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    Elefante Branco
    Críticas AdoroCinema
    4,5
    Ótimo
    Elefante Branco

    Retrato humano

    por Francisco Russo

    A desigualdade social é um tema recorrente do cinema latino-americano, devido à dura realidade em vários dos países da região. Entretanto, poucos são os filmes que têm a coragem de colocar o dedo na ferida e apontar os responsáveis por situações por vezes calamitosas, onde muitos são os culpados e poucos aqueles que se dispõem a fazer algo. Elefante Branco, novo trabalho do diretor Pablo Trapero, é uma destas exceções e, justamente por isso, possui uma força impressionante junto ao espectador.

    A história acompanha a trajetória do padre Julián (Ricardo Darin), que há anos dedica a vida para ajudar os necessitados da Villa Virgen, uma favela localizada na periferia de Buenos Aires. Em sua batalha diária ele pode contar com a ajuda de poucas pessoas, entre elas a assistente social Luciana (Martina Gusman) e o padre Nicolás (Jérémie Renier), recém-chegado ao país. Entretanto, apesar da consciência social que possuem, até mesmo eles estão sujeitos ao desânimo e às provações decorrentes de uma realidade bastante violenta e, em alguns momentos, sem perspectiva de melhora. Natural, afinal de contas são humanos. Esta característica tão básica quanto simples é um dos grandes méritos do roteiro de Elefante Branco. Seus personagens jamais são apresentados como heróis, por falharem e terem atitudes visando seu próprio bem-estar. Não em relação a desvios de dinheiro ou fraudes, mas em atos pequenos do cotidiano onde os grandes "prejudicados", ao menos em sua consciência, são eles próprios. São, acima de tudo, humanos. Como o próprio filme.

    É este olhar humano sobre seus personagens e o ambiente como um todo o que mais impressiona no filme. Seria fácil colocar mocinhos de um lado, os bandidos do outro e mostrá-los em guerra. Elefante Branco mistura isto tudo, apresentando variadas vertentes que, em diversos momentos, colocam o trio principal em xeque-mate: fazer o correto segundo as leis ou a ética, onde toda e qualquer pessoa tem o direito de ter uma vida digna? É este o confronto que permeia todo o longa-metragem, fazendo com que o padre Julián bata de frente com tantos opositores, seja na polícia, na política ou na própria igreja católica. Os interesses das organizações, sejam elas quais forem, são menores diante do bem-estar do próximo, seja ele quem for.

    Em meio à esta batalha em tons quixotescos, onde lutar contra o sistema é necessário, cabe a Ricardo Darín a personificação da nobreza e da credibilidade perante os demais. Trata-se de mais uma excelente

    interpretação deste ator argentino, muito bem assessorado por Martina Gusman e Jérémie Renier. Com um tema forte e envolvente, aliado à ótima fotografia e trilha sonora, Elefante Branco é um filme corajoso pela denúncia proposta e também por sua própria realização, sem medo de possíveis represálias das organizações citadas. Para o público brasileiro, fica ainda a pergunta: se possuímos cenários tão parecidos quanto os retratados neste filme, qual o motivo da quase completa inexistência de longas nacionais que assumam de forma tão escancarada o lado político do cotidiano? O cinema brasileiro, definitivamente, tem muito a aprender com o que é produzido na Argentina neste momento. Excelente filme.

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