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    People Power Bombshell: O Diário de Vietnam Rose
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    People Power Bombshell: O Diário de Vietnam Rose

    Não tem filme nenhum

    por Bruno Carmelo

    Imagens granuladas, uma possível casa noturna, diálogos incompreensíveis. Algumas pessoas caminham, mas não se sabe muito bem quem são, para onde vão, o que querem. Os efeitos de riscos na película e outras ranhuras são tão fortes que mal se enxerga o que existe por trás. “O que está acontecendo?”, podemos nos perguntar. A dúvida persiste ao longo de toda a duração de People Power Bombshell - O Diário de Vietnam Rose.

    Os trechos de falas citam um filme sendo gravado no Vietnã, com atores filipinos interpretando vietnamitas. A intenção da equipe parece ser terminar logo antes que cheguem as filmagens de Platoon no mesmo lugar. Enquanto isso, dois homens se apaixonam por Liz Alindogan, atriz lendo um diário erótico. Ou talvez não seja nada disso: os fiapos de história são tão esparsos que jamais formam um conjunto coeso, e tampouco parecem ter essa pretensão. Mais do que um filme “experimental”, este é um projeto não-narrativo, que se compõe por negação.

    Ao invés de apresentar um “filme dentro do filme”, ele poderia ser descrito como um “não-filme dentro de um não-filme”, ou ainda um filme falso sobre um filme inexistente. A premissa pode parecer confusa, e realmente é. Apropriando-se do material de um filme jamais finalizado, o diretor John Torres desconstrói qualquer traço de linearidade ou coesão do original: ele não trabalha com nenhum som sincronizado, insere filtros digitais, sobreposições e falsos riscos na “película” – na verdade, sua versão digital –, alterna entre o tom solene e o comicamente tosco, aposta no erotismo, no tom histórico, político e paródico.

    O suposto filme sendo gravado jamais parece real: não vemos diretor, equipe, câmeras. Os atores perguntam se ainda estão gravando, se a cena já terminou, mas pode ser que nem tenha começado. “Não tem filme nenhum”, aposta um deles. Talvez seja verdade, ou pelo contrário, pode ser que existam filmes demais, numa metalinguagem vertiginosa. Um projeto tenta se passar pelo outro, sobrepor-se ao outro, somando-se ou talvez anulando-se, dependendo do ponto de vista. Esta é uma obra ostensivamente nonsense, e muito orgulhosa disso.

    O resultado gera a impressão constante de aleatoriedade. People Power Bobshell poderia ter cinco minutos, ou três horas, e a estrutura seria a mesma. Em determinado momento, uma faca começa a andar sozinha, e outro, várias mulheres nuas nadam numa praia. Depois, um barco desliza solitário do meio do pântano. Como essas cenas se articulam? É curioso que Torres trabalhe a partir de um material preexistente não para completá-lo ou dialogar com o mesmo, e sim para anulá-lo. O projeto constitui uma anarquia alegremente destrutiva, inconsequente. Um cinema não preocupado em agradar, nem em conduzir o seu espectador até uma finalidade ou mensagem precisa. A ideia é perturbá-lo, fazer com que se perca pelo caminho.

    Filme visto no 6º Olhar de Cinema - Festival Internacional de Curitiba, em junho de 2017.

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