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    A Fera na Selva
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    A Fera na Selva

    Imagem não acompanha a força do texto nesta adaptação de Paulo Betti e Eliane Giardini

    por Renato Hermsdorff

    Há uma indiscutível potência no texto da novela do escritor norte-americano Henry James (1843-1916) sobre um homem que passa a vida à espera de um acontecimento (o mais correto seria dizer de “o” acontecimento) que vai mudar o rumo da sua própria história. Ao mesmo tempo em que ele desconhece o fato, adota, involuntariamente como objetivo de vida, a postura de descobrir do que se trata.

    Paulo Betti e Eliane Giardini já haviam encenado essa história no teatro, lá pelos anos 1990, como o casal central (e único) de A Fera na Selva. Quase 30 anos depois, com o apoio de Lauro Escorel na codireção, a dupla leva essa mesma obra para os cinemas, sem, no entanto, conseguir superar as limitações impostas pela transposição entre as mídias (do teatro para o cinema).

    Ao longo de cerca de 1h20, o que se vê (o mais correto seria dizer o que se “ouve”) na tela é de uma verborragia à la Antes do Amanhecer e derivados. A diferença central em relação aos famosos filmes de Richard Linklater é que a dupla de intelectuais formada pelos professores João (Betti) e Maria (Giardini) dá voltas sobre o mesmo tema - para chegar num lugar facilmente deduzível desde o início do filme.

    A opção por manter o tom pomposo do português impecável da tradução de Fernando Sabino (ou seja, fora do registro naturalista), apesar de conferir um certo ar de elegância ao longa (para o qual contribuem uma fotografia limpa e solar e uma direção de arte de beleza plástica), gera um estranhamento que paira constantemente no ar - e é reforçado pela rubrica lida pelo narrador José Mayer. Até aí, nenhum problema, exatamente.

    Porém, o conjunto de imagens (e é de cinema que estamos falando) não acompanha o texto de forma a justificar narrativamente as opções adotadas pelo trio de diretores. Com raras (e bem-vindas) exceções, o que se vê é uma sucessão convencional dos planos. E as locações parecem um tanto aleatórias - a não ser para aqueles que têm ligação com a cidade de Sorocaba, cenário do filme.

    Há um componente de ironia por trás dessa versão cinematográfica. Se, por um lado, o texto, escrito em 1903, relega à mulher um papel (autoconsciente, até) de coadjuvância, a interpretação de Giardini à eleva a uma condição de superioridade e até protagonismo. Tanto o é, que a narrativa só tem a perder em relevância quando ela sai de cena.

    Mas a impressão que fica é a de que assistir a A Fera na Selva de olhos abertos ou fechados faz pouca diferença. Audiodescritiva, a adaptação confirma o vigor do texto, sem, no entanto, usar de um conjunto de imagens à altura.

    Filme visto no 45º Festival de Gramado, em agosto de 2017.

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