Dosar o clima e tom de suas histórias. Talvez esse seja o grande problema dos últimos filmes de super-herói. Ora focados em obter um clima sombrio com temas atuais e relevantes ou em apenas (e, as vezes, nada mais mesmo) proporcionar diversão totalmente sem compromisso. Eu não queria começar essa critica comparando este mais novo filme do universo cinematográfico Marvel com o último longa da concorrente DC Comics, Batman vs Superman. Mas vou comparar apenas dois aspectos entre os dois filmes a seguir.
Assim como no filme de Zack Snyder, temos aqui em Guerra Civil uma trama com um fundo político e totalmente antenada com nossa realidade atual. O grande diferencial que os roteiristas Christopher Markus e Stephen McFeely e os irmãos diretores Anthony e Joe Russo dão a trama e a condução de atores é justamente a dosagem correta do clássico humor sempre empregado nos filmes da produtora e o enfoque mais sério envolvendo questão de segurança mundial, as Nações Unidas, conflitos em países sub-desenvolvidos e questões diplomáticas, além, do mais relevante, a interferência militar em questões onde há interesse político – isso, alias, o que vai desencadear todo o conflito entre Steve Rodgers (Chris Evans) e o rico, playboy, milionário e filantropo Tony Stark (Robert Downey Jr.).
O roteiro bem resolvido vai mostrar com precisão o motivo da briga: Tudo começa quando os Vingadores começam a ser questionados por causarem danos e mortes quando estão em combate pelo mundo – a destruição em Washington no final de Soldado Invernal e em Sokovia no final de Era de Ultron são lembradas com mais peso. Após outro incidente na Africa, Tony Stark começa a questionar se os Vingadores necessitam de uma vigilância maior por parte da ONU, que exige que os integrantes da iniciativa assinem um contrato onde estarão se comprometendo a entrar em ação apenas quando autorizado ou solicitado pelos lideres das nações que pediram o tratado. Stark se sente culpado pelas mortes de inocentes em Sokovia, e logo aceita assinar o contrato, mas Rodgers desconfia que tudo seja motivado por interesses políticos, que podem atrapalhar o combate a paz que os Vingadores vem travando nos últimos anos. O problema toma uma repercussão gigantesca quando Bucky (Sebastian Stan, o Soldado Invernal) surge e causa um atentado terrorista na Africa, matando o presidente do pais – pai de T’Challa (Chadwick Boseman), identidade secreta do herói Pantera Negra. Dividindo as opiniões de todos os integrantes da equipe, logo se inicia a guerra civil do titulo, onde grupos a favor e contra logo se enfrentam – agravando o problema cada vez mais assim que verdades do passado de Bucky vão surgindo.
A discussão de métodos apropriados ou não para garantir a segurança do mundo traz um tema de fundo que chega a impressionar, levando em conta o fato de estarmos diante de uma superprodução hollywoodiana disposta a ganhar milhões pelo mundo – é interessantíssimo notarmos como as posições do Homem de Ferro e do Capitão America dão de cara com questionamentos políticos tão atuais e relevantes, seja no cenário político mundial em geral, como nas questões de Republicanos versus Democratas nos Estados Unidos e, para nos brasileiros, nossa direita política contra a esquerda – fica evidente, em certas passagens, como Stark representaria o capitalismo, onde temos a figura de um homem poderoso disposto a tentar trazer uma solução que não cause danos econômicos e físicos e nosso Steve Rodgers como um liberal socialista, disposto a dar liberdade para todos pensarem e agirem por si próprios – uma abordagem sutil da direção, que faz pensar, mas não tira o mérito do divertimento da produção
Uma trama envolvendo 12 personagens poderia facilmente cair numa confusão e se perder no meio da história. Mas novamente temos a direção firme, que consegue deixar bem claro tudo que já conhecemos dos personagens vistos nos filmes anteriores e, ainda sim, nos apresentar novas caras, em especial o Pantera Negra de Boseman e, principalmente na encarnação rápida (até) e genial de Tom Holland como Homem-Aranha – mesmo com poucos minutos de aparição o menino consegue ser, talvez, a melhor encarnação até agora para o cinema – o momento, durante a grandiosa (e já antológica) cena de ação no aeroporto, em que seu personagem faz uma piada/referencia a Star Wars, com certeza pode figurar entre um dos melhores momentos do cinema de ação deste ano.
Mas é claro que não podemos deixar de mencionar a ação e o humor – sim, novamente a dosagem certa: os Russos conseguem deixar o filme incrivelmente engraçado, mas em momentos adoráveis (uma conquista amorosa do Capitão América ou as piadas exageradas do Homem-Formiga, por exemplo), coisa que foi feita de forma totalmente forçada em Era de Ultron. Mesmo bom senso é aplicado nas cenas de ação. Logo na seqüência de abertura, em uma cidade da Nigéria, notamos o belo uso de enquadramentos precisos e coreografias bem ritmadas, deixando claro para o espectador onde cada personagem ou objetos estão – a direção de fotografia acerta também em momentos mais íntimos, como as conversas entre Tony e Steve, ou quando vamos conhecendo o misterioso Zemo (Daniel Bruhl, de Bastardos Inglórios), onde as paletas de cores escuras tomam conta, passando o sentimento de raiva e tristeza que o personagem passa – algo parecido com as cenas com Bucky. Esses dois acertos (filmagem da ação e uso do humor) são justamente duas falhas de Batman vs Superman (o segundo problema que fiquei de comentar), longa onde Zack Snyder não soube fazer criações visuais marcantes e usar o humor corretamente, já que sua trama séria não dava espaço para piadinhas.
Pecando apenas por um final que não parece ser um final – de praxe em um filme da Marvel – que diminui um pouco o ritmo e intensidade da trama, Capitão America: Guerra Civil já é um dos melhores filmes de ação e aventura deste ano e deixa a franquia dos Vingadores cada vez mais forte – e quem sabe os produtores não notam que a versatilidade dos irmãos Russo poderia ajudar no próximo filme da equipe reunida.
*Aviso obvio: são DUAS cenas pós créditos.