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    Alba
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Alba

    O imperativo do silêncio

    por Bruno Carmelo

    Alba é uma garota silenciosa. Ela não tem palavras diante da doença da mãe, presa a uma cama de hospital, e também não consegue emitir opiniões após assistir a um filme. Na escola, não é querida nem desprezada, mas passa despercebida no grupo de garotas, como uma presença invisível. Quando reencontra o pai distante, com quem é obrigada a ficar em virtude da doença da mãe, também não se comunica com ele. É nesta garota de expressões graves que a câmera da diretora Ana Cristina Barragán decide se concentrar durante 95 minutos.

    Por um lado, a direção demonstra grande delicadeza. A imagem está sempre colada aos movimentos da protagonista (interpretada por Macarena Arias), buscando os sinais na pele, as joaninhas que passeiam pela mão, a luz do sol banhando seu rosto. A fotografia opta por tons doces, ocres, discretos. Este é um retrato impressionista, de uma autora que se contenta em ficar ao lado de Alba e acompanhar seu tempo particular, sem tentar extrair algo dela. O tom da produção é ditado pela rotina muda e contemplativa da pré-adolescente.

    Por outro lado, a opção pelo silêncio soa excessiva. Quando a garota tímida reencontra o pai tímido – ele também, uma figura pouco sociável – os dois se limitam a sentar lado a lado e observar o horizonte com um semblante imutável. A diretora faz o possível para prolongar as cenas de desconforto: nas poucas oportunidades em que alguém diz “oi” a Alba, ela demora muitos segundos antes de pronunciar um “oi” como resposta. Seu caminhar é vagaroso e o olhar é pesado, fugindo dos olhos do interlocutor.

    Para atingir tamanho minimalismo, o filme sacrifica o ritmo. Durante os primeiros dois terços, as situações se arrastam, às vezes se repetem, em momentos nos quais mesmo a mais introvertida das garotas provavelmente encontraria algo a dizer. Faltam também válvulas de escape, elementos simbólicos nos quais Alba possa expressar a dor de ter uma mãe à beira da morte e um pai que mal conhece. Seu contato com a natureza é tão microscópico que compromete as sensações: a suspensão dos conflitos pode se confundir com tédio.

    O terço final da narrativa melhora muito em termos de fluidez. Numa rara cena em que pai e filha trocam algumas palavras, ao som da única canção da trilha sonora, o filme parece ganhar um respiro, como se permitisse enfim a livre expressão de personagens tão ricos. Rumo à conclusão, começam a surgir simbologias para a dor e o luto, permitindo que a protagonista torne-se algo mais do que um Kuleshov impassível em que o espectador possa projetar suas ideias de tristeza.

    Alba apresenta uma diretora promissora, de estética coesa e trabalho firme com os atores. A atenção de Barragán aos personagens, sem fetichismo nem condescendência, faz deste filme um estudo de personagens acima da média. Falta saber representar o silêncio sem precisar usá-lo à exaustão, representar o tédio sem tornar certos trechos entediantes. Ou seja, transformar o mundo interior da garotinha triste em metáforas que não fiquem presas em seu olhar, e possam se expressar no mundo ao redor.

    Filme visto na 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2016.

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