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    De Palma
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    De Palma

    Cinema sem controle

    por Bruno Carmelo

    A notoriedade do diretor Brian De Palma poderia ser comentada por diversas fontes e pessoas, como os cinéfilos, outros diretores, seus colaboradores frequentes, críticos e professores de cinema. Mas neste documentário, os diretores Noah Baumbach e Jake Paltrow decidem escutar uma única pessoa: o próprio Brian De Palma. Numa longa entrevista, com enquadramento fixo e planos contínuos, a dupla de cineastas pede ao veterano que narre a sua trajetória inteira, do primeiro filme ao mais recente.

    Temos, portanto, uma reportagem autobiográfica, “De Palma sobre De Palma”. Dotado de notável poder de oratória e de um ego desmedido, o cineasta narra suas aventuras de modo a se colocar como único autor das boas ideias e possível vítima dos fracassos. “Eu fiz”, “eu pensei”, “eu criei”, “eu tive a ideia”, “eu desenvolvi a linguagem”, “eu dominava a tecnologia”, repete à exaustão. Mais do que um documentário sobre o trabalho de De Palma, este é um estudo sobre a personalidade do diretor.

    Caso o espectador possua olhar crítico e não absorva todo o discurso vendido como uma verdade absoluta, há muito que se extrair do projeto. As histórias contadas são ora curiosas – as brigas nos bastidores, a incapacidade de tal ator decorar o texto etc. – ora representativas das dificuldades de trabalhar no sistema de estúdio. As experiências problemáticas em filmes como Scarface e Missão: Impossível desconstroem o glamour de Hollywood e revelam uma estrutura hierárquica na qual as decisões artísticas são minuciosamente controladas por produtores que preferem lugares comuns à ousadia formal e narrativa.

    A propósito de ousadias formais, é uma pena que Baumbach e Paltrow ofereçam uma direção tão contida, e um tanto covarde, diante de De Palma. Ele nunca responde a perguntas, não é confrontado com pontos de vista diferentes dos seus. Temos, de fato, um monólogo. A dupla de cineastas não reflete sobre as palavras de De Palma nem na montagem, nem em outros recursos cinematográficos. O projeto é limitado à redundância da imagem em relação ao som: quando o cineasta fala sobre Os Intocáveis, vemos uma cena de Os Intocáveis, quando cita o voyeurismo em Femme Fatale, surge na tela uma cena de Femme Fatale. A montagem torna a conversa linear e verbal: o biografado fala incessantemente durante 110 minutos.

    Assim, De Palma possui muitos méritos, mas todos provenientes do biografado. Os diretores são incapazes de extrair do colega algo além do que ele mesmo queira dizer. Mesmo que o diretor de Carrie, a Estranha revele por conta própria um olhar complexo sobre a atividade cinematográfica, era preciso que os autores controlassem as rédeas do discurso e manifestassem algum tipo de conflito na articulação de imagens. Nada é mais perigoso, num documentário, do que oferecer espaço irrestrito para o entrevistado fazer do filme o que quiser. O cinema, sem ponto de vista, transforma-se em propaganda.

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