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    Mia Madre
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    Mia Madre

    O ciclo da vida

    por Francisco Russo

    Em 2001, o diretor italiano Nanni Moretti fez a Croisette chorar – e depois o público ao redor do planeta - com o tristíssimo O Quarto do Filho, ao abordar as dores da perda e da culpa após o falecimento de um filho. Pouco mais de uma década depois, Moretti retornou ao Festival de Cannes com outro longa de forte cunho emocional: Mia Madre.

    São filmes diferentes, é bom ressaltar. E Mia Madre não é tão devastador quanto O Quarto do Filho, apesar de assumir uma outra vertente importante: a morte esperada. É ela que acompanha a diretora Margherita, dividida entre a imensa quantidade de afazeres decorrente da produção de um longa-metragem e a doença de sua mãe, internada no hospital. Afinal de contas, Margherita sabe que sua mãe não tem muito tempo de vida. De início resiste a acreditar, mas no íntimo ela sabe.

    O grande mérito do diretor neste longa-metragem é a sabedoria em transmitir para a tela grande este momento de vida de sua personagem principal. Se o filme é confuso em certos momentos, assim o é porque a vida dela também está confusa. O trabalho não rende, em parte devido à sua falta de concentração e de paciência, ao (tentar) resolver os problemas que vez ou outra surgem. Ainda mais quando precisa lidar com o astro internacional Barry Huggins, sempre galanteador e fanfarrão, que traz consigo vários dos clichês referentes aos bastidores do cinema. No fim das contas, é ele o alívio cômico do filme. Interpretado com desenvoltura por John Turturro, Barry é também uma cutucada de Moretti no cinema hollywoodiano, com todos os seus caprichos e mimos às grandes estrelas. Mia Madre, como vários filmes do diretor, possui subtextos a serem decifrados pelo espectador.

    Um deles se refere ao próprio cinema e, talvez, ao momento vivido por Moretti. É nítido que Margherita está cansada do sistema – não propriamente de filmar, mas de ter que repetir velhas ladainhas que, no fundo, sabe que não são verdadeiras. Também por isso, várias das cenas gravadas soam tão artificiais. Não é esta a vida real, ou ao menos a que realmente importa, como a diretora aos poucos começa a notar. Ao mesmo tempo, o desespero ganha força à medida que a certeza da morte torna-se cada vez mais palpável.

    Toda esta difícil trajetória emocional é trazida à tona através da sensível interpretação de Margherita Buy, que já havia trabalhado com o diretor em O Crocodilo e Habemus Papam. Moretti, como de hábito, também surge em cena como ator – e, como de hábito, dá a si mesmo um papel com destaque maior que deveria. Mas esta, no fim das contas, é uma questão menor. Mia Madre é na verdade um filme de despedida, ou do quão dura uma despedida pode ser, por mais que seja há tempos aguardada. O melhor exemplo é a belíssima cena em que a filha entra em desespero pelo simples fato de que a mãe lhe pede para descansar, sem conseguir dar uma breve caminhada. Nem sempre é fácil aceitar o ciclo da vida.

    Filme visto no 68º Festival de Cannes, em maio de 2015.

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