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    À Espera de Turistas
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    À Espera de Turistas

    A História dos outros

    por Bruno Carmelo

    Curioso, este filme. Embora não seja nada incomum o cinema alemão tratar da Segunda Guerra Mundial, esta produção desvia o tema da guerra para focar na memória dela, tanto para os sobreviventes da época quanto para as novas gerações. Sem acusar nem defender quem quer que seja, o diretor mergulha na complexa lembrança deste episódio para os alemães e os poloneses.

    A trama manuseia de maneira realista uma história que poderia ser bastante pedagógica: o jovem alemão Sven (Alexander Fehling) vai fazer seu serviço comunitário na cidade polonesa de Oswiecim (antiga Auschwitz), ainda marcada pelo passado sombrio dos campos de concentração. Ele vai ao local por falta de escolha, sem qualquer paixão particular pela história da cidade. O olhar passivo e surpreso do protagonista anuncia o tom do filme: tocar em um assunto delicado pela perspectiva de alguém que não tem a menor intimidade com a questão.

    Assim, ele é imediatamente associado ao seu país: ele não é um indivíduo qualquer, e sim "um alemão", carregando o fardo das atrocidades cometidas por seus antepassados. Com um roteiro hábil, que se esquiva tanto da história de amor quanto do maniqueísmo, Sven constata o que resta da época dos campos de concentração: um senhor rabugento (Ryszard Ronczewski), antigo preso em Auschwitz, que alimenta constantemente sua condição de vítima, adolescentes despreocupados, o governo da cidade, falsamente atento à questão, e algumas fotos dos campos de concentração espalhadas em lojas de souvenirs.

    Esta ironia é talvez o fator mais interessante de À Espera de Turistas (ou "E assim vieram os turistas", no original), embora a obra recuse enveredar pelo sarcasmo, pelo filme-tese. Em busca de leveza, e mesmo humor (o idoso que "não quer retocar" os números que foram tatuados pelos nazistas em seu braço), o roteiro se nega a explorar esta transformação da memória em fetiche, preferindo guardar, até o final, o ar meio perplexo de quem chega em terreno desconhecido.

    O mais curioso nesta produção é mesmo a direção de fotografia. Para um filme de teor realista, que toca em um tema mais do que conhecido, a iluminação preferiu adotar uma estética que chama muitíssimo a atenção para si. Com cores incrivelmente saturadas, película ultra sensível e contraste elevado à enésima potência, os personagens às vezes se perdem em uma simples sombra, tornada escuridão total, ou mergulham em um forte sol amarelo-ouro. Esta escolha estranha faz o filme beirar a fantasia, a fábula.

    Apesar disso, À Espera de Turistas cumpre a meta de relembrar do passado com uma amargura nada patriótica, talvez apenas um pouco fatalista. Como Sven, o filme relata a surpresa de uma descoberta, mas não as reflexões tiradas a partir dela. Ele parece constatar o caos, insinuando que a situação não tem como mudar. O filme parece dizer que a memória se apaga, se transforma, e os fatos perdem seu contexto – e também o seu valor. A memória torna-se uma imagem desbotada da História.

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