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    Humano, Espaço, Tempo e Humano
    Críticas AdoroCinema
    1,0
    Muito ruim
    Humano, Espaço, Tempo e Humano

    Pânico em alto ar

    por Barbara Demerov

    Uma alegoria bíblica com desdobramentos críticos à humanidade. Assim poderia ser resumido o novo filme de Kim Ki-duk caso este possuísse uma história concisa, que não perdesse a seriedade devido ao mal direcionamento de opiniões do diretor. Sua ideia de fazer uma crítica marcante com relação à corrupção, injustiças na política e o mau comportamento humano não acontece. Ao invés de aproveitar estes temas, o que se desenrola não é nada mais que uma "festa" cheia de crimes, misoginia, canibalismo, momentos absurdos... e nada interligado em termos cinematográficos.

    Não se sabe para onde vai o navio militar no qual dezenas de pessoas embarcam; o que se sabe apenas é que há um importante senador a bordo dentre tantos civis e que a condição do transporte não é exatamente das melhores. De imediato vemos a diferença no tratamento da tripulação para com o político, que se alimenta melhor e descansa em um compartimento separado dos demais. As pessoas começam a prestar mais atenção neste tratamento e se rebela aos poucos - e até aí a crítica do diretor é pertinente. Mas se Humano, Espaço, Tempo e Humano tem minutos iniciais interessantes, todo o restante se perde em meio a uma repetição de acontecimentos (a mesma rebeldia pela comida, por exemplo) e o mais inusitado: a tentativa de criar uma fábula que remete ao Éden.

    Dentre tantos personagens, quem se destaca além do senador é um grupo de gângster e um jovem casal. A violência gratuita começa a partir da gangue - eles usam a mulher do casal citado para estuprá-la inúmeras vezes a troco de aprovação do senador (ainda inconsciente do poder que pode ter dentro do navio) - e se estende até a inclusão da alegoria celeste, que faz com o que o navio amanheça no ar, e não no mar. Tal surpresa deixa todas as pessoas em estado de pânico imediato e a briga por alimento torna-se ainda mais grave. É aí que entram mais repetições do roteiro, com o senador usufruindo de seu cargo para passar por cima de todos, a jovem moça que busca por paz, e o restante da tripulação que sofre com o racionamento de comida.

    Para completar o clima de chacina que vai se sobressaindo acima de qualquer escolha narrativa, Humano, Espaço, Tempo e Humano ainda possui um personagem que representa algo semelhante a um deus: um idoso, mudo e recluso no próprio navio, que planta frutas e cuida de animais em toda cena que aparece. Ele acaba sendo um tutor para a moça, que se vê sozinha dentre tanta violência e vai observando o comportamento do senhor - mesmo quando este faz coisas absurdas como usar corpos de pessoas assassinadas no navio para criar adubo.

    As incoerências vão aumentando cada vez mais nesta verdadeira sequência de erros. O lógico e o ilógico se misturam e, por mais que seja possível entender o que o diretor quer passar de início, é inevitável sentir o esgotamento de sua mensagem. O que poderia ser um drama ou ao menos algo reflexivo se transforma em um terror sem medidas, que assusta justamente pela naturalidade com que tantas hostilizações acontecem. Não há a intenção de ponderar algo, apenas perturbar.

    Filme visto na 42ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, em outubro de 2018.

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