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    O Homem Ideal?
    Críticas AdoroCinema
    1,5
    Ruim
    O Homem Ideal?

    A mulher ideal do homem hétero

    por Sarah Lyra

    Do ponto de vista cinematográfico, O Homem Ideal? é um filme apático, incapaz de provocar grandes reações, sejam elas boas ou ruins. O aspecto que realmente chama a atenção no longa escrito, dirigido e estrelado por Carles Alberola é a necessidade de ridicularizar seu protagonista para gerar humor, ao mesmo tempo em que faz bastante esforço para recompensá-lo por sua inaptidão social. Ruben (Alberola) é um escritor e professor universitário de 52 anos, divorciado, ansioso, vivendo em uma constante crise existencial, principalmente por não se considerar interessante e talentoso o suficiente para ter uma carreira de sucesso ou conquistar uma companheira.

    O humor desta comédia consiste, basicamente, em explorar o fracasso e as inseguranças de Ruben, que, além de parecer muito ciente de sua condição desesperadora, não hesita em reforçar os clichês do homem tipicamente "perdedor". Ele coloca a música mais cafona possível em seu primeiro encontro com uma mulher, como se fosse uma trilha sonora atual e irresistível; se atrapalha com a receita do prato principal do aguardado jantar; liga para a mãe em busca de conselhos; penteia o topete para o lado na tentativa de ser cool; e finge uma gargalhada pouco antes de ser apresentado ao seu encontro às escuras para parecer menos ansioso — e como se uma não fosse o suficiente, o roteiro faz questão de repetir essa mesma fórmula três vezes. É quase admirador ver que Ruben não se mostra intimidado pelo estereótipo que se tornou, e é possível ter empatia por ele, mas, ao buscar uma redenção para o personagem principal, diante de figuras femininas muito mais interessantes, O Homem Ideal? acaba adotando uma abordagem machista ao inserir mulheres como meras respostas para a necessidade masculina.

    Enquanto Raquel (Cristina García) se vê como uma mulher que "não serve para nada" porque passou dos 40 anos, e oscila entre o marido Jaume (Alfred Picó) e Ruben na busca por aprovação, sua irmã Pilar (Rebeca Valls) é a personificação do male gaze da mulher jovem, de corpo escultural, segura de si, um símbolo de libertação sexual — note como um dos personagens se refere a ela como um diferencial por sua capacidade de ter orgasmos múltiplos, o que, obviamente, é usado para enaltecer as habilidades do homem no ato sexual — e alguém que parece viver confortavelmente da maneira mais inconsequente possível. O fato de dizer que não tem dinheiro na conta bancária, por exemplo, serve para ilustrar o desprendimento da personagem em relação à vida, o que seria perfeitamente aceitável se essa característica fosse usada para dar profundidade à personagem e não somente para retratá-la como uma aventura da qual todo homem sonha em fazer parte. Isso sem mencionar que, em um primeiro momento, Pilar parece completamente fútil. Em outro, é capaz de citar grandes nomes da literatura de cor, para o delírio do protagonista, que acredita ter encontrado a mulher perfeita.

    Momentos antes de iniciar o encontro às escuras, Ruben, com todas as suas manias e inseguranças já postas ao espectador, faz questão de dar rótulos à mulher que está prestes a conhecer, como se ele estivesse em posição muito privilegiada de poder escolher uma companhia. Ao saber que se trata de uma mulher de 50 anos, Ruben demonstra uma preocupação imediata, e os amigos se apressam em dizer que ela aparenta ter 40. Em outras cenas, ele faz piada com a condição depressiva de uma personagem e enumera todos os motivos pelos quais a companhia arranjada pelos amigos não é apropriada. É interessante também observar como o roteiro minimiza a mentira contada pelos dois homens no ato final e trata a situação como um sacrifício que fortaleceu uma bela amizade, ignorando completamente o efeito dos desdobramentos na personagem de Raquel, que tem sua autoestima ainda mais abalada pelas revelações feitas.

    Fora o caráter assumidamente machista, a produção também tem dificuldades em manter o ritmo de uma trama apoiada fortemente no texto. Por isso, a decisão de usar a sala de Ruben como cenário, em uma referência à peça teatral que inspirou o filme, não se sustenta diante de um roteiro que anda em círculos e parece não ter clareza sobre o que pretende comunicar. Embora divertido em alguns momentos, O Homem Ideal? é prejudicado por uma visão limitada de comédia, roteirização e direção, recorrendo apenas ao seu quarteto de atores para gerar qualquer tipo de identificação no espectador.

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