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    O Estranho que Nós Amamos
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    O Estranho que Nós Amamos

    Ao som dos pássaros (ou, como fazer uma refilmagem melhor que o original)

    por Francisco Russo

    Lançado em 1971, O Estranho que Nós Amamos surpreendeu por trazer uma certa virada psicológica ao trabalho habitual dos parceiros Don Siegel e Clint Eastwood. Situado em plena Guerra Civil americana, o longa abordava sem muita sutileza questões como o desejo e a culpa, através de personagens femininos um tanto quanto caricatos. Até por isso, e devido a um punhado de situações machistas, existia uma certa curiosidade em ver como esta mesma história seria agora apresentada tendo uma mulher na direção.

    Para Sofia Coppola, a saída foi deixar de lado o longa dirigido por Siegel e focar no material original, o livro escrito por Thomas Cullinan. Com isso, a diretora (e também roteirista) fez uma tremenda limpeza na história como um todo: não há mais o beijo do personagem principal em uma garota de 13 anos (!!!); não há mais a subtrama do irmão falecido; não há mais a ideia do homem como um "galo", deixando todas as mulheres - e animais - no cio; não há nem mesmo Holly, a escrava do internato. Há as mulheres, gerenciadas por Martha Farnsworth (Nicole Kidman), e o cabo John McBurney (Colin Farrell), apenas isto. E é suficiente.

    Mesmo com tantas ausências, a diretora manteve o foco da história em cima do desejo e de um certo tom mórbido. Para tanto, construiu um cenário absolutamente gótico onde explora a luz natural em uma belíssima fotografia, com figurinos e direção de arte impecáveis. A ausência de trilha sonora e a aposta no canto dos pássaros trazem um tom bucólico que combina muito bem com a ambientação apresentada. É nesta caracterização geral e na limpeza dos excessos que se pode melhor notar a interferência de Sofia Coppola.

    O dedo da diretora surge também na forma como o cabo John McBurney é retratado. Se Clint Eastwood investia firme no lado garanhão, Colin Farrell surge bem mais contido. Por mais que volta e meia lance seu típico olhar galanteador, ainda assim é algo bem mais sutil e adequado ao momento da narrativa. Seu relacionamento com cada uma das mulheres do internato soa bem mais fluido e menos esquemático, por mais que, em alguns casos, tenha sido diminuído em relação ao original. Outro ponto importante é que, desta vez, o foco central não está na sua percepção dos fatos e sim no das mulheres, por mais que sua presença seja o elo condutor da narrativa.

    Já entre elas, o destaque absoluto fica por conta da reprimida Edwina, interpretada com competência por Kirsten Dunst. Em relação ao original, há uma melhor divisão de tempo de tela para todas as mulheres do elenco, por mais que isto tenha diminuído as participações de Elle Fanning e, especialmente, Nicole Kidman - principalmente devido à retirada da subtrama do irmão. Ainda assim, a matriarca tem seu espaço também na representação do desejo, no sentido do tesão pelo corpo masculino.

    Enxuto e bem executado, O Estranho que Nós Amamos é uma espécie de versão melhorada e politicamente correta do longa-metragem lançado nos anos 1970. Se por um lado possui vários méritos técnicos, que podem lhe render algumas indicações no próximo Oscar, por outro soa como um filme menor dentro da carreira de Sofia Coppola como autora. Não há aqui ousadia ou uma maior profundidade, apenas um trabalho bem feito na recriação de uma história já conhecida - o que, por si só, é suficiente para tornar esta nova versão bem melhor que o preconceituoso filme original.

    Filme visto no 70º Festival de Cannes, em maio de 2017.

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    Comentários

    • Arildopascoal
      Gostaria que alguém, que é estudioso de filmes, me explicasse porque motivo o cineasta coloca tantas cenas no escuro?!? Até aquelas que acontecem de dia! Há momentos no filme, que parece uma antiga novela de rádio: tem-se que imaginar a cena pois o breu é tal que não se vê a fisionomia dos personagens. Vi o filme original e não me lembro tamanha escuridão.Desisti com meia hora de sofrimento em não poder enxergar direito.Olha que tenho boa visão.
    • Marcia Bento
      Eu não vi o de 1971, mas odiei este filme.
    • Gluzias
      Não assisti o filme original, mas achei muito violento o desenrolar da história. Mocinhas sem sentimento, egoístas como o próprio personagem as crítica no filme. Usam o cara e a forma como se vingam por ser traidor. Apesar de que por ser filme de época de guerra. Talvez por isso.
    • Leonardo Gonçalves Ferrreira
      Assisti o de 1971 e o de 2017, com certeza gostei mais do de 1971, muito mais condizente com a época que se passa o filme, na verdade deformaram a obra original aplicando o politicamente correto, é claro que não sou a favor do que se passava e éra normal mas , pra vc passar a atmosfera de uma época e o ambiente, com certeza que precisa ser feito com detalhes da época, muita coisa no segundo não ficou claro exe: de onde meninas almofadinhas tiravam o sustento da terra se nem conseguiam levantar um enxada ? e ainda tiraram uma personagem crucial da época que, também não concordo dos fatores do personagem mas, é fato que existiu e não da pra negar. enfim pra mim o de 2017 não tem nexo!
    • Leonardo Gonçalves Ferrreira
      Assisti o de 1971 e o de 2017, com certeza gostei mais do de 1971, muito mais condizente com a época que se passa o filme, na verdade deformaram a obra original aplicando o politicamente correto, é claro que não sou a favor do que se passava e éra normal mas , pra vc passar a atmosfera de uma época e o ambiente, com certeza que precisa ser feito com detalhes da época, muita coisa no segundo não ficou claro exe: de onde meninas almofadinhas tiravam o sustento da terra se nem conseguiam levantar um enxada ? e ainda tiraram uma personagem crucial da época que, também não concordo dos fatores do personagem mas, é fato que existiu e não da pra negar. enfim pra mim o de 2017 não tem nexo!
    • Rafael Rodrigues
      Aí que vc se engana. O diretor de Violência Gratuita fez um remake do próprio filme com atores americanos, cena por cena, quadro por quadro, e é outro filme.Vale a pena assistir os dois. Mas nesse caso aqui, Sofia literalmente CAGOU a primeira obra.
    • J.Victor O.
      politicamente correto e melhorado não cabem na mesma frase. Estou de absoluto acordo.
    • Rogerio
      O filme acaba com o livro, elimina todas as histórias que forçam as pessoas a refletir ou que são inconvenientes para os dias atuais, mas uma realidade em outras épocas e tem gente que acha bom?
    • Domingos Jorge Velho🇧🇷
      Tive que limpar os olhos com papel higiênico após ler esta crítica porca. Seria possível elogiar o filme sem detonar o original. Preconceituoso? Onde? Um filme que avançava sobre tabus. Ademais politicamente correto e melhorado não cabem na mesma frase.
    • Maria Cordovil
      Estou assistindo ao filme e não estou gostando. Não tem um pingo do carisma que tem o filme com Clint Eastwood e a cativante Geraldine Page. As atrizes parecem desanimadas, sem graça e falta algo nelas que encantava no elenco do outro filme. Acho que nem vou assistir pois não consigo parar a comparação entre os dois filmes e isso vai ser um suplício. E o barulho do salto dos pesados sapatos que elas usam, incomoda. Até o sotaque do Colin está atrapalhando e não tem nada a ver de como deveria ser . Enfim, a amante de filmes dentro de mim não me deixará parar de ver até o fim e saber no que vai dar.
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