coração, o ator equilibra energia e serenidade para criar um protagonista irresistível aos dias de hoje, tão nobre e amável quanto falível e cancelável.

    Não só as figuras humanas, mas também os diálogos brilham em Fim de Festa, e não havia como ser diferente: roteirista experimentado, Hilton Lacerda escreveu os textos de algumas dos melhores obras do cinema brasileiro recente, como Baile Perfumado, Baixio das BestasA Festa da Menina Morta, Árido Movie e Amarelo Manga, entre vários outros. Como o condutor de sua própria história, ele impõe um ritmo de urgência tranquila apropriado para que todas interações verbais soem críveis e naturais, conseguindo nos fazendo crer que tais pessoas, conversas e situações poderiam existir de fato.

    Esse equlíbrio – de ritmos, climas, emoções — é a tônica da história e das vidas de seus protagonistas. Enquanto Breno se esgota física e emocionalmente para cumprir sua missão profissional, paralelamente a vida corre plena para seu filho, Breninho (Gustavo Patriota), que apenas curte o ócio com os amigos e parece não aceitar que a folia já acabou. "Eu não sei se fiquei velho para o carnaval, ou o carnaval ficou velho para mim", o Breno pai confessa languidamente em certo momento, justificando seu descolamento da esbórnia que insiste em se arrastar até a noite de domingo. Existe um agradável clima de ressaca (literal) em Fim de Festa, daquela que atrapalha as ideias, confunde os pensamentos e faz tudo andar mais devagar, ainda que a narrativa acelerada instigue a resolução do grande mistério. 

    Filmado nas ruas de Recife com a maioria do elenco pernambucano, o vencedor do prêmio de Melhor Longa de Ficção do Festival do Rio é perfeito no que se propõe: um thriller policial sem moralismos e com pegada pop, alinhado ao zeitgeist da virada da década e narrado pelas vozes e as caras de nossos tempos. Tal como uma perfeita contradição ao seu próprio título, Fim de Festa evoca uma celebração às boas histórias que o cinema brasileiro precisa continuar a contar.

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