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    Os Dias da Baleia
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    Os Dias da Baleia

    Juventude transviada

    por Barbara Demerov

    O olhar da diretora Catalina Arroyave Restrepo em seu filme Os Dias da Baleia é intrigante, pois o que podemos ver de ameaçador na cidade de Medellín envolvendo gangues e ameaças sob a ótica de uma jovem protagonista que vive em um bairro completamente diferente daquele que passa a maior parte de seus dias, em um centro para artistas de rua? A resposta é: não o suficiente, por mais que o entorno seja bem construído a ponto de causar interesse do espectador a acompanhar tudo isso.

    É por isso que tal escolha realmente intriga, pois o longa de Restrepo traz uma abordagem diferente dentro de um cenário que poderia ser melhor trabalhado, mas ao mesmo tempo não perde totalmente sua força por ter como foco as ações e reações de Cristina (Laura Tobón Ochoa). Se a realidade na qual a jovem está automaticamente inserida nos instiga a saber mais por falar sobre rivalidade entre artistas de ruas e a importância do espaço próprio enquanto alguém que vê a arte como um meio de expressão, por outro lado, seu olhar, que mescla o inocente com o inconsequente, não dá conta de tudo o que fica fora da tela. Quando o pensamento de que algo está faltando se sobressai ao que está sendo abordado, algo está errado.

    O contexto da rivalidade não é devidamente trabalhado através da protagonista, mas sim com os diálogos entre Cristina e seu companheiro Simon (David Escallón Orrego), que escancaram o abismo social entre ambos. Ele tem de lidar com ameaças de morte por expressar suas opiniões políticas em seus trabalhos espalhados pela cidade, enquanto ela provoca a madrasta e se esquiva da mãe quando o assunto é ir para a Europa e sair da casa do pai. O jogo de cores entre os locais apresentados (com o visual clean do apartamento de Cristina e o visual colorido e acolhedor do centro de arte urbano) também auxilia a noção de que são mundos diferentes, ainda que na mesma cidade.

    É nessa disparidade que o longa perde boa parte de sua intenção de dizer algo no sentido político, pois a própria protagonista é o contraponto. Isso mostra que a distante visão que tem de tudo aquilo, mesmo frequentando locais fora de sua zona de conforto, não deveria ser a principal - especialmente quando a história de Simon se mostra tão interessante quanto a de Cristina.

    Os Dias da Baleia ainda traz uma metáfora envolvendo o animal do título, que vai aparecendo em cenas aleatórias no meio da cidade: primeiro chegando à Medellín nadando e, por útimo, morta no meio de uma grande avenida, com todos desviando de sua grandeza física e seguindo com suas vidas. Quando Cristina decide provocar a gangue rival de Simon desenhando uma grande e bela baleia no muro que era uma espécie de lousa para ameaças reais, a personagem ainda encara tudo aquilo como uma simples brincadeira. Um ato artístico pessoal, para provar o quão transgressora e corajosa é - mesmo que isso afete a todos os artistas com quem convive.

    Cristina também chega a andar por bairros rivais para deixar sua marca, mas se assusta e se esconde com rapidez quando vê que está sendo perseguida. Ela sabe que nada do que fizer chegará a atingi-la fisicamente, mas é inevitável entender que toda ação possui uma reação. Os Dias da Baleia é realmente promissor enquanto exibe uma perspectiva exterior de conjunturas sociais e políticas, mas seu ponto alto é também seu ponto baixo: o olhar não priorizada quem é desfavorecido neste cenário, e isso certamente seria mais apropriado.

    Filme visto na 43ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, em outubro de 2019.

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