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    Teoria do Ímpeto
    Críticas AdoroCinema
    1,5
    Ruim
    Teoria do Ímpeto

    A fúria do silêncio

    por Barbara Demerov

    Ímpeto quer dizer força, impulso, arrebatamento. E a "teoria do ímpeto", surgida na Idade Média, afirma que para haver qualquer tipo de movimento necessita-se usar a força. O curioso é que, no filme que leva o nome deste pensamento, pouco se vê de movimento ou força. O que se vê excessivamente é a tentativa dos personagens encontrarem algo que justifique suas vontades de mudança; uma tentativa que nunca chega a se realizar de fato, pois a família apresentada através de Pedro (Adriano Barroso), Diana (Clara Maria Matos) e Adriano (Pablo Magalhães) está apenas orbitando em uma existência cujas escolhas sempre dependem um do outro, mas nunca são proferidas de forma clara.

    O que fica muito claro em Teoria do Ímpeto é o que se faz ausente. Na narrativa, a presença da mãe há muito se foi e o que restou foi apenas a frigidez de Pedro para com sua sobrinha Clara. Com a chegada abrupta de Adriano, que teve certa participação na morte da matriarca num passado que ainda não está cicatrizado, esta família disfuncional se desprende ainda mais de qualquer laço afetivo para se aproximar de uma realidade aflitiva em que os desejos de Diana teimam em ser cortados pela raiz por Pedro, e as intenções de Adriano mostram-se cada vez mais duvidosas. A repreensão do tio para que a sobrinha não viaje para um intercâmbio na Austrália mistura-se com um desejo extremamente desconfortável, aliado ao fato de procurar razões (em sua mente) para que ela fique. Um vestido inspirado no que a mãe falecida tinha, por exemplo, seria um motivo para ficar naquela casa carente de amor.

    Contudo, os elementos que o filme vai indicando, no princípio, que poderiam se transformar em um apogeu de sentimentos mal guardados e palavras não ditas, nunca vêm à tona. O silêncio é uma das grandes deficiências de Teoria do Ímpeto, pois o mesmo não é capaz de gerar contemplação ou transmitir a reflexão que as personagens estão fazendo - afinal, quase nunca sabemos o que elas podem estar pensando. O roteiro se preocupa mais em transmitir aflições ao dar o mínimo de justificativa ou embasamento do passado que tanto machucou aquelas pessoas, e isso claramente afeta o mergulho do espectador para aquela rotina calada e sofrida. A única personagem com um esboço mais construído é Clara, mas sua vontade de viajar para o exterior e sua dedicação ao inglês logo são esquecidas de uma maneira inesperada, com pequenos fragmentos de cena ou falas que ajudam minimamente a entender o que se passa em sua mente.

    A ideia de unir Clara e Adriano a fim de mostrar que a repreensão do tio não deve ser tolerada é válida, mas falta cuidado do roteiro em tornar um pouco mais elucidado as razões pelas quais os personagens chegaram até aquele ponto. Sabemos, muito por cima, que a matriarca morreu em um incêndio na mesma casa e que Adriano estava presente; também é possível entender que o tio guardou uma raiva imensa do jovem e que, também, poderia ter tido algum tipo de caso com a mãe dos sobrinhos. No cinema, é interessante transformar em símbolos e pequenas "dicas" alguns fragmentos importantes de uma história, mas em Teoria do Ímpeto esta característica é justamente o que sustenta a trama do início ao fim, não o que intensifica a imersão.

    A relação dos dois jovens também é problemática no sentido de inserir, em uma cena que destoa completamente da intenção dos personagens, um clima sexual inesperado - assim como uma mudança abrupta que afeta a rotina e confunde o espectador com relação às verdadeiras intenções de Clara. Por fim, aquele que mais entrega emoção ao longa é justamente Pedro, que em sua personalidade que transita entre a sanidade e o delírio traz outra camada à narrativa. Uma pena que isso apenas acontece nos segundos finais, onde a mesclagem destas duas características aparecem com força, indicando que sua maior vontade é apenas unir o que resta de sua família - por mais que tenha extremas dificuldade em colocar isso em prática.

    Filme visto no 23º Cine PE, em agosto de 2019.

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