Minha conta
    Vidas Partidas
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    Vidas Partidas

    Pertinente no conteúdo, pouco atraente na forma

    por Renato Hermsdorff

    Pertinente no conteúdo, Vidas Partidas se vale de um formato pouco atraente. A estreia nos cinemas de Marcos Schechtman – diretor conhecido pela parceria com a autora Glória Perez em produções da TV Globo, como Salve Jorge e Amazônia - De Galvez a Chico Mendes – remete à telenovela, caracterizada como um melodrama clássico, com um roteiro duro de José Carvalho (Bruna Surfistinha), que joga para a plateia, mas traz uma virada interessante, se valendo de um subnicho pouco explorado na cinematografia nacional, o do “filme de tribunal”.

    Na trama, que se passa na Recife dos anos 1980, Graça (Naura Schneider, também produtora do longa-metragem) é casada com Raul (Domingos Montagner). Pais de duas filhas, os dois vivem uma intensa paixão, até que ele passa a se comportar de maneira violenta e abusiva.

    De cara, cabem duas observações, sendo: 1) A relação carnal do casal é ardente e mostrada sem pudores, fato raro entre as produções brasileiras, que não dão a devida representação à vida sexual da parcela da população de meia-idade (ponto para o filme); 2) A produção é muito bem contextualizada temporalmente, não apenas do ponto de vista técnico (cenário e figurino), mas principalmente ao retratar o machismo predominante da época, quando o “título de posse” do homem sobre a mulher era encarado (quase que) como normal – os ataques de ciúmes dele, a promoção dela no trabalho, a desigualdade entre os gêneros a respeito do que é permitido para cada um fazer fora de casa deixam o ponto muito claro (dois pontos para o filme).

    Por outro lado, para uma produção que se passa na cidade nordestina, com cenários localizados nas instituições locais – o que significa dizer que capitou recursos em Pernambuco –, soa negativa a opção pelo abandono da prosódia local. Apesar do posicionamento geográfico indicado, os atores falam como se fala em qualquer padaria da região sul do país. Não por culpa deles – Schneider convence e Montagner, como de praxe, brilha –, mas por uma opção talvez mais universal e certamente oportunista (no mau sentido mesmo).

    A despeito da tal pertinência do tema, de denunciar a violência doméstica (a Lei Maria da Penha está completando exatamente uma década), em Vidas Partidas, como acontece comumente – e ainda mais há 30 anos – na “vida real”, Graça reluta em delatar o marido, até que... uma virada acontece e a obra ganha ares de “filme de tribunal”. Muda o tom – há, inclusive, um quê de gênero de horror na sequência –, e o espectador é jogado para um rumo que

    surpreende.

    Contrariando a boa virada, porém, no terço final a produção retoma o trilho da previsibilidade, principalmente por reforçar, a todo o momento, quem é o vilão e a vítima dessa história – lugar tão comum quanto fazer um filme sobre a Segunda Guerra Mundial condenando abertamente o nazismo. Não, não se trata (em nen-hu-ma hipótese) de defender a figura do agressor (ou de Hitler!), mas ao tirar do espectador o benefício da dúvida, o longa-metragem caminha sem sutileza para seu esperado desfecho.

    Filme visto na 20ª edição do Cine PE, em maio de 2016.

    Quer ver mais críticas?

    Comentários

    Back to Top