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    Capitão Morten e a Rainha Aranha
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    Capitão Morten e a Rainha Aranha

    Ludicidade fácil

    por Sarah Lyra

    Analisar uma animação, principalmente uma voltada para o público infantil, é sempre desafiador. Não são raras as vezes em que o caráter lúdico é empregado por realizadores — conscientemente ou não — de forma a mascarar as falhas de um projeto. Isso quase sempre acontece em situações em que a trama não consegue se sustentar por si só e acaba apelando para o carisma de seus personagens. Em Capitão Morten e a Rainha Aranha, a situação é exatamente a mesma. Apesar de afetuoso e simpático, o filme de Riho UntKaspar Jancis parece abrir mão de uma proposta elaborada e se apoia excessivamente na boa vontade do espectador em relevar suas fraquezas, enquanto vende uma ideia de diversão supostamente infantilizada. O que os diretores não entenderam, no entanto, é que até as mais simples aspirações precisam de um mínimo de aprofundamento.

    Em seus primeiros minutos de projeção, o longa apresenta um mundo rico em potencial fantástico, principalmente por conta de sua estética apurada, o domínio da técnica stop-motion e a naturalização do bizarro. Quando inicia a trajetória do personagem-título em uma realidade semelhante à nossa, mas que ao mesmo tempo tem marinheiros cavando buracos até o fundo do mar, encontros inusitados com baleias gigantes e humanos se transformando em pinguins voadores, o filme parece perfeitamente plausível, porque a estranheza é mostrada com fluidez e, principalmente, naturalidade, sem nunca precisar ser explicada. O esperado, portanto, era que essas características se tornassem o forte da narrativa, mas, ao contrário do que se imaginava, elas são rapidamente esquecidas pelos diretores, acionadas apenas quando convém.

    Isso fica claro quando Morten (voz de Ciarán Hinds), frustrado com a ausência do pai, em quem espelha seu comportamento para o sentir próximo, é reduzido ao tamanho de um inseto depois de uma máquina mágica de fumaça ser acionada por acidente e transformá-lo em uma versão em miniatura de si mesmo. O incidente serve como ponto de virada no roteiro, mas não há qualquer intenção de explorar os cenários previamente apresentados ou as consequências do protagonista estar encolhido, o que fica implícito na reação do garoto ao perceber sua nova condição. Ele não se assusta ou tenta voltar para a forma anterior — o que não seria um problema se houvesse alguma outra problemática em questão —, ele apenas se aproveita da situação para exercer a tão sonhada função de capitão de um navio — mesma profissão de seu pai —, o que se torna possível quando ele passa a habitar o barco de brinquedo que acabara de construir e precisa resgatá-lo do domínio de uma autoritária aranha.

    A partir do momento em que a tripulação é formada, com a rainha aranha e seus súditos, Morten tenta se estabelecer como a figura no comando ao frequentemente salvar seus companheiros de saqueadores e outros perigos do “mar” — que, aqui, é uma sala de estar inundada por uma torneira aberta. É divertido observar as saídas encontradas por Morten para se salvar, assim como o uso criativo dos aparelhos domésticos de que dispõe, como um ventilador de teto que, em um certo ponto, serve de base de apoio para dois personagens em fuga. No entanto, a falta de evolução temática e narrativa se torna evidente rapidamente, e a sucessão de eventos lembra histórias ambientadas em um universo em comum, mas com pouca relação entre si. O que talvez tivesse funcionado, caso fosse essa a proposta.

    Depois de muita indulgência nas aventuras de Morten em sua versão encolhida, o roteiro enfim se cansa e decide retomar a trama inicial, com o pai de Morten prestes a ser enganado por dois vilões completamente descontextualizados e cujas motivações são pouco conhecidas. Por isso, quando o protagonista precisa retornar com urgência ao seu tamanho real a fim de salvar o próprio pai, a tentativa de gerar uma sensação de perigo é neutralizada pela incoerência até então exibida. Não há uma adversidade a ser superada ou qualquer outro combustível para o desenvolvimento do enredo, o que também impede a animação de atingir um ápice narrativo.

    Capitão Morten e a Rainha Aranha abre mão da possibilidade de uma história encorpada, e até mesmo seus personagens, visualmente interessantes, não oferecem particularidades próprias da construção de uma personalidade. Nem mesmo os efeitos óbvios de se ter um pai ausente são abordados na construção de Morten. Fica claro que a intenção de Unt e Jancis era seguir um caminho fácil e sem obstáculos, ao contrário do que a natureza extraordinária do universo criado por eles, onde tudo é possível, possa sugerir.

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