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    O Rastro
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    O Rastro

    Oportunidade perdida

    por Lucas Salgado

    Enquanto as comédias conseguiram ocupar um espaço de destaque no mercado cinematográfico brasileiro, outros gêneros não obtiveram a mesma sorte, principalmente quando estamos falando de bilheterias. Um deles é o terror. Apesar de termos um ícone nacional do gênero (Zé do Caixão), são poucos os filmes a conseguir destaque no circuito. Nos últimos anos, obras como Isolados, Quando eu Era VivoO Amuleto e Fábulas Negras foram lançadas, mas sem sucesso fora do mundo dos festivais.

    Por causa disso, há uma sensação de satisfação sempre que um projeto do gênero consegue ser produzido e ter certo destaque no lançamento. O cinema brasileiro precisa de obras diversificadas para quebrar um pouco o padrão dos tipos de filme que são sucesso de venda de ingresso. E o horror, estilo muito querido pelo público, representa um potencial ainda pouco explorado. Agora, o gênero tenta nova sorte no circuito com O Rastro, uma produção de qualidade técnica e excelente elenco. Faria muito bem ao cinema brasileiro se o filme fosse bom. E aí reside o problema. Ele não é.

    Após se formar em medicina e fazer residência em um hospital público, João (Rafael Cardoso) acaba seguindo uma carreira mais burocrática, atuando na área da saúde pública. Na secretaria de saúde do Rio de Janeiro, ele recebe a missão de coordenar o fechamento justamente do hospital em que se formou, o que o coloca em conflito com o mentor e amigo Heitor (Jonas Bloch). Além de ter que lidar com as dificuldades do processo, ele está perto de ter seu primeiro filho ao lado da esposa Leila (Leandra Leal).

    De forma interessante, O Rastro investe num horror em que o principal vilão é o sistema. O cenário das cenas assustadoras é um hospital sucateado e saqueado pelo poder público. Os momentos de maior tensão envolvem a falta de material para o trabalho, a corrupção e a estrutura precária para o tratamento dos pacientes. Neste sentido, é uma experiência curiosa fazer o espectador adentrar um cenário que é fictício, mas ao mesmo tempo muito real, e que pode ser visto nos noticiários por todos os cantos do Brasil.

    Por outro lado, o filme demonstra insegurança no comando da premissa do "sistema como causador de todo horror" e acaba investindo em momentos erráticos e aleatórios. Destaca-se ainda, negativamente, o péssimo trabalho de edição de som e mixagem. Na verdade, todo desenho de som da obra se revela equivocada. Sem confiança em suas imagens, o longa faz questão de gritar de forma quase que permanente, criando uma experiência sonora que deveria ser desconcertante, mas que acaba sendo puramente irritante.

    Crítico ao sistema de saúde público no Brasil, o roteiro falha ao transmitir sua ideia e muitas vezes erra no tom, como no momento em que vemos um protesto contra o fechamento do hospital. O que as pessoas fazem na cena? Cercam uma ambulância com um paciente necessitado e ameaçam a integridade do mesmo, enquanto o funcionário da secretaria circula tranquilamente pelo local.

    O elenco é bom, mas consegue entregar muito pouco diante de personagens tão vazios e diálogos pouco envolventes. Rafael e Leandra se saem bem na construção de uma inquietude que só cresce. O time conta ainda com as presenças de Claudia Abreu, Felipe Camargo e Domingos Montagner, em participações superficiais e pouco aprofundadas. O último, por sinal, sem culpa, surge na cena final, que é quase constrangedora.  

    O Rastro representa mais uma oportunidade perdida de se fazer terror no Brasil. Vale pela tentativa, pelo exercício, e por tocar em temas importantes. Mas falha naquilo que tinha obrigação de fazer: assustar.

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    Comentários

    • Dany Lively
      O filme está mais para drama com um pouco de suspense embutido do que terror. Se houve algum erro foi na classificação de gênero e na lentidão dos fatos (sim, teve uma hora que a música de fundo irritava).
    • Fernando Aragão
      Ufa! Ainda bem que, de vez em quando, encontro alguém que fala minha língua quando o assunto é filme nacional sério. Também não assisti ainda ao filme (pretendo fazê-lo no próximo fim de semana), mas uma coisa eu digo: filmes como O Amuleto (2015), O Paciente (2018) e Chacrinha (2018) dão de um milhão a zero nas tão aplaudidas comé(r)dias brasileiras.
    • Hare Shanti
      Não vi o filme, não gosto de muito de terror, mas lendo comentários aqui e de conhecidos, acho que os sites exageram quando se fala em cinema nacional, descem a lenha. Porém quando o filme é hollywdiano, qualquer merda é digerível. Tanto filme de terror ruim, bosta que tem por aí e ninguém fala nada. Vamos aplaudir a inciativa de quem o fez. Parabéns!
    • Katarina
      Concordo! E diga-se de passagem não é um filme de terror, mas sim um ótimo suspense!
    • Elias PM
      Gostei muito! Fotografia, cores, luzes e tomadas criativas e muito bem executadas. Roteiro inteligente, bem amarrado e surpreendente!!! Parabéns!!
    • Vanessa A.
      O filme é inteligente, tem reviravoltas interessantes, o roteiro é bem construído, nos apresenta os personagens e o ambiente político no qual está inserido de forma satisfatória, e isto é ótimo, não é apenas um terror gratuito. Pecou sim por não ter explorado um pouco mais o terror, mas eu acredito que o suspense nacional está progredindo isso é ótimo.
    • Felipe B.
      Exatamente... Eu assisti o filme do Inicio ao film e achei uma obra nacional incrível, tanto no assunto que é abordado (afinal é algo tão real e sério) quanto nos detalhes do filme e do próprio elenco! Acho que em alguns fatos pecaram um pouco, como na questão Medo, soube desenvolver bem o filme com cenas que davam alguns sustos. Mas deveria ter explorado mais este lado que é uma obrigação de Terror: Assustar os telespectadores. Mas não foi nada que desqualificasse o filme... No geral achei uma obra muito boa e vale à pena sim este tipo de Gênero ser melhor explorado pelo nosso cinema nacional.
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