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    Heli
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Heli

    Terra violenta

    por Francisco Russo

    Quem tiver estômago fraco ou não for muito afeito às crueldades que o ser humano volta e meia causa aos seus semelhantes deve passar longe de Heli. Afinal de contas, o novo filme do diretor mexicano Amat Escalante é daqueles que intencionalmente provocam um mal-estar no espectador, graças à violência explícita ao longo da história. Por mais que a intenção seja ressaltar um universo bastante duro e sem piedade, o filme conta com algumas cenas bastante fortes – uma particularmente dolorosa para os homens – em que por vezes o espectador é automaticamente impelido a virar o rosto.

    A história acompanha o namoro escondido de Estela (Andrea Vergara), de apenas 12 anos, com o jovem recruta Beto (Juan Eduardo Palacios). O contraste de idade entre eles é um fator que impressiona de imediato, já que Estela mantém a aparência de criança que mal entrou na adolescência. Por mais que seja pressionada, ela resiste à inevitável iniciação sexual mas não deixa de sonhar quando o namorado levanta a possibilidade de que se casem. Este é outro ponto a se destacar: apesar de ter receios em relação ao sexo, Estela sonha com o mundo idealizado do casamento, aquele mesmo tantas vezes vendido pelos contos de fadas e o próprio cinema. Escalante ressalta isto através da breve empolgação de sua protagonista feminina para, logo em seguida, mostrar que a realidade é bem mais complicada.

    Os problemas começam quando Beto rouba alguns pacotes de cocaína e os esconde na caixa-d’água da casa de Estela. Para complicar ainda mais a situação, a droga foi desviada por seus colegas de exército, que deveriam tê-la queimado após uma grande apreensão. Ou seja, além de ladrão Beto ainda por cima é um traidor. Quando é descoberto, seus antigos colegas partem com uma fúria brutal para cima não apenas dele, mas de todos que o cercam. Inclusive a família de Estela, que mal sabia do namoro que ela mantinha.

    Grande parte de Heli retrata justamente esta “vingança”, por assim dizer, com cenas violentíssimas que não poupam nem mesmo crianças ou animais – sim, o diretor rompeu esta “regra implícita” do cinema moderno onde eles costumam ser poupados em cenas do tipo. Trata-se de um retrato cruel de uma realidade onde a lei, quando existe, pode ser facilmente corrompida. Entretanto, por mais que o filme seja bastante competente em sua proposta conceitual, ainda assim o longa conta com algumas derrapadas de roteiro, com diálogos gratuitos que soam deslocados da história como um todo, e problemas técnicos com a fotografia em algumas cenas. Além disto, o trecho final é um pouco esticado demais ao ressaltar as consequências da “vingança”.

    Duro e pesado, Heli é um bom filme especialmente pela crueza com que a brutalidade da história é apresentada, de forma a torná-la o mais realista possível. Chama a atenção também certos artifícios usados por Escalante, como a cena da tortura em que, logo ao lado, é possível ver um personagem de videogame se preparando para a luta – analogia explícita com o momento do filme – e as difíceis cenas de violência envolvendo cachorros. Por estes momentos, e a concepção conceitual do filme como um todo, o prêmio de direção ganho por ele no Festival de Cannes foi merecido.

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