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    Casa de Antiguidades
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Casa de Antiguidades

    Forasteiro local

    por Barbara Demerov

    O primeiro longa-metragem de João Paulo Miranda Maria é a representação de questões problemáticas vistas em nosso país. O racismo, a intolerância e até mesmo o colonialismo fazem parte da narrativa de Casa de Antiguidades, que também é permeada por imagens que falam muito mais do que palavras.

    Através do poderoso personagem Cristóvão, interpretado de forma ilustre por Antônio Pitanga, o espectador é convidado a adentrar em um universo que não cabe em uma única época. Com isso, há uma mistura de elementos do passado e do futuro em um presente que, além de cruel, desvaloriza a humanidade das pessoas.

    Cristóvão é um "intruso" desde a primeira cena do longa. De uma Goiás acolhedora ao Sul impiedoso, o próprio protagonista se vê como uma figura ameaçadora a quem passa a conviver ao seu lado. Com poucos diálogos, Casa de Antiguidades vai moldando sua base a partir da introspecção de Cristóvão, que encontra na casa do título uma forma de proteção (e ao mesmo tempo de defesa). Quanto mais este círculo protetor se fecha, mais ele se vê disposto a olhar para si e para a história de seu próprio povo, seja através do gado ou do berrante que carrega consigo.

    Com o aproveitamento de símbolos e elementos que já dizem muito sem que explicações sejam feitas de forma didática, a experiência que o filme de Maria proporciona não é tão crescente quanto a de Bacurau (outro filme nacional que discute apropriação e as mazelas do Brasil), mas certamente possui uma forte mensagem acerca do valor da identidade própria.

    Em paralelo com a violência e desapreço da comunidade sulista para com Cristóvão (e vice-versa), nem mesmo as pessoas que têm potencial de construir uma aproximação mais acertada com o protagonista são capazes de fazer isso. Ele começa e termina o filme de forma solitária, mas com uma diferença: ao fim da história, ele está muito mais conectado com suas próprias raízes - por bem ou por mal. Quando Cristóvão percebe que não há saída para o ambiente repressor em que foi realocado, a única "solução" seria mergulhar no passado, num espaço quase intangível de reclusão assistida.

    Casa de Antiguidades pode introduzir a discussão sobre os efeitos do colonialismo e do preconceito enraizado de forma um tanto enigmática, mas no decorrer da trama ela passa a se solidificar com a presença da casa em si. Cristóvão, um turista em seu próprio país e um indivíduo que perde a voz diante de pessoas que mal entendem sua língua, é a personificação de um problema global -- mas aqui sob a ótica de uma pequena comunidade rural da região sul do Brasil. Isso dá um olhar intimista a algo que sabemos que existe no mundo todo, e é justamente nessa abordagem do diretor que a história ganha seu peso social e atual.

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