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    O Grande Circo Místico
    Críticas AdoroCinema
    1,5
    Ruim
    O Grande Circo Místico

    O machismo atravessa gerações

    por Bruno Carmelo

    A ansiedade pelo novo filme de Cacá Diegues era grande. Sabia-se que o cineasta desenvolvia o projeto há anos, partindo do espetáculo inspirado no poema de Jorge de Lima e com trilha sonora de Chico Buarque e Edu Lobo, incluindo canções belíssimas como “Beatriz” e “Ciranda da Bailarina”. Pelo retrato de cinco gerações da mesma família, em tom de realismo fantástico, esta poderia ser a oportunidade de unir o lirismo do circo, do teatro, da música e do cinema brasileiros num espetáculo só. O elenco, incluindo ótimos nomes como Jesuíta BarbosaJuliano Cazarré e Bruna Linzmeyer, aumentava o potencial da adaptação.

    As promessas, infelizmente, não se cumpriram. As expectativas atrapalham, é fato, mas neste caso será difícil culpá-las. Esteticamente, o filme fica aquém do retrato de deslumbramento comum ao circo: os números são burocráticos, executados na maior parte do tempo diante de uma plateia vazia. A trupe é composta por pessoas que permanecem neste local há gerações, mas não revelam apego particular às artes circenses. Elas não treinam, não discutem criação, dinheiro, estética. O recente documentário Pagliacci, de baixo orçamento, transmitia com facilidade o desbunde estético de um picadeiro. Aqui, a magia não opera.

    Isso se deve a uma série de fatores. A montagem estica as cenas para além do necessário, comprometendo a surpresa e também o humor. A fotografia, com suas luzes duras de foco único, gera mais sombra do que luz, além de fracassar na tentativa de retratar volumes, texturas e cores. O circo adquire um caráter estéril, como se estivesse abandonado há muito tempo, mesmo em plena atividade. Não ajuda o fato de os personagens serem intercambiáveis: o roteiro não desenvolve nenhum membro da família Knieps para além de um conflito único para cada um. Eles se transformam em estereótipos: a religiosa, o homem ganancioso, a cantora drogada, o irmão incestuoso etc.

    É positivo que o filme não tenha pudores para retratar o valor do sexo num relacionamento afetivo. Mas é questionável a representação das mulheres apenas como objeto de admiração dos homens, que desfrutam de seus corpos quando bem entendem. A continuidade das cinco gerações familiares se deu principalmente graças ao estupro e o incesto. Não há problema em ilustrar estes elementos, contanto quem com o devido distanciamento e/ou posição crítica. No entanto, o filme insiste que se trata de relacionamentos comuns, histórias de amor como quaisquer outras. “C’est la vie”, repete o condutor do espetáculo Celaví, sugerindo que “a vida é assim mesmo”. A banalização da violência soa um tanto perturbadora.

    O Grande Circo Místico sofre de uma indefinição conceitual grave. Pretende falar de magia, sem se aprofundar no universo fantástico – ora os elefantes e leões soam naturalistas demais, ora as borboletas digitais são exageradamente falsas. Pretende comover com dezenas de dramas pessoais, mas se recusa a desenvolver qualquer personagem. Os únicos motores de ação são aqueles de ordem folhetinesca: os nascimentos e mortes, casamentos e gestações. Mas o que pensam, o que desejam, como se desenvolvem estes pais, filhos, filhas, avós? Não sabemos.

    Bruna Linzmeyer consegue demonstrar sua habitual desenvoltura com diálogos, Jesuíta Barbosa traz certa picardia a seu papel, mas nenhum personagem soa minimamente verossímil e, portanto, passível de identificação. Beatriz não brilha, não despenca do céu; os pagantes não exigem bis; nós não entramos na sua vida.

    Filme visto no 71º Festival Internacional de Cannes, em maio de 2018.

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    Comentários

    • hamster
      Moça, a crítica à violência contra a mulher não torna o filme bom.
    • Jose Renato Bertoldi
      Assisti a estreia, anos 80?, do O Grande Circo Místico (1ª versão), com o Balé Teatro Guaíra. Esse espetáculo nunca mais saiu da minha memória...Liiinndo!!! Tenho até receio, pelas críticas, de ver o filme...
    • Adalto F.
      Horrível!Depois dizem que os brasileiros não dão valor ao cinema nacional, mas fazendo umas obras assim não há como defender, não háPéssimo!!!!
    • Fabio Barros Barreto
      O filme não é o que os criticos querem- as pessoas querem começo meio e fim? Não sejamos injustos, o film tem muitos predicados...O Cacá Diegues hoje é um homem que vê a vida de outro modo, musicas sábias, muito bem selecionadas, atores incorporados num resultado ímpar pro nosso nosso cinema
    • Debora R
      Quanta incompreensão! Achei muito bonito o filme. Alguém parou para pensar que toda essa violência contra essas mulheres, além de fazer parte do poema de Jorge de Lima, é exatamente o retrato de como as mulheres foram tratadas durante todo esse tempo, até os nossos dias. Dentro do circo não seria diferente e a adaptação do poema, com as letras de Chico Buarque, são preciosas críticas a toda essa violência patriarcal. Entendo que seja difícil assistir. Pior é sofrer toda essa violência. Que homens pseudo letrados torçam o nariz eu até entendo, mas nós mulheres temos que nos reconhecer nesse filme. Não há uma banalização da violência, ha uma denúncia. Não é preciso muita inteligência para perceber. Talvez só alguma sensibilidade. Além disso, foi emocionante ver Beatriz (Agnes), Charlote, Lily Braun, Margarete, Marie e Helene. Todas mulheres comoventes em suas tentativas de brilhar na escuridão. Essa mesma escuridão que domina o horizonte desses (as) que aqui só conseguem fazer críticas pífias e medíocres. Cacá Diegues tem o meu respeito. Obrigada por me trazer essas mulheres maravilhosas que até flutuam....
    • Luiza G
      Tudo me parecia meio estranho até o momento em que as gêmeas, vendidas a homens poderosos pela própria mãe, a dona do circo religiosa, fantasiam os homens engravatados (politicos?)de palhaços e o apresentador diz: aproveitem que hoje é de graça! Não me restou dúvida: o filme retrata o Brasil. E aí, tido faz sentido.Marcante.
    • RubieAndre C
      Eu gostei. Acho interessante a ideia de um contraditorio circo de tragedias mais do que de risadas, de mais sombras do que luzes e cores como normalmente vemos o mundo circense. O contraditório nos permite, a partir de Beatriz entrar na sua vida... C'est la vie, e não pode parar...
    • Jessica
      Pior filme que já assisti na vida! E, olha que já assisti filmes bem ruins!
    • Jessica
      Filme horrível, confuso, péssimo!!Não assistam! Não tem nada de bom, nada que acrescente na vida, nenhum valor. Não demostra senso de família, amor, misticidade, arte ou qualquer coisa desse tipo. É ruim demais! Só aparece pessoas transando, se drogando, nudez explícita (pensei que estava assistindo a um pornô). Peço até desculpa aos atores, diretores e quem trabalhou lá, mas esse filme foi duro de engolir! Não tem pé nem cabeça. No geral é podre!Depois reclamam porque não investem no cinema nacional, temos que aprender a fazer filmes, minha gente! O que é isso???? Minha vontade foi de levantar e ir embora!!Fiquei até o final e o que é aquele final? Não vale nem a pena ficar curioso e assistir. Noooossa... conseguiu piorar o filme mais do que já era! Pelo amor!
    • Valter S.
      O filme é muuuito ruim, a crítica está certa, ela poderia falar de qualquer coisa que acertaria, nada salva neste filme.
    • Valter S.
      Mas você como crítico deixou também de falar do principal defeito do filme, a direção de atores, falas trôpegas e mal sincronizadas, inverossímeis, parece que o filme não tem alguém no comando, parece que Cacá Diegues acreditou que a história, por ter tão boas referências, se resolveria sozinha, é uma pena, este filme vai nos fazer passar vergonha no exterior, além da nossa própria vergonha alheia.
    • Hugo M
      Filme Ruin, história confusa ,não parece com a magia do circo, só cenas de sexo. O filme deveria se chamar Sexo explícito...
    • André Luiz
      Lamentável! O poema é bonito, a trilha composta para o espetáculo, baseado no poema, de autoria de Chico Buarque e Edu Lobo são lindíssimas, mas o filme é bem fraquinho e vazio. Linzmeyer em cena salva o pouco que dá no filme.
    • André Luís de Oliveira
      A única coisa boa no filme é a fotografia do rosto da Bruna Linzmeyer, de resto é um fiapo de roteiro, a falta de roteiristas no Brasil tá pesando.
    • Robin Grosse
      então, o cinema é arte e representação da vida, mas o filme é ruim!
    • Eraldo S
      Uma visão de mundo obscura só pode gerar uma crítica,uma avaliação obscura de um filme que trata de um desejo. Não importa qual. A crítica a falta de textura, volumes e cores é somente um artíficio da autora para esconder sua visão obscura do mundo.E do desejo. Qual o seu obscuro objeto de desejo? Por favor, adoro o site. Espero que esta crítica não represente a personalidade livre do adorocinema. A autora nunca se apaixonou. Só conhece na teoria. O cinema é arte, é representação da vida. então...
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